Apesar da crise que assolou o planeta, o mercado de vinhos no Brasil continuou aquecido, transformando-se em parada obrigatória para os melhores produtores, enólogos e empresários do mundo todo em 2009
Luiz Gastão Bolonhez Publicado em 07/12/2009, às 13h31 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h46
Mesmo em pleno momento crítico da crise mundial que assolava o mercado financeiro no final do ano passado, uma visita ilustre parecia indicar que 2009 seria, apesar de tudo, um grande ano para os enófilos brasileiros. E, no dia 24 novembro de 2008, ninguém menos que Alexandra Marnier-Lapostolle chegava ao País. Duas semanas antes, Alexandra havia recebido o prêmio de "Wine of the Year", da prestigiada revista Wine Spectator, com seu vinho Clos Apalta 2005. O laurel teve grande repercussão mundial por ser o primeiro vinho da América do Sul a alcançá-lo. Assim, tivemos a honra de ser o primeiro país a ser visitado por Madame Lapostolle no "tour de celebração" e, sem dúvida, foi um indicador de que teríamos, com ou sem crise, um grande ano para o vinho no Brasil.
O mercado brasileiro começou 2009 entre os 10 mais importantes do mundo para vinhos finos e entrou definitivamente na rota de viagem dos melhores produtores, enólogos, críticos, jornalistas e empresários desse segmento. Além da participação em importantes feiras - Expovinis, World Wine Experience (Península Ibérica e Itália), Tour Mistral, Vini Vinci e as já famosas degustações de Wines of Argentina e Pro Chile -, estiveram paralelamente por aqui durante o ano "homens e mulheres" de imenso destaque no mundo do vinho atual - personalidades de quase todos os países produtores e reconhecidas em todo o planeta.
França, muito além de Bordeaux
Um dos pontos altos do ano foi a visita de um ícone da região de vinhos mais disputados em todo o mundo, a Borgonha. Quem veio foi a lenda Dominique Laurent, um ex-confeiteiro que começou como négociant e hoje é talvez a maior referência por lá. Para se ter uma ideia da genialidade de Laurent, na safra de 1997 ele produziu 67 rótulos diferentes, desde os mais disputados e caros Gran Cru da região até vinhos mais acessíveis como seu Número 1.
Prenúncio de um bom ano para os enófilos brasileiros aconteceu quando Alexandra Marnier Lapostolle veio ao País após ganhar prêmio de "Vinho do Ano"
Durante a visita, prestigiou-nos abrindo uma Magnum do Gevrey Chambertin Vieilles Vignes 2003 que confessou só existir em dois lugares do planeta: em São Paulo, com seu importador, e na cave de sua esposa em Gevrey Chambertin. Esse vinho inesquecível - já avaliado em nossa seção Cave -, tinha como diferencial ser proveniente de uma única barrica que gerou apenas garrafas Magnum
#Q#À esquerda e ao centro: Alexandra Marnier-Lapostole e seu "Wine of the Year" Clos Alpata 2005. À direita acima: o italiano Andréa Franchetti. À direita abaixo: o francês Dominique Laurent |
Ainda da França, recebemos o simpático gênio Florent Baumard. Apaixonado e com dedicação incomum à sua Domaine des Baumard, Florent apresentou seu espetacular Quarts de Chaume 2006, que foi um dos mais destacados vinhos de nossa matéria sobre o Vale do Loire (edição 45).
Também tivemos a visita de um médico que se tornou enólogo aos 30 anos e que, em 1985, ingressou no conglomerado Moët & Chandon, entrando em 1990 para o seleto grupo dos enólogos do mítico Champagne Dom Perignon. Seis anos depois, ele atingiu o título de enólogo chefe da casa. Com uma desenvoltura incrível em sua primeira visita ao Brasil, Richard Geoffroy apresentou-nos três faces do Dom Perignon - o Brut 2000, o Rosé 1998 e o extraordinário Oenotèque 1995. Destaque para o último, cujo objetivo é relançar Dom Perigon's antigos sem nenhum compromisso, ou seja, que estão nas caves em Epernay e que não foram dégorgé na ocasião do lançamento. Geoffroy chama os seus Oenotèque de "metamorfose", explicando que esses 6/7 anos a mais em contato com as leveduras transformam o vinho.
