Uma seleção de 10 dos vinhedos mais famosos de toda a Borgonha
Arnaldo Grizzo Publicado em 26/08/2018, às 12h00 - Atualizado em 12/04/2019, às 10h44
São 33 os vinhedos considerados Grand Cru na Borgonha. Só para lembrar, Grand Cru é a mais alta classificação local, seguida pelos Premier Cru, os Villages e, por fim, as denominações regionais. E devemos lembrar também, diferentemente de Bordeaux, aqui o que define a classificação é o vinhedo, não o produtor. E como um mesmo vinhedo pode ter diversos donos, muitos produtores podem produzir um mesmo Grand Cru.
Dos 33 Grand Crus borgonheses, 24 estão localizados em Côte de Nuits, oito na Côte de Beaune e um em Chablis. Ao todo, 550 hectares de vinhedos são da mais alta classificação, o que representa apenas 2% da área de vinhas plantadas na Borgonha. O vinhedo de maior área (excluindo os sete climats Grand Cru de Chablis) é Corton, com pouco mais de 97 hectares. O menor é La Romanée, com 0,84 hectare. A produção total de Grand Crus costuma ser próxima dos 2,5 milhões de garrafas, que não chega a 1,5% de toda a produção de vinhos da Borgonha.
Os Grand Cru são os vinhedos mais importantes da Borgonha. Suas delimitações começaram a ser apontadas ainda na Idade Média com os monges cistercienses. Após anos e anos de observações e análises, eles foram separando o que consideravam as melhores terras, de onde surgiam os melhores vinhos. As denominações, como as conhecemos hoje, foram quase todas oficializadas ainda no século XIX.
Então, se você quer saber o que a Borgonha possui de melhor, precisa conhecer os vinhedos Grand Cru. A maior parte deles é de tintos, porém, há diversos brancos tão icônicos quanto seus pares tintos. ADEGA resolveu então selecionar 10 vinhedos que você precisa conhecer e provar entre os 33 Grand Cru. Apesar de entender a relevância, evitamos selecionar os que são “monopólios”, ou seja, pertencentes a um único produtor. Confira os selecionados ordenados de norte a sul no mapa da Borgonha.
Acredita-se que esse vinhedo tenha se originado ainda no ano 630 e suas dimensões se mantiveram inalteradas desde essa época. O local pertenceu ao Duque Amalgaire, que teria construído uma abadia no local para se redimir dos pecados. As terras depois foram doadas aos monges.
O vinhedo é ligeiramente mais íngreme do que Chambertin e seus vinhos tendem a ser mais aromáticos, com notas de pimenta. Ele combina elegância e vigor, austeridade e potência, com muita finesse. Alguns dos principais produtores são Bruno Clair, Dujac, Faiveley, Robert Groffier, Armand Rosseau etc.
Este vinhedo é um dos mais importantes para a Pinot Noir na Borgonha e no mundo, pois foi plantado com material selecionado pelo avô de Laurent Ponsot em 1954 com os principais clones borgonheses, usados até hoje em todo o planeta.
O calcário domina Clos de la Roche, onde o solo tem apenas 30 cm de profundidade, com poucos cascalhos, mas com grandes pedaços de pedras. Seu vinho é considerado amplo e rico, com tons terrosos. Notas de trufas também costumam aparecer no nariz. Diz-se que é uma mistura interessante da elegância de Chambertin com a opulência de Bonnes-Mares e a fragrância de Musigny. Vale ficar atento a produtores como Dujac e Ponsot.
O sufixo Saint-Denis, que então designava o vinhedo, foi escolhido pela burguesia da vila de Morey no início do século XX para complementar o nome do povoado. As origens do vinhedo são do século XI, com os “Cânones do Capítulo” de Vergy. Ele foi plantado por monges dois séculos mais tarde e passou para as mãos da família Marey-Monge, e depois se fragmentou.
