As muitas faces do vinho do Porto

O Vinho do Porto conquistou paladares do mundo inteiro. Conheça todos os seus estilos, as melhores harmonizações e os rótulos testados por ADEGA

por Marcelo Copello

Um caso à parte na história do fermentado de Baco, o Vinho do Porto é, além do Champagne, o único vinho que transcende qualquer fronteira e é aceito em todo o mundo. Mesmo em países de grande tradição vinícola, onde é raro que se vejam nas prateleiras e mesas produtos de outra nacionalidade, o Porto é sempre reverenciado.

Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que é universal, o Porto é pouco compreendido. Para o grande público ao redor do planeta, Porto é Porto, aquele tinto docinho servido em pequenos copos, como aperitivo. Muitos esquecem da riqueza de tipologias que só o Porto tem.

Porto Branco
Ainda causa surpresa a existência do Porto branco, que pode ser seco ou doce. O Porto branco pode ser um vinho jovem e leve, ou envelhecido longamente em madeira velha. O primeiro tipo é frequentemente servido em forma de drinque, o "Portonic" (coloque uma dose de Porto Branco em um copo tipo long drink, três pedras de gelo, uma rodela de limão, e complete com água tônica).

Os recipientes de madeira
Antes de prosseguir é bom deixar claro que a madeira utilizada para amadurecimento do Porto jamais é nova, ou seja, não passa aroma/gosto de madeira ao vinho, apenas confere oxidação a ele. Quanto menor o recipiente, maior a relação líquido/ superfície de madeira, logo, maior a oxigenação. Assim podem ser usados recipientes menores, de 600-640 litros (chamados cascos), ou maiores, de alguns milhares de litros (os tonéis), ou de muitos milhares de litros (os balseiros).

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Portos Correntes
Os Portos tintos podem ser divididos em duas categorias: misturas de vinhos de safras diferentes e que não trazem no rótulo a data da colheita, e safrados, frutos de um único ano.

Os Portos correntes são os mais baratos e mais conhecidos, nas categorias Tawny e Ruby. Ambos são misturas de safras e não trazem data de colheita no rótulo. Os Porto Tawny são os mais simples, amadurecidos em madeira e comercializados com idade média de três anos. Não evoluem em garrafa,ou seja, devem ser consumidos após adquiridos, e uma vez aberta, a garrafa deve ser esgotada ao longo de dois ou três meses. O nome Tawny significa "aloirado" e se refere à cor que o vinho adquire com seu amadurecimento em cascos. Os Porto Ruby têm cor mais vermelha, como a pedra "rubi", são amadurecidos em balseiros (com menos oxigenação para manter sua cor mais viva) e comercializados com idade média de três anos. Assim como os Tawnys Correntes, os Rubys não evoluem em garrafa, devem ser abertos logo e consumidos ao longo de poucos dias.

Tawnys com indicação de idade
Dentre os não safrados, a elite são os Tawnys com indicação de idade, ou Tawny velho, nas categorias: 10 anos, 20 anos, 30 anos e 40 anos. Todos amadurecem em cascos e a média de idade dos vinhos misturados perfaz a idade expressa no rótulo. Assim, um Tawny 20 anos pode conter vinhos com menos de 20 anos e outros com mais de 20 anos, por exemplo. Normalmente, um vinho mais velho se beneficia ao ser misturado com o mais novo que lhe dará frescor e juventude. Esta categoria normalmente é produzida em quantidades muito pequenas, pois comercialmente são de pouca ou nenhuma lucratividade, já que a imobilização do investimento é longa e a evaporação do líquido ao longo das décadas é considerável. A qualidade destes Portos é sempre alta, já que são vinhos de prestígio das casas de Porto. Ao comprar veja no contra-rótulo a data de engarrafamento e procure os mais recentes.

Os Colheitas
Os chamados Colheitas são Tawnys de uma única safra. Por lei permanecem no mínimo sete anos em cascos, mas na prática ficam muito mais. É possível encontrar no mercado Colheitas antigos, da década de 60, por exemplo, que permaneceram cerca de 40 anos em madeira e chegaram só agora às prateleiras. Não por acaso estes se assemelham a um Tawny 40 anos. Assim como os Tawnys, os Colheitas não se prestam a longo envelhecimento em garrafa.

O LBV - sempre uma boa compra
O Late Bottled Vintage ou LBV é um tipo de Porto em ascenção, por sua boa relação qualidade-preço. Seu estilo remete aos Vintages, mas custam bem menos. Engarrafados entre o quarto e sexto ano após a colheita, estes "baby vintages" mantém cor viva e a fruta. Porém, por terem ficado alguns anos em madeira, chegam prontos ao mercado, com taninos arredondados. Existem dois tipos de LBV, os filtrados e os não filtrados, ou tradicionais (informação que consta do rótulo). Os primeiros não evoluem em garrafa nem precisam ser decantados antes de servidos, e os demais sim.