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À esquerda: a italiana Gaia Gaja, filha do genial Angelo Gaja. Ao centro acima: Marc de Grazia. Ao centro abaixo: os vinhedos da Fattoria La Massa, de Giampaolo Motta, que produz o vinho Giorgio Primo |
Itália, inovação e classicismo no mesmo território
Da Itália tivemos um sem número de visitantes, com destaque para produtores da Toscana e da nova região sensação, a linda e calorosa Sicília. Uma das mais importantes visitas foi do empresário Andréa Franchetti, que coincidentemente produz vinhos na Toscana e na Sicília. Na Toscana, localiza-se em uma região pouco explorada mais ao sul, onde ele produz dois vinhos tintos de excelente qualidade, o La Cupole, e o que leva o nome da casa, o Tenuta de Trinoro - cuja exuberante e espetacular safra 2006 apresentava-se reluzente e fazia brilhar os olhos de um homem obstinado pela qualidade.
Durante o jantar foram servidos também dois outros vinhos de sua propriedade na Sicília - nas cercanias do vulcão Etna. Surpreendentemente, Franchetti é fã confesso de castas "francesas" como Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc e principalmente Petit Verdot. Seu vinho top dessa propriedade leva o nome Franchetti, um puro Petit Verdot da safra 2006 - robusto e imponente, pode ser considerado o melhor varietal dessa casta já provado.
Outro destaque da Toscana que esteve por aqui é Giampaolo Motta, proprietário da Fattoria La Massa, que nos apresentou seus vinhos, com destaque para o tinto Giorgio Primo 2006 - o mais pontuado vinho da safra 2006 da Toscana avaliado na edição anterior em nossa seção Cave.
De volta à Sicília, destacamos a presença no País de um dos maiores responsáveis por consolidar o vinho italiano nos Estados Unidos, Marc de Grazia - uma espécie de embaixador do vinho italiano na América e que fez fortuna por lá. Sua coqueluche na Sicília se chama Tenuta delle Terre Nere, também nos arredores do Etna.
Importantes produtores europeus prestigiaram o mercado brasileiro em 2009, com destaque para França, Itália, Espanha e Portugal, que querem conquistar o paladar de nossos consumidores
Duas faces da mesma moeda, enquanto Franchetti é fã de uvas francesas, De Grazia é louco pelas castas locais e quase recita poemas sobre a Nerello Mascalese - espinha dorsal de todos seus vinhos. Seu Etna Rosso 2006 é um achado - alegre e apetitoso, vale cada centavo. Marc está aumentando seu foco em vinhos tops e logo estarão chegando por aqui seu vinhos pré-phyloxera, sempre à base da Nerello Mascalese e de sua irmã, a Nerello Capuccio.
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À esquerda acima: Olga Fernandez. À esquerda abaixo: Miguelangel Cerdá. Ao centro: as barricas da Herdade do Esporão |
Do Vêneto, tivemos a visita da mais especial "Donne del Vino d'Itália", a charmosa e elegante Marilisa Allegrini que, com seu irmão, comanda uma das mais renomadas propriedades da Valpolicella, em Verona. Mesmo com o sangue vêneto, a família não ficou só nas cercanias da belíssima Verona e, nos últimos anos, lançou alguns projetos, com destaque para sua nova propriedade na costa da Toscana, mais precisamente em Bolgheri.
O belíssimo Poggio al Tesoro já começa fazendo sucesso logo nas primeiras safras e a enérgica Marilisa, que várias vezes visitou nosso País, apresentou cinco vinhos, com destaque para o excepcional Palazzo della Torre 2006 - delicioso, com taninos aveludados e pronto para o consumo - e para o seu Amarone della Valpolicella Classico 2004 - uma lenda que está sempre entre os melhores da região, com aromas de ameixa negra muito madura seguida de tons florais e boca explosiva e muito persistente.
Já quase em novembro tivemos a visita de Gaia Gaja, filha do mais reluzente homem do vinho da Itália, Angelo Gaja. Gaia parece uma cópia do pai no sentido de sua determinação e principalmente energia - algo que os dois tem de sobra, muita sobra.