Clos St-Denis fica no sopé da encosta, tem solos calcários marrons, sem seixos, que contêm fósforo (como o de Chambertin) e argila (como o de Musigny). Seu vinho impressiona pelas nuances refinadas e há quem diga que ele é o “Mozart da Côte de Nuits”. Ele funde profundidade e potência com ótima fragrância. Aqui deve-se ficar de olho em produtores como Domaine Bertagna e Philippe Charolopin, por exemplo.
Musigny fica em Chambolle-Musigny, no coração da Côte de Nuits, e está localizado acima do Clos de Vougeot, entre o Premier Cru Les Amoureuses e Les Échezeaux, entre 260 e quase 300 metros acima do nível do mar. Este terraço rochoso e calcário é bastante íngreme (8 a 14%). Os solos rasos – de origem jurássica com cerca de 150 milhões de anos atrás – são ricos com um pouco de argila vermelha na parte superior. Eles são geralmente mais argilosos e menos calcários do que os dos Grands Crus vizinhos.
O Musigny branco tende a ser extravagante. Um vinho branco feito em terroir de tintos, cheio e robusto, e não pode ser comparado com os Grand Cru de Puligny e Corton-Charlemagne. Apenas a família De Vogüé plantou 0,66 hectares de Chardonnay no local. Já o tinto é tido como um dos melhores vinhos do mundo, com enorme complexidade, profundidade de boca e buquê espetacular repleto de nuances. Deve-se dar atenção aos produtores Jacques Prieur, Domaine Leroy e Domaine Comte Georges de Vogüé.
Échezeaux apresenta solos diversificados com climats diferentes e estão em uma altitude pouco acima de 300 metros do nível do mar (13% de declive médio). Na parte superior, os solos são profundos, com 70 a 80 centímetros, e a base tem cascalho, argila vermelha, marga amarela etc., um mosaico bastante variado e complexo.
Graças aos diferentes tipos de solo e climats, os vinhos de Échezeaux tendem, como já dito, a ser bastante diversificados. Há quem coloque os climats Em Orveaux, Les Pouaillères, Échezeaux du Dessus, Cruots, Champs Traversins e Rouges du Bas como “segundos vinhos” no ranking dentro de Échezeaux. Grands Échezeaux seria o primeiro lugar e os climats restantes ficariam em terceiro. Falando de maneira geral, Échezeaux tem aromas que evocam rosa, violeta e cereja, com bastante equilíbrio e taninos suaves. Entre os inúmeros produtores, alguns se destacam: Robert Arnoux, Dujac, Jean Grivot, Anne Gros, Domaine du Comte Liger-Belair, Méo-Camuzet, Jacques Prieur, Domaine de la Romanée-Conti etc.
Uma lenda diz que um poderoso domaine queria que seu vinho fosse classificado como Richebourg e pediu que seu Richebourg-sous-Veroilles fosse reclassificado. Curiosamente, duas letras de “sous” misteriosamente sumiram dos papéis durante a noite, criando uma designação “Richebourg ou Veroilles”, como se os dois nomes fossem alternativas, o que foi aprovado na comissão e o domaine obteve seu Richebourg.
O vinhedo fica entre 260 e 280 metros de altitude sobre solos de apenas 30 centímetros de profundidade compostos principalmente de depósitos calcários misturados com argila. Há pontos onde se encontram depósitos marinhos. Os pontos mais altos tendem a ter maturação mais lenta e a chaptalização costuma ser necessária.
O vinho proveniente de Richebourg, sempre tinto, costuma ter uma textura firme, robustez e grande estrutura, muitas vezes descrito como suntuoso. Muitos deles precisam de alguns anos em garrafa para serem melhor compreendidos. Dez anos seria uma boa espera. Alguns produtores de destaque são: Jean Grivot, Anne Grous, Méo-Camuzet, Domaine Leroy e Domaine de la Romanée-Conti.
Com pouco mais de 8 hectares, Saint-Vivant tem cerca de 10 proprietários e produz aproximadamente 3 mil caixas de vinho por ano. Ele já foi conhecido como Clos Saint-Vivant e pertenceu à abadia de mesmo nome, que fazia parte dos domínios de Cluny, anterior ao período dos cistercienses. O vinhedo era parte do jardim da igreja. Uma parte dele, tida como de qualidade inferior, foi rebaixada para o Premier Cru Croix Rameau. A primeira vez que o prefixo Romanée foi incorporado foi em 1651, graças à proximidade com Romanée-Conti.
