O cavalo mais desejado

Não há quem não reconheça (e queria um dia ter) aqueles carros vermelhos com seus cavalinhos rampantes

Thalita Fleury Publicado em 02/02/2009, às 16h37 - Atualizado em 15/06/2015, às 11h55

Em 17 de julho de 1923, Enzo Anselmo Ferrari estava com sorte. No mesmo dia, conquistou sua primeira vitória no circuito del Savio (Itália) e, depois, conheceu os pais de Francesco Baracca, reconhecido ás italiano da I Guerra, considerado um herói nacional. Desse encontro nasceu o símbolo da futura Scuderia Ferrari: o cavalo negro empinado sob o fundo amarelo canário – o “cavallino rampante”.

Enzo foi convidado a usar, como um talismã em seus carros, a figura do cavalo que era pintada na lateral de todos os aviões do ás e ao qual ele acrescentou um fundo amarelo (cor de Modena, sua terra natal). Assim, o mesmo símbolo que havia acompanhado Baracca continuaria sempre vencendo, agora ao lado de Ferrari.

O sonho de seguir a carreira automobilística vinha da infância de Enzo, nascido em 18 de fevereiro de 1898, em Modena, na Itália. Seu pai era mecânico e lhe transmitiu a paixão por corridas. Com sua morte, em 1916, o garoto teve que aprender rapidamente como ganhar a vida e, naquele momento, seguiu os ensinamentos do pai.

Era uma época difícil para encontrar um emprego na área, uma vez que os carros estavam impedidos de circular. A primeira tentativa foi na Fiat, sem resultados, mas ele não demorou a conseguir o emprego de test driver em outra empresa. A carreira decolou – de test driver ele passou para racing driver –, correndo pela Alfa Romeo já aos 21 anos. Sua estréia nas pistas aconteceu em outubro de 1919. Dez anos depois, Enzo fundaria a Scuderia Ferrari, sua equipe própria para trabalhar com carros de corrida.

Sua trajetória como corredor terminou em 9 de agosto de 1931, com uma última corrida no circuito delle Provincie. A desistência se deu graças à chegada da paternidade e também por suas obrigações na empresa aumentarem diaa- dia. Mas não eram somente as pistas que Enzo deixaria para trás. Ele também se desligou da Alfa Romeo, tendo que assinar um contrato que o impedia de utilizar seu nome em tudo que estivesse relacionado a corridas pelos próximos quatro anos. Por isso, a empresa fundada por Ferrari teve que ser nomeada de Auto Avio Construzioni.

E, desta vez, Enzo não teria tanta sorte. Sua fábrica foi transferida de Modena para Maranello e, um ano depois, em plena II Guerra, foi bombardeada. Não demorou a ser reconstruída, tornando- se a primeira parte do que é hoje e transformando aquela pequena cidade em um dos lugares mais importantes para os amantes do automobilismo.

Em 1945, a nova fábrica funcionava a todo vapor. O primeiro Ferrari começava a ser desenvolvido, já com o layout que caracterizaria a marca. Foi assim que, em 2 de março de 1947, Enzo cruza os portões de sua fábrica dirigindo o 125S, um carro que ficaria para a história. Com ele, já começava também a tradição de numerar os modelos de acordo com o volume de cada cilindro do motor em centímetros cúbicos. O engenheiro Gioacchino Colombo, amigo de Enzo, foi o principal ator por trás desse novo modelo. Era uma “barchetta” rudimentar, com um estilo complexo para um carro esporte. Não demorou a conquistar vitórias, fazendo com que a Ferrari ganhasse fama.

Para enfrentar seus fortes competidores, como os Alfa Romeo, a escuderia logo teve que substituir o 125S, afinal, ele era apenas uma prévia dos carros bem mais ousados e potentes que surgiriam. O próximo modelo, 159S, ampliou as chances de competição da marca, mas foi apenas com o clássico 166 que a Ferrari se transformou em uma lenda das pistas.

O 166 resultou de uma pesquisa do engenheiro Aurélio Lampredi. Feito em vários modelos, inclusive um familiar de quatro lugares, o carro conquistou os apaixonados por carros de luxo. Entre 1947 e 1950, foram produzidos 39 tipos, que ganharam compradores milionários já em 1948, como Briggs Cunningham, um dos primeiros gentlemen-drivers que teve poder aquisitivo para ter um Ferrari de corrida em sua garagem.

A evolução não parou ali, cada vez mais os chassis foram aperfeiçoados e a cilindrada dos motores aumentou. A necessidade de modernização foi imposta principalmente com o início da Fórmula 1 moderna, em maio de 1950, quando o Alfa Romeo volta a competir com um carro de um único lugar que parecia invencível. Era a hora definitiva para impor a supremacia Ferrari e Lampredi sabia disso. O engenheiro criou então o 375 F1, modelo que, em um momento histórico, vence os Alfa Romeo. A Ferrari assumia o posto de competidor temível – rótulo que não perdeu até hoje –, e de um ícone da indústria automobilística também com seus modelos esportivos.