Central Otago, na Nova Zelândia, a terra do Pinot Noir no hemisfério sul

Região neozelandesa tem viticultura relativamente recente, mas conquistou o título de terra do Pinot Noir no hemisfério sul

Arnaldo Grizzo Publicado em 30/09/2022, às 07h50

A bela região neozelandesa de Central Otago -

Uma terra de geografia impressionante com montanhas, lagos e vales profundos. A região de Central Otago, no sul da ilha sul da Nova Zelândia é conhecida por produzir alguns dos melhores Pinot Noir do mundo fora da Borgonha e, obviamente, por suas paisagens fascinantes. É uma das regiões vinícolas mais meridionais do planeta e uma das mais extremas.

O vinho em Central Otago é cultivado e produzido na região desde a corrida do ouro da década de 1860. Jean Desire Feraud, um garimpeiro francês, comprou terras perto de Clyde e ergueu um pequeno edifício de pedra em Monte Christo. Dali surgiam os primeiros vinhos de Central Otago. Em 1881, Feraud ganhou a primeira medalha de ouro da região com seu “Borgonha”, em uma feira de Sydney, na Austrália.

No final do século XIX, o governo nomeou Romeo Bragato (um dos principais nomes da viticultura da Oceania) para fazer um levantamento, avaliar e identificar regiões com grande potencial vitícola. Bragato surpreendeu-se ao chegar a Central Otago, afirmando que “não me parece haver nenhum limite à produtividade daquele magnífico território”. Ele identificou que variedades de clima frio prosperariam, incluindo Pinot Noir e Riesling. “Não havia país na face da terra que produzisse melhores uvas da Borgonha do que as produzidas em Central Otago”, chegou a afirmar.

No entanto, apesar da visão e otimismo de Bragato, as plantações de frutas dominaram a paisagem até a década de 1980, quando os pioneiros da vinificação de Central Otago fizeram a primeira produção comercial moderna de Pinot Noir. Rolfe e Lois Mills em Rippon Vineyard de Wānaka, Alan Brady em Gibbston Valley, Anne Pinkney em Whakatipu e Sue Edwards e Verdun Burgess em Black Ridge, perto de Alexandra, plantaram uvas e começaram a vinificação naquela época.

Central Otago é uma das regiões vinícolas mais meridionais do planeta

Longe do resto da incipiente indústria vinícola do país e sem um manual para fazê-la funcionar em um ambiente tão extremo – uma paisagem semiárida, onde as temperaturas podem chegar a 35°C durante o dia e cair perto do congelamento à noite – esses pioneiros compartilharam seus conhecimentos, experiências e equipamentos de vinificação à medida que iam crescendo. Esse espírito de colaboração permanece até hoje.

Os pioneiros

O primeiro lançamento comercial de Pinot Noir foi da Gibbston Valley Winery, de Alan Brady, em 1987, e a novidade atraiu os fundadores da Chard Farm, Rob e Greg Hay. Tendo retornado da Alemanha, onde estudou enologia, Hay se apaixonou por Chard Farm, um pomar no alto de uma margem acima do rio Kawarau em Gibbston. Rob e seu irmão Greg então começaram a plantar videiras e posteriormente se tornaram referências.

No início dos anos19 90, Gibbston Valley Winery e Rippon ganharam medalhas em concursos e chamaram a atenção. Assim, em 1991, quatro proprietários de vinhedos na Felton Road de Bannockburn se uniram para criar Mt Difficulty, atualmente um dos maiores e mais proeminentes produtores da região. Com Queenstown como um ponto de referência, os vinhos de Central Otago passaram a atrair centenas de milhares de visitantes para a área todos os anos e hoje estão entre os mais conceituados produtores de Pinot fora da Borgonha.

Terra da Pinot?

Diz-se que a Pinot Noir atinge seu potencial máximo em um clima semiárido com dias quentes e noites frias. Central Otago é um lugar assim, com mudanças de temperatura de mais de 20 graus em um único dia. A baixa pluviosidade contribui para manter os cachos pequenos e o peso das bagas baixo, o que significa que há uma concentração excepcional nas uvas. Solos de baixa fertilidade e drenagem livre incentivam o crescimento profundo das raízes e, aos poucos, com o aumento da idade média das vinhas, vê-se uma maturidade e consistência interessantes na produção.