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A magia do Porto Vintage
Finalmente chegamos ao Porto de maior prestígio, o Vintage. Só os melhores vinhos, com mais cor e corpo, são Vintages, feitos apenas nas melhores safras, normalmente apenas três ou quatro anos por década. Quase só após dois anos da colheita tem-se idéia se o vinho será vintage ou não. O produtor então manda amostras ao Institudo dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP) para aprovação. Quando muitas casas decidem fazer o Vintage naquele ano, diz-se que houve uma "declaração generalizada", que tem peso no mercado, pois significa que aquele ano é realmente bom e será valorizado. Um ditado local diz que "enquanto os Tawnys são uma obra do enólogo, o Vintage é uma obra de Deus", já que o Vintage depende totamente das condições climáticas do ano, e não da arte do enólogo em misturar safras. O Vintage é então engarrafado entre o 1º de julho do segundo ano e o 31 de dezembro do terceiro ano após a colheita. E presta-se a longa guarda, de muitas décadas. Aberto, deve ser decantado e totalmente consumido.

Harmonizando com Porto
● Salgadinhos, Canapés ou Presunto Crú: Porto Branco

● Panetone, Frutas Secas e Cristalizadas - Castanhas, nozes, amêndoas, avelãs, uvas passa, damascos e figos secos. Tawny com indicação de idade ou um bom Colheita.

● Tortas a base de frutas secas - prefira os Tawnys com indicação de idade, em geral, ou um bom Colheita.

● Doces de ovos - as típicas sobremesas portuguesas (Pastéis de Belém, Pastéis de Santa Clara, Pudim do Abade de Priscos etc) ficam ainda mais típicas se acompanhadas de um Porto Colheita.

Jon Sullivan● Queijos - O Porto Vintage vai muito bem com queijos fortes, seu casamento clássico (de comer de joelhos) é com o queijo português "Serra da Estrela", feito de leite de ovelha. O Porto LBV é uma opção mais em conta para os queijos. Interessante também é embeber queijos tipo Gorgonzola, Stilton ou Roquefort com um pouco de Porto (Vintage ou LBV), e servi-los acompanhados deste mesmo Porto.

● Chocolate - Para o chocolate, o Porto mais utilizado é o LBV, por ser frutado e estruturado, mas ao mesmo tempo mais macio e pronto que um Vintage. Uma boa opção mais em conta é o Porto Ruby. Se o chocolate for amargo, a combinação é mais difícil. Prefira os diversos tipos de Tawnys velhos ou os Colheitas mais antigos, pois possuem taninos bem resolvidos e irão brigar menos com o amargor mais intenso deste tipo de chocolate.

● Charutos - O Vinho do Porto é, para muitos, a bebida ideal para acompanhar umas baforadas de seu charuto predileto. Em geral, os Tawnys com indicação de idade - 10, 20, 30 ou 40 anos -, são os ideais.

ADEGA testou oito Portos Tawny 20 anos e 15 Portos Vintage. Confira:

Tawny 20 anos
Vista Alegre 20 Years Old Tawny (Santar, R$196,00). Aroma delicado, lembrando caramelo, frutas passa, paladar macio, cremoso, doçura marcada.

Burmester 20 Years Old Tawny (Adega Alentejana, R$185,30). Frutado, com geléias, figos, tostados, melaço, estilo mais encorpado e evoluído. Bom "custo-beneficio".

20 Years Old Tawny Port Wiese & Krohn (World Wine, R$240,00). Estilo clássico e elegante, bastante etéreo, com muitos aromas de evolução, além de frutas secas, confeiture, torrefação. Paladar de médio corpo, com doçura e álcool muito bem dosados e casados. Final longo e etéreo, com toque químico agradável.

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20 Years Old Tawny Port
Wiese & Krohn (World Wine, R$240,00). Estilo clássico e elegante, bastante etéreo, com muitos aromas de evolução, além de frutas secas, confeiture, torrefação. Paladar de Marcelo Copellomédio corpo, com doçura e álcool muito bem dosados e casados. Final longo e etéreo, com toque químico agradável.

Otima 20 Years Old Tawny
(Decanter, R$276,00). Bastante expressivo na boca, ótimo ataque, muito bom equilíbrio entre frescor e doçura, feminino leve e elegante.

Royal Oporto 20 Years Tawny
Real Companhia Velha (Barrinhas, R$216,50). Cor bastante evoluída com tons âmbar. Aromas com destaque para frutas cristalizadas, fruta passa, panetone, tostados, baunilha e outras especiarias. Paladar de médio corpo, muito macio, doçura aparece bem, aparenta mais idade do que tem. Um Tawny 20 anos delicado e elegante.