Gaia está se tornando habitué por aqui (também esteve no Brasil ano passado). Angelo, por sua vez, nos visitou em 2006 e 2007. A marca registrada Gaja, que completa 250 anos, é originalmente calcada em vinhos do Piemonte - que estão entre os vinhos mais disputados e caros de toda Itália. Seu Barbaresco e principalmente seus vinhos single vineyard Sori Tildin, Sori San Lorenzo e Costa Russi estão, ano após ano, entre os melhores e mais premiados italianos.
A nova vedete da família é a propriedade que Angelo adquiriu na costa da Toscana, mais precisamente em Castagneto Carducci, em plena Maremma. Denominada Ca' Marcanda, a família decidiu produzir vinhos à base das castas francesas Cabernet Sauvignon, Syrah e Petit Verdot, algumas vezes combinadas com Sangiovese. E Gaia nos apresentou, além dos piemonteses, o Promis - vinho base produzido em Maremma pela família, e que atingiu o máximo de performance nessa espetacular safra.
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À esquerda acima: Camille Seghesio. À esquerda abaixo: Marcelo Retamal. Ao centro: a vinícola de Viu Manent. À direita acima: Nicolas Catena Zapata. À direita abaixo: o vinho Marimar State Pinot Noir |
Espanha, alto potencial de mudança em um país de tradição
Da Espanha, tivemos uma enxurrada de visitantes ilustres, o que torna um desafio escolher os maiores destaques, porém consideramos três visitas como ilustrativas da recente produção espanhola.
Uma delas, a de um homem simples de Palma de Mallorca que começou produzindo vinhos em uma cuba plástica onde era armazenado leite de vacas, e que colocou a desconhecida uva Callet no mapa das grandes castas. Trata-se do simpático Miguelangel Cerdá, uma verdadeira simpatia humana que produz vinhos espetaculares como o A/N 2005 (A/N - Anima Negra).
Nossa segunda eleita é Olga Fernandez, filha do lendário e genial Alejandro Fernandez, um homem da terra, que fez fama com seu tinto Janus Pesquera - um dos vinhos mais desejados do planeta. Com mais de 80 anos, Fernandez prepara suas filhas para assumirem a liderança do negócio que, hoje, além dos vinhos Pesquera e Condado de Haza, na Ribera, tem ainda as propriedades Dehesa La Granja, em Toro, e a El Vínculo, na Mancha. Olga nos apresentou vinhos de todas as regiões citadas, mas os destaques foram os da Ribera, como o magnífico custo benefício Condado de Haza Crianza 2005 e os encantadores Pesquera Crianza e Reserva, ambos também de 2005.
Destacamos ainda a vinda de José Bezares, que nos apresentou uma artilharia da casa que comanda na Rioja, a moderna vinícola Marques de Vargas, onde a cepa Tempranillo reina quase que absoluta. Seus vinhos são muito especiais desde seu entry level, o Marques de Vargas Reserva 2004 (a casa não produz Crianza), passando pelo Reserva Privada 2001 e finalizando com Marques de Vargas Hacienda Pradolagar 2001 - sem dúvida um cult wine de tão espetacular e profundo ao aliar os dois lados de uma região que luta entre a tradição e a modernidade.
Portugal, encantos de norte a sul
Encerrando a incrível participação do Velho Mundo apontamos os assíduos vitivinicultores de Portugal. Fomos visitados por produtores de todas as regiões vitivinícolas da terra de Camões. Se levarmos em conta o número de visitas, os portugueses foram os campeões e os que mais investiram em viagens para o Brasil.
Destacamos dois produtores do Douro - região que apresentou a maior revolução relativa a vinhos tintos de mesa do mundo, nos últimos 10 anos -, e um de cada uma das regiões que, ao lado do Douro, maior relevância tem tido nos últimos tempos na produção de vinhos - ou seja, Alentejo, Bairrada e a nova sensação de Portugal, o Ribatejo, agora denominada somente de Tejo.
Do Douro, os destaques são Miguel Roquete, irmão de Tomás, enólogo da casa, assíduo por aqui. Tomás e Miguel são filhos de Jorge Roquete, proprietário da casa e responsável pela revolução feita na já famosa Quinta do Crasto. A alegria do encontro foi uma vertical do Quinta do Crasto Vinhas Velhas desde a safra 2001 até 2007. A degustação nos leva a concluir que estamos diante de um dos mais especiais vinhos do mundo hoje no quesito value for money.