Solos de baixa fertilidade e drenagem livre incentivam o crescimento profundo das raízes

Situado a 45 graus ao sul (tida com uma latitude perfeita para Pinot Noir, pois a Borgonha e Oregon são 45-47 graus ao norte), Central Otago tem invernos frios, permitindo que as uvas descansem totalmente (atingindo -10 graus durante a noite), e o acúmulo de calor é modesto durante o verão, dando às frutas um longo período de maturação seca.

A primavera traz geadas –uma ameaça comum ao crescimento inicial das videiras – que sempre precisam de cuidado e o verão é tipicamente quente e seco, o que reduz a pressão de doenças e mantém as proporções de casca e suco altas. As uvas amadurecem após a mudança da estação para o outono e a região começa a esfriar. A baixa precipitação durante esse período garante a sanidade. Na colheita, as noites claras baixam as temperaturas abaixo de zero e as videiras começam a se preparar para a hibernação durante o inverno.

“A Pinot Noir gosta de ser desafiada pelo clima frio, mas, na maioria dos lugares em que se tenta encontrar esses climas, você começa a sair fora da estação, pois a chuva começa a vir. Na Nova Zelândia, o clima está sempre mudando rapidamente. Um dia se tem chuva. No seguinte, é ensolarado. Não há uma massa de terra muito grande, então os sistemas climáticos passam por nós, sempre mudando. Dizemos que temos quatro estações em um dia. E, como venta muito, as vinhas secam logo depois da chuva, então a pressão por doenças é pequena”, diz Blair Walter, enólogo da Felton Road.

Terroir

Os solos de Central Otago são frequentemente descritos como “semiáridos” devido aos verões quentes e clima seco. A maioria dos vinhedos recebe menos de 400 mm de chuva por ano (exceto Wānaka e Gibbston). Os solos podem ser altamente variáveis, mesmo a uma distância muito curta, dependendo da idade da superfície e da influência do manejo. Normalmente, são formados a partir de uma mistura de xisto e grauvaque que foram depositados por rios e geleiras.

Os solos da região podem ser altamente variáveis, mesmo em poucas distâncias

A idade dessas superfícies pode ser desde muito recente (alguns milhares de anos) até terraços glaciais mais antigos com mais de 600.000 anos. Os lodos soprados pelo vento (loess) têm sido frequentemente depositados sobre essas superfícies, às vezes com uma profundidade de mais de 500 mm.

Sub-regiões

Central Otago é dividida em sub-regiões com algumas peculiaridades. Confira:

Gibbston

Situado a leste de Queenstown ao longo de Kawarau Gorge, Gibbston é a sub-região mais alta, seu clima mais frio e as vinhas voltadas para o norte amadurecem mais tarde do que as sub-regiões vizinhas, dando vinhos mais leves.

Bannockburn

Na margem sul do rio Kawarau, no extremo sul do vale de Cromwell, os vinhedos ocupam um dos locais mais quentes e secos da região. A colheita pode ser até um mês antes de outras sub-regiões, e os vinhos produzidos são bastante complexos.

Cromwell, Lowburn e Pisa

Esta área está localizada no lado oeste do Lago Dunstan, estendendo-se ao norte por cerca de 25 km do município de Cromwell. A maioria das plantações estão situadas nos terraços mais baixos e no fundo do vale que correm paralelamente à cordilheira de Pisa coberta de neve.

Bendigo

A nordeste de Cromwell, Bendigo tem vinhas plantadas em encostas suaves voltadas para o norte. Plantações em larga escala em solos pedregosos capturam os climas extremos, sol quente de verão e noites frias e claras.

Wanaka

Um par de cadeias de montanhas e 80 km ao norte de Queenstown, Wanaka é mais fria e um pouco mais úmida do que o resto da região. O lago reflete a radiação do sol e atenua a geada produzindo vinhos delicados.

Alexandra

A sub-região mais ao sul, o clima é seco e chega a extremos no verão e no inverno. As acentuadas variações climáticas diárias até a colheita dão vinhos aromáticos e bem estruturados.

Pinot e outras castas

A Pinot Noir representa mais de 80% do cultivo na região, mas muitas outras variedades de clima frio são plantadas em Central Otago. Pinot Gris, o primo homônimo (e genético) do Pinot Noir, é a variedade branca mais popular – com pouco menos de 10%. A Riesling é outra que se destaca e é considerada por muitos o ponto alto de Central Otago (ao lado do Pinot).

Pinot Noir, a estrela da região

A Chardonnay tem desfrutado de crescente popularidade, com estilo fresco e frutado. Pequenas quantidades de Sauvignon Blanc, Gruner Veltliner, Gewürztraminer, Gamay e Syrah também são produzidas na região.

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