Nobres borgonheses

Um dos mais nobres e tradicionais Domaines borgonheses, Comte Georges de Vogüé é sinônimo de Chambolle-Musigny

Arnaldo Grizzo Publicado em 01/03/2011, às 12h52 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h47

Quando pensamos numa “aristocracia” dos vinhos da Borgonha logo alguns nomes vêm à mente, como a família Villaine, em Vosne-Romanée, os Laguiche, em Montrachet e, certamente, os Vogüé, em Chambolle-Musigny. Os vinhos do Domaine Comte Georges de Vogüé fazem parte de um seleto grupo de Grand Crus borgonheses celebrados mundialmente.

Para quem não se lembra, na Borgonha, diferentemente de Bordeaux, não são os produtores que são considerados Grand Crus ou Premier Crus, mas, sim, os vinhedos de onde vêm as uvas para seus vinhos. E também por isso Vogüé é tipo uma lenda na região.

Outro fato interessante de se notar na história da região, e que também aumenta o status de Vogüé, é que grande parte dos Domaines borgonheses – devido à Revolução Francesa, que confiscou e dividiu as terras que eram, em grande parte, da igreja e da nobreza – mal consegue rastrear suas origens e dizer que possuem mais de 100 anos de história. Já Vogüé se dá ao luxo de remontar uma história de mais de 500 anos.


História
Porém, antes de falar da origem do Domaine, tratemos dos vinhedos de Musigny (cujas primeiras referências são do ano 1.110), batizado assim devido a uma família que teria vivido na época áurea dos duques da Borgonha, mas que, com o tempo, acabou caindo no esquecimento. Outra teoria, contudo, diz que o nome Musigny vem do período galo-romano, antes Musinus.

Por volta de 1450, Jean Moisson construiu uma pequena capela em Chambolle, que mais tarde se tornaria a igreja principal do povoado. Do lado mais baixo da igreja, uma pequena estrada segue até um arco que vai dar nos jardins da propriedade de Vogüé, construída por Moisson também nessa época, e até hoje sede do Domaine.

Interessante notar que, por volta de 1880, a vila de Chambolle, dentro da Côte de Nuits, resolveu adotar também o nome de seu mais famoso vinhedo, Musigny, como uma estratégia de marketing para se promover, formando assim Chambolle-Musigny. Mesmo assim, até hoje ela permanece uma cidadezinha pequena e pacata.


Musigny tem 10 ha, sendo 7,2 de propriedade da Comte Georges de Vogüé


Moisson, Arthur ou Georges?
Mas o nome Vogüé só viria a se ligar à propriedade em 1766, quando a última descendente dos Moisson, Catherine Bouhier, casou-se com Cerice François Melchior de Vogüé. Atualmente, é a quinta geração dos Vogüé (seria a 20a desde Jean Moisson) que controla o Domaine, através das bisnetas do Comte George de Vogüé, Claire de Causans e Marie de Ladoucette.

Aliás, antes de Georges, o nome da propriedade estava vinculado ao Comte Arthur, seu pai. Em 1925, com a morte de Arthur, Georges colocaria seu nome no Domaine e trabalharia ao lado de Alain Roumier, que gerenciava o local, assim o pai dele, Georges – que criaria o Domaine Georges Roumier – havia feito antes.

O trabalho de Alain Roumier foi, durante anos, essencial para Vogüé, dando a tônica de seus vinhos. Quando o Comte Georges morreu, em 1987, Alain decidiu se aposentar. Com isso, a filha do proprietário, Elizabeth, assumiu o comando, passando a trabalhar com o enólogo François Millet.

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Monopólio?
O Domaine Comte Georges de Vogüé tem seu nome intrinsecamente ligado ao aclamado vinhedo Grand Cru de Musigny, que, para alguns especialistas, traz o que há de melhor da delicada Pinot Noir. Isso se deve ao fato de o Domaine possuir 7,2 hectares dos 10 desse vinhedo histórico, onde produz seu Musigny Vielles Vignes (com vinhas de cerca de 50 anos). No total, Vogüé tem pouco mais de 12 hectares de vinhedos próprios.

O vinhedo de Musigny, até 1936, era dividido em duas áreas: Le Musigny e Le Petits-Musigny. Vogüé teoricamente possui o monopólio de Le Petits-Musigny, mas, na verdade, as uvas das duas áreas são usadas para compor o “blend” do Vielles Vignes.

As vinhas de Musigny ficam a uma altitude entre 260 e 300 metros, pouco acima dos vinhedos de Clos de Vougeot e Chambolle-Musigny Les Amoureuses, também extremamente famosos. O solo é composto basicamente de pedras calcárias bastante duras, o que causa muitas fissuras quando a água congela, quebrando-as. E são poucos centímetros de solo mais fértil acima dessa base de pedras, o que proporciona um terroir único.

Vogüé possui ainda partes em vinhedos “villages”, como Les Porlottes, com uvas que são vinificadas juntamente com alguns Premier Cru, como Les Baudes e Les Fuées. Nesse caso, eles preferem fazem um blend “village” do que vinificar os Premier Cru em separado. Seu Premier Cru, na verdade, é feito do suco das vinhas mais novas de Musigny (com menos de 25 anos), ou seja, é um Grand Cru com classificação mais baixa. O único Premier Cru vem do vinhedo Les Amoureuses, do qual o Domaine possui apenas 0,56 hectare. Por fim, além do Grand Cru de Musigny (o Vielles Vignes), Vogüé tem ainda 2,7 hectares de Bonnes-Mares, outro vinhedo do mesmo nível de classificação.


O vinho
O Domaine passou por uma fase não muito boa durante as décadas de 1970 e 80, quando Alain Roumier sugeriu que os vinhos não eram tão bons devido, segundo ele, à obsessão dos norte-americanos por vinhos brilhantes e claros, o que forçava o Domaine a filtrar demasiadamente seu produto.

Outros, contudo, dizem que a qualidade teria caído devido à falta de estoques antigos de vinhos de Vogüé. Assim, os enólogos não teriam as referências suficientes para tentar recriar os mesmos sabores de safras passadas. No entanto, a fama da propriedade nunca decaiu, com seus vinhos tornando-se cada vez mais cultuados.

Jean Luc Pépin e François Millet são os responsáveis pelos vinhos de Vogüé, que, além do Grand Cru de Musigny, tem 2,7 hectares de Bonnes-Mares, outro vinhedo do mesmo nível de classificação


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O Musigny Vielles Vignes de Vogüé, cuja produção anual é de cerca de 900 caixas, é feito por François Millet com uvas de vinhas velhas (de 25 a 50 anos) do vinhedo de Musigny e apenas 30 a 40% fica em barricas novas, para enfatizar os sabores frutados. Este é um vinho sublime, de cor límpida e um matiz sedoso de tafetá, que contrastam com a pureza e a profundidade da fruta. O nariz se desenvolve em um amalgama harmonioso e discreto, mas sedutor, de aromas elegantes. Na boca, há uma concentração de fruta madura, com taninos bem arredondados e acidez equilibrada. A característica mais marcante é a persistência do vinho, mesmo em safras menos badaladas.