Entenda as mudanças nas regras de denominação de origem do Prosecco

Assim como acontece com o Champagne, nem todo espumante pode carregar o nome Prosecco

Por Eduardo Milan Publicado em 21/07/2014, às 00h00 - Atualizado em 03/06/2019, às 12h17


Existem registros do termo “Prosecco” desde o século XVIII. Mas, o primeiro a produzir comercialmente espumantes a partir da uva Prosecco foi o químico e enólogo Antonio Carpenè, por volta de 1860


O mapa mostra a área da Denominação de Origem Controlada de Prosecco e, aponta, em verde, os nomes dos 43 Rive

Todo mundo sabe o que é Prosecco, certo? A resposta para essa pergunta é: depende. Muitos usam o termo para se referir a um vinho espumante; ou seja, ele é quase um sinônimo de espumante de festa. Originalmente, o Prosecco é mesmo bastante conhecido no mundo todo como sendo um espumante fresco, simples e convidativo. Quantas vezes não ouvimos alguém dizer que “o Prosecco servido no casamento estava ótimo”? Nesse sentido, a maioria das pessoas sabe que Prosecco é um espumante branco. Agora, nem todos sabem que, assim como acontece com o Champagne, nem todo espumante pode carregar o nome Prosecco.

De fato, desde meados de 2009, existem regras tratando do assunto, determinando que apenas espumantes que observem certas normas possam ser chamados de Prosecco. Muito superficialmente: apenas vinhos produzidos em áreas determinadas do Vêneto e de setores do Friuli.

Você então pode dizer: “Ok, se essas regras existem desde 2009, por que ainda hoje é possível encontrar no mercado até mesmo espumantes nacionais ostentando o nome ‘Prosecco’ no rótulo?”. Bem, isso se dá porque “Prosecco” é o vinho, mas também é a uva branca nativa da Itália com a qual se produz o espumante Prosecco. Quer dizer, era o nome da uva, pois foram editadas normas alterando isso também; atualmente, a cepa anteriormente chamada Prosecco é denominada Glera. Assim, ainda que esteja levando um tempo, fato é que todos os produtores de fora das regiões demarcadas que nomeiam seus espumantes de Prosecco terão que se adaptar.

Na verdade, recentemente, o universo do Prosecco está vivendo uma época repleta de mudanças. Desde a legislação ter se tornado mais rígida, até a redefinição das áreas produtoras e o surgimento de novas denominações, há bastante novidade, muita coisa a ser conhecida.

Pirâmide qualitativa

Desde agosto de 2009, com a modificação da legislação e do nome da uva para Glera, Prosecco passou a ser basicamente a designação de uma denominação de origem. As áreas DOC passaram a ter status DOCG (Denominazione di Origine Controllata e Garantita) e as áreas IGT passaram a carregar o status DOC.

Com essa reviravolta toda, obviamente, muito mais espumantes – incluindo aqueles feitos a partir de uvas de vinhedos de alta produtividade, colhidas mecanicamente e, claro, de perfil mais genérico e mais baratos – puderam se qualificar como DOC. A reação natural foi que produtores da DOC original – cujos vinhedos são pequenos, cuidadosamente cultivados há séculos e onde a colheita normalmente é manual – desejassem separar seus vinhos desses novos DOCs. Assim, foi criada a nova denominação DOCG. No final das contas, ocorreu toda uma reorganização na produção de Prosecco, categorizada por qualidade, facilitando o entendimento do consumidor acerca do produto.

Os Rive são parcelas de terra especiais. No dialeto Vêneto, referem-se aos vinhedos das encostas íngremes

É como uma pirâmide. Na base dela estão os Prosecco DOC. Acima deles estão os Conegliano Valdobbiadene Prosecco Superiore, “nome completo” da DOCG – os primeiros Proseccos foram feitos nas encostas dessas duas cidades e, indubitavelmente, é lá que a Glera se dá melhor. Dentro da área Superiore, a nova legislação manteve a já existente sub-região de Cartizze – uma pequena área de 106 hectares de vinhedos, localizada nas colinas íngremes entre San Pietro di Barbozza, Santo Stefano e Saccol, em Valdobbiadene que, de acordo com o Consórcio, é uma espécie de Cru da DOCG – e criou uma nova categoria para um número determinado de parcelas de terra especiais, as chamadas Rive. No dialeto local, a palavra “rive” refere-se aos vinhedos plantados nas encostas íngremes e, de certa forma, no Vêneto, corresponde ao termo francês “Cru”.

