A bebida dos artistas

Conhecido como "Fada Verde", o absinto conquistou pintores conceituados e foi retratado em seus quadros

Fernando Roveri Publicado em 24/07/2007, às 06h41 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h44

Segundo o dicionário Aurélio, uma das definições para a palavra arte é: "capacidade que o homem tem de, dominando a matéria, pôr em prática uma idéia". Munidos dessa capacidade e também de muita imaginação, grandes artistas representaram, por meio de seus quadros, acontecimentos que assombraram a humanidade, como as obras de Goya e o, "Guernica", de Picasso. Além de amores, medos, angústias, problemas existenciais, enfim, uma série de sentimentos que buscam a interpretação do olhar.

The Absinthe Drinker (Pablo Picasso)
Natureza Morta com Absinto (Vicent Van Gogh)
O Bebedor de Absinto (Édouard Manet)

Artistas de várias épocas também demonstraram, pela arte, o apreço pelos prazeres da vida. Desde os quadros de natureza morta até outros que representam cozinhas e banquetes, uma bebida em especial foi retratada de forma primorosa pelos mais famosos pintores da história: o absinto. A polêmica bebida já serviu como remédio, depois foi proibida para consumo e retornou recentemente aos cálices de seus apreciadores. Muito alcoólica e de sabor forte, o absinto foi a bebida preferida de mestres como Van Gogh, Degas e Manet, e também muito apreciada por escritores e poetas como Baudelaire, Paul Verlaine, Fernando Pessoa, Eça de Queirós e Ernest Hemingway.

A bebida sempre esteve relacionada à França, mas sua origem é suíça. Sua história começa em 1792, quando o médico e monarquista francês Pierre Ordinaire utilizou a planta Artemisia absinthium para fabricar um digestivo. Anos depois, adicionou álcool nesta fórmula para torná-la mais potente. Primeiramente utilizada como medicamento, o absinto começou a ser tomado constantemente na Suíça e expandiu fronteiras pela Europa. Por causa de sua cor esverdeada, foi apelidado de Fada Verde. A bebida contém também outras substâncias como funcho e anis, com sabor bastante evidente deste último elemento. Figura entre as bebidas com maior teor alcoólico já feitas: cerca de 53,5% de seu volume, mais do que um destilado conhecido pela alta quantidade de álcool, a vodka, que tem cerca de 40% de álcool na composição.

O absinto na arte
Quando a bebida saiu da Suíça para ganhar proporções geográficas maiores, um de seus portos seguros foi a França. Rapidamente, Paris se tornou a capital da bebida, onde todos a degustavam, principalmente os artistas de vanguarda da época. Quando esteve na capital francesa, o escritor Oscar Wilde e o poeta Charles Baudelaire não deixavam de tomar um cálice de absinto. Empolgados, os artistas fizeram do absinto a fonte de inspiração para grandes quadros, e por isso, até hoje, a bebida é relacionada à arte por sua união com os pincéis.

Um dos primeiros artistas a retratar o absinto na tela foi o francês Edgar Degas. Em 1876, ele fez L'Absinthe. O quadro é uma alusão à noite parisiense, à boêmia e, é claro, a esta sutil bebida. Degas foi um precursor em retratar o comportamento da sociedade de sua época, mas sua obra ficou mais conhecida pelos quadros de bailarina. Assim, como todo artista de seu tempo, Degas adorava a vida noturna e regozijava-se com mulheres e bebidas. Filho de um rico banqueiro, ele deixou de lado todos os valores tradicionais para dedicar-se à pintura. Sua obra foi ridicularizada em alguns momentos, mas posteriormente ganhou notoriedade, como a maioria dos gênios incompreendidos. Em 1890, o quadro foi exibido juntamente a outras obras, e foi chamado de "imoral", "vulgar" e "degradante".

Outro pintor francês que também gostava muito de absinto era Édouard Manet, jovem sociável que fez muito sucesso no círculo de intelectuais e aristocratas parisienses. Ele era amigo do poeta Charles Baudelaire, e ambos gostavam de festas, vinhos e absinto. Entre 1858 e 1859, ele assinou O Bebedor de Absinto, que mostra um homem envolto em um sobretudo, ao lado de uma taça da bebida. Assim como o quadro de Degas, a alusão ao absinto envolve a vida noturna.

Uma exceção a essa regra é a obra do polêmico Vincent Van Gogh. O pintor holandês viveu muitos anos na França, período no qual mais produziu obras de arte, entre elas o famoso Quarto em Arles. Mesmo passando por problemas psíquiatricos, também apreciava a bebida. O absinto também esteve presente em sua obra, como no quadro Natureza Morta com Absinto, de 1887. Como toda obra de Van Gogh, o quadro tem pinceladas fortes, levemente irregulares, que caracterizou seu estilo de pintura. Neste, uma garrafa de absinto repousa sobre a mesa de um bar, como se estivéssemos na frente dela.

Outro apreciador da bebida foi o mestre Pablo Picasso. Antes de se dedicar totalmente à pintura cubista, ele fez The Absinthe Drinker, em 1901. Um belo trabalho que mostra uma figura feminina junto a uma taça com a famosa "Fada Verde". Assim como o quadro de seus antecessores, a tela mostra um personagem feminino que se deleita com a bebida durante a noite.

Outros grandes artistas plásticos também degustavam o absinto: Toulouse- Lautrec, Monet, Gauguin, Klimt... sem dúvida, a Fada Verde foi uma das bebidas mais associadas às arte plásticas. Um brinde aos grande artistas, com absinto, é claro!

L'Absinthe (Edgar Degas)