A Borgonha além das denominações

A busca do "renascido" Domaine Henri de Villamont na Borgonha vai além das denominações de origem para alcançar verdadeiramente o terroir

por Christian Burgos

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O nome Henri de Villamont vem da época das Cruzadas e diz respeito a um cavaleiro britânico da Ordem de Jerusalém que viveu por volta dos séculos XVI e XVII. Suas viagens ficaram gravadas em um livro de três volumes intitulado "Les Voyages du Seigneur de Villamont", editado em 1607. Depois de tanto viajar, o cavaleiro se instalou em Savigny-les-Beaune, na Côte d'Or, onde regeu os vinhedos que pertenciam à ordem.

Atualmente, o Domaine é de propriedade do maior grupo de vinho da suíça, o Groupe Schenk, que, durante anos, não dava a devida atenção aos detalhes da produção - segundo atesta seu CEO e enólogo, Pierre Jhean.

Este borgonhês pode dizer que tem vinho no sangue, pois, além de ter nascido no famosíssimo Hospices de Beaune, vem de uma família de vitivinicultores de longa tradição na região de Meursault e Chassagne-Montrachet.

Após estudar enologia em Dijon, foi trabalhar no norte da Côte du Rhône, em Cornas, com Jean Luc Colombo, mas logo voltou à Borgonha. Um amante de vinhos brancos (sua família é uma tradicional produtora de brancos em Meursault), em 2004 ele promoveu uma reformulação geral na Henri de Villamont focando na qualidade e buscando enfatizar o terroir, mais do que uma denominação específica.

Quando começa a história do Domaine Henri de Villamont?
A história de Henri de Villamont é antiga, mas começa de verdade em 1964 quando a companhia suíça Groupe Schenk compra os vinhedos e cria um Domaine lá. Em 1965, 66 e 67, fizemos os vinhedos na propriedade. 4,5 hectares em Savigny-les-Beaune, 2 hectares em Savigny e compramos vinhedos em Chambolle-Musigny. É uma companhia muito grande.

Como era Henri de Villamont quando entrou na companhia?
Em 1999, disseram: "Você toma conta do Domaine". Eles faziam os Grands Echezeaux sem muita preocupação em um tanque de 10 hectolitros. Muito louco. Não tinham um tanque especial para o Grands Echezeaux. Disse ao meu gerente: "Não entendo isso. Você é louco, não entende a Borgonha. Não é à toa que o Domaine está começando a declinar". A companhia perdia muito dinheiro com o Domaine, pois fazia muito vinho com nível baixo de preço e de qualidade. 

"Não me interessa o nome da denominação no rótulo. Você pode ter uma denominação famosa, mas um vinho ruim"

O que aconteceu depois?
Em 2002, saí da empresa. Fiquei fora por dois anos e voltei com um projeto novo. Foi muito rápido. Pouco antes da colheita, comprei alguns tanques para fazer a vinificação dos vinhos mais antigos. Depois da colheita, compramos a vinícola e a mudamos completamente. Tivemos uma nova vinícola para 2005, terminamos duas semanas antes de as uvas chegarem. No meio da noite ainda estávamos construindo.

O que resultou daí?
Em 2006, disseram: "Separamos a parte de grande volume da companhia e criamos uma nova Henri de Villamont, com o mesmo nome da outra, mas não é a mesma empresa. Não fazemos a mesma coisa de antes. Não fazemos vinho de quantidade na Borgonha". Antes, a produção era de 25 milhões de garrafas. Agora, 2 hectolitros por ano. Fazemos garrafas do vinho de que gostamos. Não é comercial. Quero vinho com prazer, terroir. Na garrafa, quero encontrar o terroir da Borgonha, as diferentes denominações.

O que é a Borgonha para você?
Não me interessa o nome da denominação no rótulo. Você pode ter uma denominação famosa, mas um vinho ruim. Eu gosto de ver o vinhedo, digo: "Esse vinhedo quero e esse, não". Pois, quando se está lá, você pode dizer. Isso é interessante. Se você não encontra algo nesse terroir - ele é chapado, de grande produção - prefere ter outros. Quando você vai para a Borgonha e quer realmente conhecer, faça uma degustação no vinhedo, faça um tour com a garrafa e abra-a perto do vinhedo. Você vê os vinhedos, prova o vinho e diz: "Ok, entendo". Quero entender os vinhedos, o terroir, para fazer meus vinhos. Esta é uma nova casa da Borgonha. Não quero fazer a mesma coisa que os outros. Fizemos no começo, mas quero algo mais. Quero mostrar para o meu cliente que gosto de produzir vinho e vinho de bom terroir. Quero fazer uma seleção de terroir, não apenas de denominação. Com Henri de Villamont, você encontra, como se diz em francês, "la face cachée", a face oculta da Borgonha.