A parte mais baixa é conhecida como Les Quatre Journaux. Journal equivale a uma antiga medida de terra, representando um terço de um hectare. Essa parcela costuma receber o nome cuvée Les Quatre Journaux de seus proprietários. Duas outras parcelas, conhecidas como Au Plans e Clos du Moytan foram reunidas na Cros des Cloux, que pertence ao Domaine de la Romanée-Conti.
O vinhedo tem ondulações gentis entre 255 e 260 metros, com a parte superior tendo mais concentração de calcário crinoidal e a parte mais baixa com mais argila. Diz-se que o vinho de Romanée Saint-Vivant é o mais delicado e feminino dos Grand Cru de Vosne-Romanée, muito semelhante a Musigny. Um vinho etéreo. Alguns de seus melhores exemplares são feitos por produtores como Robert Arnoux, Dujac, Domaine Leroy e Domaine de la Romanée-Conti.
O vinhedo foi um presente de Carlos Magno, em 775, para igreja de Saint-Andoche de Saulieu. Entre os diversos climats há também alguns históricos, como o Clos du Roi, dedicado aos reis da França que dominaram a região, ou Les Maréchaudes e La Doix. Bonneau du Martray talvez seja o vinhedo mais famoso, com vinhas somente em Charlemagne, e que teriam pertencido a Carlos Magno.
Corton-Charlemagne fica em encostas íngremes (20 a 23%) e na parte mais alta da montanha de Corton, entre 280 e 330 metros, com solos do período Jurássico, de 145 milhões de anos, ricos em argila e bancos calcários se alternando. O vinho Chardonnay local é de uma delicadeza infinita, com aromas de manteiga, maçã assada, citrinos, abacaxi, notas de mel etc. Ele apresenta grande concentração e muito equilíbrio. Vale a pena ficar de olho no que produzem Bonneau du Martray, Domaine Bertagna, Bruno Clair, Jean-François Coche-Dury, Faiveley, Louis Jadot, Domaine Leroy etc.
Mont Rachet, monte calvo, é a pequena elevação a oeste da vila de Puligny-Montrachet. O vinhedo Le Montrachet é considerado a fonte dos maiores vinhos brancos do mundo. É o Chardonnay mais complexo, expressivo e intenso que existe.
Ele fica entre os vinhedos de Chevalier-Montrachet e Bâtard-Montrachet e se divide quase que igualmente entre as comunas de Puligny-Montrachet e Chassagne-Montrachet. São pouco menos de 8 hectares com mais de 15 proprietários e produção anual de aproximadamente 3,5 mil caixas.
Acredita-se que a qualidade desses vinhos já era conhecida desde o século XVIII apesar de apenas na segunda metade do século XIX terem sido plantadas as vinhas de Chardonnay. Antes, havia uma mistura de cepas indígenas, como Aligoté e Gamay. Montrachet já foi descrito por ninguém menos que Alexandre Dumas (Os três mosqueteiros). Até 1990, quando o Domaine Leflaive comprou 0,08 hectare, nenhuma parcela do vinhedo pertencia a um produtor de Puligny.
Em Montrachet, os solos – entre 250 e 270 metros acima do nível do mar – são pouco profundos sobre um calcário duro, atravessado por uma faixa de marga avermelhada. A proteção de Mont Rachet contra os ventos é decisiva no terroir. Diz-se que seu vinho “abre as portas do paraíso”. Ele é untuoso e firme, seco e sedoso, envolvente e profundo. Tem fruta madura, acidez na medida, concentração, complexidade, textura suave e equilíbrio. Entre os produtores de maior destaque estão Blain-Gagnard, Comtes Lafon, Domaine Leflaive, Jacques Prieur, Ramonet, Domaine de la Romanée-Conti etc.