Niepoort 20 Years Old Tawny Port
(Mistral, US$134,00). Bela cor de tonalidade típica vermelho-alaranjado, brilhante, entre clara e escura. Destaque para o frescor, que se une às frutas cristalizadas, mel, figos e torrefação, paladar de bom corpo, onde a doçura aparece bem.

Duque de Bragança Porto Tawny 20 anos
A. A. Ferreira (Aurora, R$373,09). Nariz com ataque, elegância e equilíbrio entre complexidade e evolução, lembrando frutas secas (ameixas), muita fruta cristalizada, cedro, madeiras, torrefação. Paladar intenso, concentrado, mas sem exageros, persistente, doçura média e bem equilibrada, bom frescor.

Porto Tawny 20 anos
Messias (Casa Flora, R$180,00). Aromas de baunilha, tostados, mel, frutas cristalizadas, leves toques químicos. Médio corpo e média doçura, excelente equilíbrio, elegante e longo.

VINTAGES
Burmester Vintage 2003
(Adega Alentejana, R$123,80). Encorpado, elegante, frutado, doçura aparece, boa compra, beber desde já.

Real Companhia Velha Vintage 2000
(Barrinhas, R$148,00). Estilo frutado e macio, pronto para beber desde já.

Messias Vintage 2003
(Casa Flora, R$122,00). Feito em inox (sem lagares) e com 100% de desengaço, frutado e macio, surpreendentemente pronto para um Vintage jovem.

Quinta do Vale Dona Maria Vintage 2002
(Expand, R$298,00). Um Vintage mais leve e elegante, com boa acidez, frutado e macio, para beber mais jovem.

Krohn Vintage 2003
(World Wine, R$170,00). Estilo mais clássico, bom corpo, geléias, ervas, bom equilíbrio, doçura e álcool aparecem, boa guarda, dez anos pelo menos.

Burmester Vintage 1995
(Adega Alentejana, R$159,90). Elegante, médio corpo, pronto, no auge, ótimo preço pela safra.

Quinta do Castelinho Vintage 2000
(Wine Company, R$ 240,00). Frutas maduras (cerejas), violetas, baunilha, concentrado, taninos redondos, doçura presente, com muito para desenvolver em garrafa.

Ferreira Porto Vintage 1999
(Aurora, R$ 212,10). Mais sério e estruturado, está em um momento latente, precisa de tempo de garrafa.

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Quinta do Tedo Vintage 2000
(Casa do Vinho, R$248,00). Frutado, vegetal, concentrado, taninos sedosos, equilíbrio com boa acidez, doçura pronunciada.

Magalhães Vintage 2000
(Enoteca Fasano, R$ 320,00). Fruta e corpo, ervas típicas, taninos bem presentes, para guarda.

Quinta do Crasto Vintage 2003
(Qualimpor, R$196,00). O vermelho rubi opaco, retinto na cor. Aromas de boa intensidade, focados na fruta madura, com violetas, muito redondo, conjunto muito bem equilibrado, exuberante agora, com potencial de longa guarda.

Porto Vintage
José Maria da Fonseca e Van Zeller, (Diageo, R$280,00). Aromas intensos, com acento herbáceo típico do Douro (esteva), frutas em geléia (ameixas, cerejas), muitas especiarias, baunilha, pimenta, alcaçuz. Paladar muito encorpado, boa acidez, macio e meio-doce, longo. Já se mostra bem, mas se presta a longa guarda.

Porto Vintage 2000 Quinta de la Rosa (Expand, R$348,00). Aroma de compotas, violetas, ervas frescas, especiarias e toques de evolução. Paladar largo, macio e elegante, mas ao mesmo tempo sério e não muito doce, com 20% de álcool. Um Vintage de muito bom gosto, sem exageros, não é enjoativo. Já se mostra bem, mas deve crescer muito ainda nos próximos cinco ou dez anos.

Porto Vintage 2003
Niepoort (Mistral, U$$179,50). Mostra alcaçuz, baunilha, muitas frutas, como ameixa passa, amoras, muito elegantes, nada "sobremaduro", sem o toque vegetal acentuado típico em muitos vintages. Paladar estruturado, muitos taninos de boa qualidade, acidez moderada e doçura bem presente, 20% de álcool, tudo muito bem integrado em grande equilíbrio, longo. Para longa guarda.

Warres
(Decanter, R$448,50). Nariz fino e complexo, com muitas especiarias, pimenta, alcaçuz, frutas bem maduras, ervas do Douro (Esteva), violetas, chocolate. Paladar encorpado, largo no meio de boca, boa estrutura de taninos, presentes mas sedosos, muito persistente. Já se mostra bem, mas tem estrutura para ir longe, fino, bem definido em seus aromas, para longa guarda, de algumas décadas ao menos.

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