Vizinho de Latour, Pichon-Longueville deu origem a dois grandes vinhos em Pauillac
Arnaldo Grizzo Publicado em 29/03/2011, às 08h54 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h47
Quem é apaixonado por castelos certamente vê a foto do Château Pichon-Longueville e logo percebe a semelhança com um dos castelos mais famosos do Vale do Loire, o Azay-le-Rideau. Sim, a semelhança é enorme já que este castelo da época do Renascimento obviamente serviu de inspiração para o edifício que Raoul de Pichon Longueville construiria em 1851, quatro anos antes da Classificação de 1855, que o colocou como um Deuxième Cru.
Raoul era descendente de Jacques de Pichon, casado com Thérèse de Rauzan, cuja família há muito já estava envolvida no mundo do vinho. Eles já possuíam vinhedos em Margaux e, em 1689, compraram diversas posses em Pauillac. Uma delas ficava em Saint-Lambert, entre Saint-Julien e Pauillac e que durante os anos foi chamada de vários nomes como Bâtisse, Bastide ou Baderne, até ganhar o nome atual com os Barões de Pichon-Longueville.
Esse vinhedo, coincidentemente, ficava ao lado de um chamado La Tour Saint-Maubert, que mais tarde ficaria conhecido somente como Château Latour. No início do século XVIII, os vinhos desses dois vizinhos eram considerados do mesmo naipe, vendidos quase ao mesmo preço. Anos depois, contudo, Latour recebeu a indicação de Premier Cru.
Château Pichon-Longueville é verdadeiramente um castelo, cuja construção foi inspirada em um dos mais belos castelos do Vale do Loire |
Divisão
Jacques morreu em 1731, e passou a propriedade a seu filho, também chamado Jacques, que por sua vez também a deixou a seu herdeiro, Jean-Pierre, que a passaria ao filho Joseph. Nascido em 1755, Joseph teve de passar pela conturbada fase da Revolução Francesa, quando chegou a ser preso. E ele acabou sendo o último da família Pichon a ter a posse das terras do château como um todo. A partir daí, o código napoleônico de heranças fez com que a propriedade se dividisse entre seus herdeiros.
Pichon-Longueville e Pichon-Lalande se separaram em meados do século XIX devido ao código napoleônico
Dos cinco filhos, apenas um, Raoul, permaneceu, mas, pela lei, as terras deveriam ser divididas também entre as filhas. Assim se formava o que os franceses deram o nome de faux jumeaux (falsos gêmeos), com Pichon-Longueville Baron (ou Baron de Pichon-Longueville) e Pichon- -Lalande. Mas foi somente com a morte de Raoul, em 1860, que a divisão foi mesmo final. Após o falecimento do irmão, Marie-Laure Virginie assumiu o controle de parte da propriedade. Ela casou com o conde Henri de Lalande em 1818 e assim assumiu o título de condessa de Lalande (Comtesse de Lalande, que dá nome ao principal vinho do Pichon-Lalande hoje).
Em 1933, a parte da família de Raoul já não tinha mais herdeiros diretos. O último vendeu o château para a família Bouteillier, que conseguiu manter a reputação dos vinhos. Contudo, com a morte de Jean Bouteillier em 1961, seus filhos não foram capazes de bem administrar a propriedade.
#Q#São 73 hectares de vinhas em Pauillac, que produzem 15 mil caixas do principal vinho
Entre os anos de 1970 e 80, o vinho perdeu qualidade. Porém, o cenário começou a mudar quando Jean Michel Cazes (do Château Lynch-Bages) e a AXA Millésimes assumiram o comando em 1987. Com muito investimento deste grupo, o Pichon-Longueville foi completamente restaurado, com ajuda de arquitetos famosos que participaram de um concurso de design no Centro Georges Pompidou. Em 2000, Cazes se aposentou e agora o château está sob responsabilidade de Christian Seely.
Terroir e vinho
Pichon-Longueville possui atualmente 73 hectares de um solo repleto de cascalho ao sul de Pauillac. O clima próximo do rio Gironde é quente, úmido e ensolarado. As vinhas estão divididas entre 62% Cabernet Sauvignon, 35% Merlot e 3% Cabernet Franc. A idade média das plantas é de 30 anos, com densidade de 9 mil e rendimento de 45 hectolitros por hectare. Contudo, há vinhas de mais de 80 anos de idade que são conservadas minuciosamente e sempre entram na composição do vinho principal. Essas plantas sobreviveram às geadas de 1957, à II Guerra Mundial (o château serviu de refugio à população quando os aliados bombardearam o porto da região, que abriga uma parte da frota alemã) e à Depressão de 1929.
Em 2000, a equipe técnica do château, comandada por Jean-René Matignon, recebeu uma certificação de excelência por ter estabelecido um sistema de gerenciamento desde o vinhedo até a vinificação, envelhecimento e engarrafamento.
O primeiro vinho se chama Château Longueville au Baron de Pichon-Longueville, cuja produção é cerca de 15 mil caixas por ano. Já do segundo vinho, Les Tourelles de Longueville, que começou a ser produzido em 1986, são feitas cerca de 12 mil caixas a cada safra. Ele é feito basicamente de Merlot de uma parcela de Saint Anne.
Diz-se que o estilo do vinho de Pichon-Longueville é uma contraposição ao do Pichon-Lalande, que seria mais sensual e sedutor, mais feminino, por assim dizer. O vinho do Baron estaria mais para a potência e estrutura "máscula", comparável ao vizinho mais ilustre, Latour. Isso se deve, em parte, à maior proporção de Cabernet Sauvignon do blend.