Mercado brasileiro de vinhos finos: um flash do desafio

Confira o crescimento da produção de vinhos brasileiros nos últimos anos e a difi culdade de concorrer com os produtos importados.

José Fernando Da Silva Protas Publicado em 16/03/2006, às 11h20 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h43

A agroindústria do vinho nacional, centrada no Sul do país, assumiu historicamente a exclusividade da produção e abastecimento da demanda do mercado interno brasileiro.

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Mais recentemente, especialmente a partir da década de 80, começaram a ocorrer investimentos com a implantação e a modernização das vinícolas (setor industrial), motivados por um mercado interno com potencial para produtos de melhor qualidade (vinhos finos) e de maior preço. No mesmo período, a agroindústria de suco conseguiu se destacar pela qualidade e singularidade do produto elaborado, vindo a conquistar mercados internacionais exigentes.

Paralelamente, verificou-se um intenso processo de implantação e modernização tecnológica das vinícolas e processadoras de suco. Porém, o setor de produção vitícola (produção agrícola) não participou da mudança com a velocidade e objetividade necessárias, embora já houvesse tecnologias disponíveis capazes de promover uma melhora significativa da produção. Como conseqüência desse quadro, a qualidade da matéria-prima nacional (uvas para processamento) tem apresentado potencial enológico inferior ao dos concorrentes, prejudicando sua capacidade competitiva no atual contexto de mercado globalizado.

Participação dos Vinhos Importados e Nacionais no Mercado Brasileiro de Vinhos Finos, 2001/2005 (1000 litros)
País 2001 2002 2003 2004 2005
Argentina 2.618.001
3,94%
3.884.432
6,96%
5.863.683
10,37%
11.210.771
17,44%
11.981.135
17,22%
Chile 5.175.898
7,77%
6.206.675
11,12%
7.971.749
14,11%
11.160.061
17,36%
11.685.418
16,79%
Outros

27.397.927 41,19%

16.463.321 29,50% 15.493.907 27,41% 16.786.455 26,18% 17.271.782 24,82%
Nacionais 31.327.391 47,10% 29.258.639
52,42%
27.189.888 48,11% 25.121.136 39,00% 28.650.377 41,17%
TOTAL 66.519.217
100,00%
55.813.067
100,00%
56.519.227
100,00%
64.278.423
100,00%
69.588.712
100,00%

Relativamente à estrutura produtiva e mercadológica, o setor vinícola brasileiro, concentrado no Estado do Rio Grande do Sul, apresenta uma característica atípica relativamente aos países tradicionais produtores de vinhos e derivados da uva e do vinho, pois, enquanto naqueles são admitidos apenas produtos originários de variedades de uvas finas (Vitis vinifera), no Brasil, além desses, existem produtos originários de variedades americanas (Vitis labrusca e Vitis bourquina) e híbridas, que representam mais de 80% do volume total de produção dessa cadeia produtiva, o que evidencia a existência de uma dualidade estrutural no setor.

O segmento de vinhos finos (vinhos tranqüilos e espumantes), com o processo de abertura da economia brasileira, tem enfrentado uma forte concorrência registrando-se taxas significativas de crescimento das importações de vinhos de mesa. No período de 2001-2005, a participação dos vinhos importados no mercado brasileiro de vinhos finos passou de 53% para 59% (tabela 1), sendo que, em 1994 essa mesma participação era de 31,6%. Por outro lado, fica evidente o espaço conquistado pela Argentina e pelo Chile no mercado brasileiro, em detrimento dos demais países exportadores, em especial dos europeus. Esse quadro se revela ainda mais preocupante quando confrontado especificamente com as estatísticas referentes à comercialização do vinho fino nacional (tabela 2 na próxima página), verificandose, no período 2001-2005, uma queda no volume absoluto comercializado de 15,5%, sendo que, quando analisado o período de 1999-2004, a queda foi de 47%; portanto, a perda de competitividade dos vinhos finos brasileiros no mercado interno, embora com uma inversão de tendência em 2005, tem se mostrado inexorável.