Os Superiore di Cartizze são espumantes suntuosos, de coloração intensa e complexidade de aromas, que vão desde maçãs e peras, até damascos, frutas cítricas e rosas, com notas amendoadas. No palato, costumam ser redondos e apresentar toques salinos e borbulhas delicadas que ressaltam seus sabores.


Tradicionalmente produzidos pelo método Charmat, há produtores que vêm experimentando fazer seus vinhos pelo método tradicional, com segunda fermentação em garrafa

Há 43 Rive em Conegliano Valdobbiadene, cada uma delas com características únicas e próprias da pequena área produtora correspondente. Os Rive são feitos exclusivamente de uvas cultivadas no local e vinificados com foco em incutir as qualidades que cada terroir específico pode conferir ao vinho. O aspecto interessante de degustar Rives comparativamente está justamente em poder conhecer diferentes nuances da zona de Conegliano Valdobbiadene através desses vinhos. A produtividade nos Rive é limitada a 13 toneladas por hectare. Além disso, a colheita das uvas obrigatoriamente deve ser manual e a safra precisa estar indicada no rótulo.

Falando em safras, a maioria dos Proseccos não é safrado, o que permite que os enólogos façam blends utilizando vinhos base do ano anterior na produção de safras atuais, por exemplo. Entretanto, cada vez mais, as melhores vinícolas têm produzido “millesimatos”, ou seja, Proseccos que levam uvas de uma única safra em sua composição.

Novidades

Na região tem se visto um alto grau de especialização e experimentação dos enólogos na busca de espumantes de qualidade cada vez mais alta

Em toda a região onde se produz Prosecco, além da atenção às novas regras, tem se visto um alto grau de especialização e experimentação dos enólogos na busca de espumantes de qualidade cada vez mais alta. Além de investir em millesimatos, muitos vão mais longe, vinificando apenas uvas de um único vinhedo (single vineyards), normalmente já dentro de um Rive, por exemplo.

O método de produção também passa por mudanças. Tradicionalmente, em atenção aos ensinamentos vindos de 1800, da Scuola Enologica de Conegliano, pela qual os produtores locais têm muito respeito e afeição, os Proseccos são produzidos pelo método Charmat, ou seja, após a primeira fermentação em tanques de aço inoxidável, a bebida passa pela segunda fermentação em grandes tanques pressurizados – as autoclaves – para se tornarem espumantes. No entanto, não há nenhuma norma escrita determinando que os Proseccos devam ser produzidos dessa forma. Assim, vem se observando recentemente um crescente número de enólogos experimentando fazer seus vinhos pelo método tradicional, com segunda fermentação em garrafa. O que se tem obtido são espumantes mais secos, com mais toques de levedura e maior complexidade que a maioria dos exemplares tradicionais.

Enquanto alguns tentam novas técnicas, outros buscam inspiração no passado. Exemplo disso é a utilização de sur lie, que era como se fazia a segunda fermentação antes da existência das autoclaves. Nesse caso, após o engarrafamento, é adicionada uma pequena quantidade de levedura ao vinho para viabilizar a refermentação, mas, ao contrário do método tradicional, não se faz o dégorgement e os sedimentos permanecem em garrafa, dando um espumante levemente turvo, que combina rusticidade e elegância.

Também de olho no passado, alguns produtores têm utilizado uvas de vinhedos mais velhos – de 80, 90, 100 anos – na produção de seus Proseccos. Esses normalmente são mais robustos, vivos e elegantes e têm um toque de mineralidade um pouco mais acentuado.

Glera

A uva Glera, anteriormente chamada de Prosecco, é ideal para a produção de espumantes de qualidade. Isso porque apresenta baixo teor alcoólico e ótima acidez. Além disso, tem aromas bem distintos de peras e maçãs, com toques florais, que são a marca registrada do Prosecco. De acordo com a legislação em vigor, os espumantes devem levar obrigatoriamente pelo menos 85% de Glera em sua composição, embora a maioria dos produtores a utilizem em porcentagem ainda maior. Os 15% restantes podem ser compostos por outras variedades locais de menor expressão, como a Verdiso (normalmente utilizada para conferir mais acidez), a Perera (que geralmente confere mais intensidade aromática) e a Bianchetta. A DOCG permite, ainda, que se use, em pequenas quantidades, Chardonnay e Pinot Noir.

