Novo restaurante "conceito" de São Paulo, cuja espinha dorsal é a cozinha mediterrânea, sediou nosso desafio enogastronômico
Luiz Gastão Bolonhez Publicado em 14/10/2009, às 11h06 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h46
Há muito afirmamos que, para uma boa cozinha, o que basta é um bom azeite e um bom vinho. São esses os protagonistas que concorrem ao prêmio de melhor ator; os outros componentes, apesar de importantes, são sempre coadjuvantes.
Neste Enogourmet, vinho e azeite, sem dúvida, foram os astros em um jantar que trouxe o melhor da cozinha do Mediterrâneo. A dupla de jovens empresários egressos do mercado financeiro, Diogo Seixas e Michel Viganô - que comandam um fundo de capital de risco denominado Greenfield Investment Partners -, decidiram investir na construção de um projeto inovador, que batizaram D'olivino Restaurante.
Como bons homens de finanças investiram seis meses de estudos direcionados a um projeto cheio de diferenciais no setor da gastronomia. Após esse período, "descobriram" um ponto estratégico da rua Haddock Lobo, nos Jardins. O conceito base da nova casa é de restaurante e empório, com uma proposta que vai além de oferecer uma apetitosa e saudável cozinha mediterrânea. Tem como objetivo difundir a cultura milenar relacionada aos azeites extravirgem e vinhos do Mediterrâneo.
Como complemento, há a intenção de também ser reconhecido como referência na difusão e comercialização desses produtos milenares. No charmoso espaço do mezanino tem duas lindas adegas climatizadas (uma para vinhos tintos e outra para vinhos brancos), um grande armário de azeites e uma belíssima mesa de degustação, onde serão ministrados cursos e degustações dessas duas vertentes marcantes da culinária mediterrânea.
Além do local, produtos, parceiros e plano estratégico, Michel e Diogo investiram sobremaneira no time de atendimento e cozinha. Para comandar o salão, a simpática e dedicada maître: a suíça Diana Huber. Ainda no salão temos o competente sommelier Ewerton Magalhães, que fez um serviço impecável. No comando da cozinha, está o vibrante e jovem chef André Castro.
Preparação
Como sempre, uma das atividades mais deliciosas, além do próprio evento, é a preparação. Diogo foi o líder de todas as sugestões, que passaram pelo crivo acurado do jovem chef André. Nosso planejamento foi dinâmico e, ao mesmo tempo, minucioso.
Mais uma grande batalha com oito vinhos e, nesse caso, oito pratos, pois não tivemos nem mesmo couvert. Ficava claro, desde o planejamento do jantar, que estávamos diante de profissionais loucos por um evento em que o destaque é a enogastronomia.
Foi no dia 16 de setembro que tivemos o prazer de reunir um seleto grupo de apaixonados por uma boa mesa na nova casa. Todos estavam ansiosos por uma noite de harmonizações que prometiam surpreender.
Além, é claro, do trabalho duro que tínhamos pela frente; desfrutar maravilhosos pratos e excelentes vinhos aliados a uma boa conversa.
Os presentes à mesa eram André Vasconcelos (executivo do setor financeiro), Fábio Reis (empresário do setor de entretenimento), Fábio Leme (executivo do setor de tecnologia e serviços), Luís Philippe Ferraz de Lima (empresário do setor de gastronomia), Roberto Jeolas (empresário do setor hoteleiro), João Muniz (advogado), Christian Burgos (Publisher de ADEGA) e seu editor de vinhos.
#Q#Polvo e espumante
O primeiro encontro à mesa foi o Pulpo a Gallega - uma derivação do espanholíssimo Pulpo a la Fiera - acompanhado pelo delicioso Billecart Salmon Brut Reserve. Os tentáculos de polvo, em pedaços de três centímetros, foram cozidos e finalizados no azeite extravirgem, com vinho, cebola, tomate-cereja e páprica picante.
O picante da páprica deu certo, pois o conjunto ficou provocante e casou com perfeição ao lado do especial espumante. Sempre que tivermos algo picante à mesa, os champagnes não safrados são quase sempre uma companhia excelente. Fábio Leme comentou: "O contraste da páprica e o frescor do tomate foram muito bem ao lado do excepcional champagne".
Massa com frutos do mar
No próximo encontro, mudamos o sotaque de espanhol para italiano, mas respeitando integralmente o conceito de cozinha mediterrânea. André preparou um Tagliatelle Nero com frutos do mar.
A diferença nesse prato - e que foi um fator crítico de sucesso com o vinho - foi que o chef não colocou tomate no molho, preparado com camarão, polvo, e lula, com um toque de vinho branco e azeite extravirgem.
Na hora de servir, foi adicionado um toque de manteiga congelada, o que conferiu uma cremosidade impressionante à massa fresca, preparada na casa com tinta de lula. O conjunto do prato estava sublime, com personalidade e sabor. E o vinho? Precisávamos de um branco com intensidade e também estilo.
Pois bem, o consorte desse prato foi o branco chileno Chardonnay Secreto, da Viu Manent, da safra 2007. Um vinho repleto de vida, com toques madeira, muita fruta e uma provocante acidez. "Harmonização perfeita", exclamou Fábio Reis. "União como essa entre prato e vinho causa um arrepio de tão sensacional", completou.