Com base na tabela 2, chama a atenção o significativo incremento verificado na comercialização dos espumantes, sobretudo dos "tipo moscatel", que no período apresentou um crescimento no volume comercializado de 122,2%. Da mesma forma, o crescimento consistente verificado nos volumes comercializados dos espumantes (Brut e Demi-Sec), que no período foi de 41,3%, também é significativo, podendo ser considerado fato raro, mesmo tratando-se de volumes absolutos relativamente pequenos. Este parece ser um dos segmentos dentro da cadeia vitivinícola com grandes possibilidades de crescimento, pois, além do potencial de expansão do mercado interno, há o reconhecimento internacional quanto à qualidade dos espumantes brasileiros, fator decisivo para sua inclusão na pauta de exportação de produtos brasileiros.

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Entretanto, o incremento do consumo dos produtos vitivinícolas nacionais e as nossas chances de ingresso no mercado internacional, além dos aspectos promocionais e outros, passa necessariamente por um ajuste nas políticas setoriais. Apenas para abordar parte dessa questão, vejamos alguns aspectos relativos à política tributária e seu desdobramento na nossa competitividade. Um estudo desenvolvido em 2005, no âmbito do Plano de Desenvolvimento Estratégico do Rio Grande do Sul - Visão 2025, apresenta a seguinte configuração relativamente à tributação incidente sobre a produção de uma garrafa de vinho no Brasil: Vinhos de Mesa: entre 36,5 e 47,2%; Vinhos Finos: entre 37,1 e 47,9 e Vinhos Espumantes: entre 38,1 e 49,2, do preço ao consumidor. Já na Argentina, esse valor é de cerca de 21% e no Chile 19%, segundo o mesmo estudo. Com essa carga tributária a onerar os custos de produção, além de outros fatores também de ordem política (cotas com imposto de importação diferenciados para o Chile, isenção de tributação para os países do Mercosul, incentivos via subsídios por parte dos países exportadores, entre outros), criou-se um cenário onde o Brasil perdeu a capacidade competitiva, tanto para vender o produto nacional no exterior quanto para se manter competitivo no próprio mercado interno.

Comercialização de vinhos, espumantes e sucos de uva do Rio Grande do Sul, 2001/2005 (1000 litros).
Vinhos 2001 2002 2003 2004 2005
vinhos de mesa 223.591.164 227.379.872 217.040.188 224.750.461 270.671.067
vinhos especiais 299.819 270.365 205.270 66.989 285.987
vinhos viníferas 25.910.072 25.259.850 23.211.221 19.727.449 21.906.759
TOTAL DE VINHOS 55.054.665 257.539.419 246.303.596 250.003.353 296.704.627
champanhes 4.021.737 3.741.548 4.775.864 4.805.280 5.682.526
moscatéis 477.531 525.997 594.038 671.874 1.061.092
TOTAL DE ESPUMANTES 4.499.268 4.267.545 5.369.902 5.477.154 6.743.618
TOTAL DE SUCO DE UVA 21.574.676 19.034.810 17.779.377 20.778.355 30.602.544

É evidente que os gostos e preferências dos consumidores, aliados ao poder de compra, influenciam e por vezes determinam a escolha dos produtos a serem consumidos. Entretanto, no caso do mercado brasileiro de vinhos finos, verifica-se, independentemente de ainda haver quem valorize o "status" de produto estrangeiro, com freqüência a oferta de vinhos importados a preços inferiores aos dos nacionais.

Portanto, o crescimento da venda dos vinhos importados no mercado interno brasileiro é absolutamente lógico, principalmente considerando que somos um mercado em formação, pouco exigente, onde, na maioria das vezes, a qualidade do produto, por falta de conhecimento, assume importância secundária na escolha do consumidor.