Vinhos avaliados

 

AD 89 pontos
COL VETORAZ DRY VALDOBBIADENE SUPERIORE
DOCG MILLESIMATO 2012
Col Vetoraz, Vêneto, Itália. Aromas de frutas brancas e de caroço maduras, com notas florais, herbáceas e minerais. No palato, confirma as frutas do nariz, é redondo, cremoso, tem acidez refrescante e final gostoso e suculento. EM

AD 89 pontos
MASOTTINA BRUT CONEGLIANO VALDOBBIADENE DOCG
Masottina, Vêneto, Itália. Aromas de frutas brancas e de caroço mais maduras, com notas florais, minerais e herbáceas. É frutado, num estilo mais austero, tem ótima acidez, bom volume de boca e final persistente e cremoso, lembrando maçãs verdes. EM

AD 91 pontos
MASOTTINA LE RIVE DI OGLIANO EXTRA DRY CONEGLIANO VALDOBBIADENE DOCG
MILLESIMATO 2011
Masottina, Vêneto, Itália. Num estilo mais austero e fresco, mas num contexto de mais elegância, com notas tostadas e defumadas no final. Mais longo e intenso, maior volume de boca e melhor intensidade. EM

AD 91 pontos
NINO FRANCO Vigneto della RIVa DI SAN FlORiANO BRUT VALDOBBIADENE DOCG MILLESIMATO 2011
Nino Franco, Vêneto, Itália. Cativantes aromas de frutas brancas e de caroço maduros envoltos por notas florais e herbáceas. No palato, confirma essa fruta suculenta e agradável, tem ótima acidez, boa cremosidade e final persistente. Surpreende pela estrutura e finesse do conjunto. EM

AD 89 pontos
PIANER EXTRA DRY VALDOBBIADENE DOCG
Le Colture, Vêneto, Itália. O clássico Prosecco, cheio de aromas de frutas brancas maduras envoltos por notas florais e herbáceas. Fresco e estruturado, tem boa cremosidade, acidez na medida e final médio e delicado, convidando a mais um gole. EM

AD 89 pontos  
QUARTESE BRUT VALDOBBIADENE DOCG
Ruggeri, Vêneto, Itália. Os aromas lembram frutas brancas, como maçãs, além de notas florais e de pão tostado. No palato, é frutado, fresco, estruturado, equilibrado, tem boa cremosidade, ótima acidez e final de média persistência. EM

AD 89 pontos
UNDICI DRY VALDOBBIADENE DOCG
Col Sandago, Vêneto, Itália. Aqui se tem mais aromas de frutas cítricas envoltas por notas florais e herbáceas. No palato, é fresco, redondo e cremoso, tem bom equilíbrio entre acidez e doçura e final agradável e de média persistência. EM

AD 91 pontos
VILLA SANDI VIGNA LA RIVETTA VALDOBBIADENE PROSECCO
SUPERIORE DI CARTIZZE DOCG
Villa Sandi, Vêneto, Itália. Num estilo mais estruturado e austero, porém sem perder as cativantes características frutadas e florais dos bons Prosecco. Tem ótima cremosidade, acidez refrescante e final cremoso e persistente, cheio de toques minerais. EM

AD 91 pontos  
VIGNETI DEL FOL EXTRA DRY
VALDOBBIADENE DOCG
Bisol, Vêneto, Itália. Chama a atenção pela elegância tanto pelos aromas de frutas brancas mais frescas envoltos por notas florais, quanto pela estrutura do conjunto, cheia de frescor, delicadeza, mas também com intensidade e vibração. EM

AD 90 pontos
VIGNETO DI GIARDINO RIVE DI COBERTALDO DRY VALDOBBIADENE DOCG MILLESIMATO 2012
Adriano Adami, Vêneto, Itália. Aromas de pêssegos e abacaxi mais frescos, que se confirmam na boca, com notas florais e herbáceas. No palato, chama a atenção pelo volume e cremosidade, tudo num contexto de acidez refrescante e final persistente. EM

Denominação de Origem Prosecco Regras Glera pirâmide qualitativa