Risoto e Rioja
O terceiro encontro foi um casamento na mais profunda acepção da palavra. De um lado estava o Gamberi alla Marinara e, de outro, um branco riojano. O prato foi preparado com arroz arbóreo e arroz selvagem, aspargos verdes frescos e açafrão, acompanhados por camarões ao molho de ervas com azeite extravirgem.
A marcante textura dos aspargos (crocantes) entrelaçados ao inusitado risoto, com a maciez dos camarões e o toque do azeite, deram ao prato um conjunto impecável, com muita complementaridade.
O vinho não podia deixar de ser muito especial, que aliasse força à certa elegância. A sensação que a maioria dos presentes teve foi que o Vetiver 2005, da Bodega Ontañon, foi construído para o prato, tamanha a harmonia.
Tudo parecia sob medida, pois os toques fumados do prato formaram uma sinfonia ao lado da deliciosa carga de madeira, frutas tropicais e frutas secas do vinho. Ao final de nosso enogourmet, essa foi eleita a harmonização da noite, com cinco votos dos oito participantes.
Vitela e Borgonha
A sequência se deu com o encontro entre o Veaux au Poivre Vert et Rouge com o Aloxe-Corton 1er Cru Les Fournières 2005, de Antonyn Guyon. Um casamento mediterrâneo, mas com sotaque totalmente francês.
O prato parece um tanto exótico, mas, como um bom clássico, agrada muito pela suavidade da carne de vitela que foi preparada ao molho rôti com pimentas verde e rosa, enriquecidos com azeite extravirgem e guarnecidos por uma galette de batata recheada com queijo brie.
A apresentação do prato estava linda, com detalhes coloridos junto ao leve tom rosa dos filés de vitela. Aqui um detalhe importante. As pimentas estavam muito boas, mas eram marcantes demais e passaram um pouco do limite de intensidade para que a harmonização fosse perfeita.
O ideal foi sacá-las da vitela. A vitela - com o aroma da pimenta e com a deliciosa galette de batatas cremosa com o queijo brie - formou um delicioso conjunto, que tinha muita elegância e presença. O Borgonha, leve e com sensualidade de sobra, fez o papel de complementar o prato, causando uma sensacional sensação no palato.
#Q#Risoto toscano e Brunello
O próximo prato era um dos mais tradicionais da Itália, o Risotto Toscano, ao lado de um Brunello di Montalcino. A iguaria foi elaborada a partir de arroz arbóreo com linguiça artesanal toscana e vinho tinto, enriquecido com radicchio e azeite extravirgem aromatizado com alecrim.
O conjunto, tanto aromático quanto gustativo do prato, estava espetacular. A rusticidade do radicchio in natura contrapôs com a cremosidade do arroz e a textura do camarão, que estava excelente. O prato tinha uma composição equilibrada e precisava de um vinho vivo e alegre com boa acidez.
O Brunello 2003 da casa Caparzo fez o papel com muita eficácia. Roberto foi enfático: "Vinho maravilhoso com um prato de força; casaram excepcionalmente. Um conjunto com o sabor da Toscana".
Cordeiro e Douro
A última etapa antes dos queijos foi a harmonização entre um prato grego e um elegante duriense português. A obra prima mediterrânea do chef André foi o Yuvetsi Kritharaki: um lombo de cordeiro ao molho de vinho tinto, canela e alecrim, acompanhado por Kritharaki - uma cremosa massa em formato de arroz, com queijo feta, molho pomodoro e azeitonas gregas.
O intenso cordeiro estava com muita potência e a canela era marcante. A massa estava deliciosa e presente, em que o queijo e o tomate se contrapunham (ácido e básico). Cordeiro mais Khitharaki formaram no palato um conjunto extraordinário com sabores contrastantes.
O líquido de Baco, para estar ao lado desse especial prato, não podia deixar também de ser muito especial. Acertamos na mosca. O vinho apresentou um buquê impactante com uma carga floral impressionante (muita violeta).
Muito perfumado, contrastava com o buquê da canela do cordeiro. Quando unidos no palato, a sintonia foi total. Um silêncio pairou à mesa. Prato e vinho cresceram lado a lado. Uma estonteante harmonização.
Queijos
Chegou a hora dos queijos. André colocou dois deliciosos queijos de massa dura; um belo Parmesão e um marcante Pecorino, ao lado de Roquefort, Brie e Boursin - este preparado na casa com queijo fresco de cabra e leves especiarias.
Colocamos nesse desafio de harmonização um vinho monumental, com muita força, presença e corpo: o Pujanza Norte 2005, da Bodega Pujanza de Rioja. A harmonização do vinho foi mais para os queijos de massa dura. Excepcional ao lado do parmesão. Esse fechamento deu mais luz ao vinho que aos queijos, pela sua incrível potência.
Mousse e Tawny
Para fechar, uma clássica harmonização entre uma sobremesa de chocolate com um Porto Tawny. De um lado tínhamos a Mousse Callebaut. Um doce muito delicado e com doçura média e cremosidade sem fim. Do outro, tínhamos o Porto 10 Anos da tradicional Casa Messias.
A combinação do fortificado com uma densidade incomum e a elegante doçura do Mousse fez com que nossa noite acabasse com aplausos, pois estávamos fechando em grande estilo a prática da harmonização entre uma deliciosa culinária (com muito azeite extravirgem) e excelentes vinhos. Saúde!