O caviar, uma das iguarias mais caras e desejadas do mundo, já freqüentou de mesas populares a milionárias. Conheça sua história e o porquê de seu sério risco de extinção.
Tatiana Fraga Publicado em 19/12/2005, às 10h00 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h43
Hoje, os esturjões vivem exclusivamente nas águas do Hemisfério Norte; são peixes grandes, lentos, curiosos e passivos, o que lhes causa problemas quando estão em perigo. Mal sabem que carregam preciosidades dentro de suas entranhas as ovas do esturjão, depois de sofrerem um processo cuidadoso, se transformam no cobiçado e caríssimo caviar. A qualidade de qualquer caviar é determinada pela sua uniformidade, consistência, tamanho, cor, odor, sabor, brilho e firmeza. Se o conjunto de ovas for aprovado, chega-se ao momento crítico: a adição de sal e ácido bórico
Existem em torno de 27 espécies de esturjão em todo o mundo. As três mais famosas vivem no Mar Cáspio: o beluga (Huso huso), o osetra (Acipenser gueldenstaedtii colchicus) e o sevruga (Acipenser stellatus). Juntas fornecem cerca de 90% da produção mundial de caviar.
Linha do tempo
A história do caviar é, no mínimo, curiosa. As primeiras
referências não ambíguas ao caviar aparecem na Idade Média. No século
XII, o caviar aparecia em Constantinopla, então o centro da Igreja Ortodoxa
Grega. Em 1280, a Igreja admitiu formalmente caviar e esturjão como alimentos
que podiam ser consumidos nos dias santos, quando era proibido comer carne
e ricas iguarias.
Já foi, na Rússia, comida popular e barata. Era recomendado para doentes e crianças e, até, o século XVIII, comida de camponeses. No tempo de Catarina, a Grande, custava tão pouco quanto manteiga.
Ao longo de 300 anos, no entanto, deixaram de ser comida de porcos, escravos, índios e aldeões para se transformar no mais caro e cobiçado manjar a freqüentar a mesa de ricos e famosos do mundo inteiro. O maior produtor de caviar, no século XIX, foi o rio Delaware, EUA, mas a pesca indiscriminada e a sede do lucro fizeram com que o peixe se extinguisse.
Com a Revolução, os russos viram que tinham nas mãos uma mina de ouro. Estatizaram a pesca e passaram a controlar com mão de ferro a qualidade do produto, mas, com o fim do comunismo, a pesca caiu nas mãos de qualquer um, o preço e a qualidade baixaram.
Hoje em dia não se pode confiar mais no caviar russo; o contrabando e a pesca clandestina imperam cada vez mais. A verdade é que até hoje há ricos no mundo inteiro que sentem saudades da proteção estalinista à indústria do caviar.
Quando Pedro, o Grande, em visita à França, ofereceu a Luís XV para provar de um, este o cuspiu no chão;
Quando Winston Churchill despachou Lorde Beaverbrook para discutir a Segunda Guerra Mundial com Joseph Stalin, em 1941, deu-lhe duas instruções rigorosas: voltar para a Inglaterra com um acordo e "11 quilos do bom";
Não muito depois, os soviéticos pagaram a Charlie Chaplin, como direitos autorais pela publicação de um trecho de sua autobiografia no jornal Isvetzia, quatro quilos bem pesados;
O milionário grego Aristóteles Onassis preferia comê-los prensados, como os camponeses;
Christian Dior cobria-os com um ovo mal-passado.
Vinho X Caviar por Marcelo Copello
As entranhas da cobiça | ||
Inga Saffron relata, com ricas descrições obtidas
através de sua experiência pessoal de repórter na clandestina economia
da nova Rússia, como o colapso do comunismo transformou o comércio
do caviar num negócio sem controle lucrativo, selvagemente competitivo
e corrupto. E mostra como a cupidez pode levar à façanha de extinguir
um peixe cuja existência remonta a 250 milhões de anos antes do
surgimento do primeiro homem. Um peixe que sobreviveu à catástrofe
que acabou com os dinossauros, mas que tem poucas chances de sobreviver
à globalização. A extinção não é a única sina do caviar. O alimento
mais caro do mundo parece estar fadado a ser produzido sob regimes
excepcionais. Depois da época de glória na ditadura leninista do
proletariado, os esturjões trocaram de revolução e agora sustentam
uma indústria regida pelo fundamentalismo dos aiatolás iranianos.
"Os aiatolás salvaram a indústria do caviar", conta Inga Saffron. |