Qual sua relação com vinho branco? 

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Minha família é uma família de vinho branco. Meu pai faz vinho branco em Meursault. Ele tem uma vinícola pequena e antiga lá. Tenho grande sensibilidade para os brancos. Para mim, vinho branco é difícil. É difícil entender o que o cliente quer, pois você tem duas escolas de vinhos na Borgonha, uma de mineralidade, acidez, e uma mais chapada de grande maturação de Chardonnay, com muita madeira e carvalho. É difícil...

"Preciso fazer o vinho para ser degustado com prazer quando está novo e também com prazer no futuro"

No caso dos tintos, como é?
Em 1989, comecei a fazer meu primeiro vinho tinto. 1990 foi uma safra bonita e fiz um Pommard. Fiz de um jeito estruturado, era muito forte, era para longa guarda. Eu era jovem. Vejo o tempo como um aliado para manter meus vinhos por longo tempo na adega. Fazia o mesmo com os brancos, sempre para longa guarda. Mas, depois de 10 anos, pensei: "Não é bom fazer isso, pois tem muita estrutura de tanino e, no fim, é um vinho muito forte e sem fruta. As pessoas dizem que o acham muito seco, não encontram fruta, que foi morta pelo tanino". Então, um dia conclui: "É necessário fazer algo mais. Preciso fazer o vinho para ser degustado com prazer quando está jovem e também com prazer no futuro". Acho importante ter isso, apesar de eu não gostar de beber safras muito novas.


Antes, a produção de Henri de Villamont era de 25 milhões de garrafas. Agora 2 hectolitros por ano

Falando de safras recentes, como foi 2009, por exemplo?

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Legenda

Foi uma safra bonita, com boa maturidade para Pinot Noir, o que não é típico da Borgonha. As pessoas gostam disso, porque é muito doce, mas não é típico. É uma boa safra, mas, para mim, não tem o equilíbrio de 2005. Esta teve os melhores vinhos. Em 2009, você encontra um pouco do que tinha em 2003, que foi uma safra especial, com grande madurez e muito açúcar nas uvas. Mas não é equilibrada completamente para longa guarda. Você tem a safra 2008 e 2010, nas quais encontra o vinho da Borgonha mais convencional. Em 2010, houve o equilíbrio da fruta e acidez. Por isso, é muito agradável. Mas devo dizer que gosto da safra 2003. Ela é especial, pois quando estava na escola, dizia-se: "Se não tem acidez, é impossível fazer um vinho grandioso". Em 2003 não tinha acidez e fizemos vinhos muito bons. Se prová-los hoje, vai ser um vinho muito bom.

E 2011?
Para tintos, ainda não sei, pois a cor é bonita, mas acho que tem um tanino fácil. Você degusta 20 vinhos diferentes da safra e é fácil. Normalmente, depois de 10 vinhos provados, você precisa parar. Não entendo muito bem nesse momento. Temos um problema com "en primeur" na Borgonha, pois temos algumas safras especiais para comparar com safras anteriores. E esta é a primeira vez que degustamos e podemos fazer isso com facilidade. Mas é difícil agora dizer se 2011 é boa ou ruim. Digo: "Esperemos".

"Na Borgonha, dizemos que vinho não é álcool, é uma cultura. Não veja o vinho com uma bebida má para saúde, mas veja como a cultura dos franceses"

Vê seus filhos trabalhando com vinho no futuro?
Sim, minha mais velha, de 20 anos, mora em Estrasburgo, na Alsácia, e lá se bebe muita cerveja, mas, no apartamento, ela já tem uma adega e sempre pede que eu leve vinho. E ela sempre faz questão de dizer para os amigos: "Esse é o vinho do meu pai". Essa geração de jovens, de 10 anos para cá, tem voltado a consumir vinho e, mais do que isso, estudar a cultura do vinho. Na Borgonha, dizemos que vinho não é álcool, é uma cultura. Não veja o vinho com uma bebida má para saúde, mas veja como a cultura dos franceses.

Vinhos avaliados

Henri de Villamont Corton Grand Cru Les Chaumes 2007 - AD 92 pts

Henri de Villamont Nuits St. Georges 1er Cru Aux Murgers 2007 - AD 91 pts

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