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O outro representante do Douro é Dominic Symington, um dos proprietários do conglomerado Symington, que inclui as casas Graham's, Dow's, Warre's (essas focadas nos vinhos do Porto) e as propriedades Quinta de Roriz, Quinta do Vesúvio e Chryseia (direcionadas também aos vinhos tintos de mesa). Symington, uma mistura de britânico com português, trouxe vários vinhos, mas dois foram de tirar o fôlego. Seu Porto Graham's Vintage 2007 e o lançamento tinto: Quinta do Vesuvio 2007. A degustação do Porto veio a ser o evento técnico do ano de 2009, pois além de degustarmos o vinho em si, Dominic trouxe os sete componentes do fermentado para compararmos com o produto final. O vinho em questão é ainda superior ao inesquecível Graham's 1994 - até esse evento era o melhor produzido pela casa desde então.
Do Alentejo, tivemos a vinda do enólogo australiano, quase português, David Baverstock, que comanda a lindíssima Herdade do Esporão. Baverstock acompanhou Miguel Roquete e nos propiciou uma vertical do Esporão Garrafeira das safras 2000, 2001, 2003, 2004, além do 2005, recém-chegado ao Brasil. Uma prova sensacional, capaz de ressaltar o estilo de uma casa e seu terroir, aliados à característica de cada safra - em que destacamos o potente 2003 e o elegante 2004.
Outro lusitano de destaque que esteve por aqui foi o empresário, e hoje viticultor, Paulo Cunha. Ele tem alma brasileira, pois viveu no Brasil por alguns anos, além de ser casado com uma carioca. Obstinado pela qualidade, está colocando a Quinta do Alqueve, do Ribatejo (hoje Tejo), de propriedade de sua família, entre as melhores produtoras de vinhos de Portugal. A região foi precursora da casta Syrah lá, que nessa Quinta produz verdadeiras maravilhas. Cunha esteve por aqui para lançar seus vinhos de safras novas e os destaques foram para o Quinta do Alqueve Syrah/Touriga Nacional e o Quinta do Alqueve Touriga Nacional - esse último um belo e típico varietal dessa casta que é a maior sensação dos vinhos de mesa de Portugal.
O destaque da Bairrada é a ultrasimpática Filipa Pato, que nos visitou e mostrou que podemos revolucionar mesmo o que é tradicional. Entre seus vinhos modernos e cheios de vida, destacamos o Ensaios Arinto Bical 2008, que tem um preço excelente.
Argentina, a cada dia melhores vinhos
Do país vizinho, sempre nos prestigia o homem que colocou o vinho argentino como uma das maiores promessas do Novo Mundo. Seu nome? Nicolas Catena Zapata. Um homem simples, de fala mansa, mas de uma cadência e ritmo de dar inveja a qualquer um. Ele vem todo ano ao Brasil, às vezes mais de uma vez. Tem estima e carinho pelo nosso mercado e, claro, deve ficar muito satisfeito de ver o que a marca Catena alcançou no País, tanto com o consumidor final quanto nos restaurantes.
Neste ano, sua visita foi ainda mais especial, pois ele veio após receber o importantíssimo título de "Men of the Year" pela revista Decanter. Entre vários vinhos, os destaques foram o excepcional Catena Alta Chardonnay 2006 e o já consagrado Nicolas Catena 2004. O primeiro é um branco de raça que mostra o potencial da Chardonnay também em Mendoza. Já o tinto que leva seu nome é candidato ao melhor vinho já produzido na Argentina, tremenda sua potência, força e presença. Um dos mais colecionáveis vinhos de nosso continente que tem muitos anos de guarda.
Nomes fortes do vinho da Argentina e do Chile fizeram questão de marcar presença visitando o Brasil diversas vezes e apresentando seus principais rótulos ao mercado
Concorrendo com o Nicolas Catena 2004 como o melhor vinho elaborado em nosso vizinho, temos o Noemia 2006, de vinhas velhas de Malbec da Patagônia, produzido pela dama do vinho, a condessa Noemi Marone Cinzano. A condessa, que também vem ao Brasil com boa frequência, esteve por aqui no primeiro semestre e, mais uma vez, deu um show com um Malbec intenso, profundo e repleto de alegria, seu J. Alberto 2006.
Ainda de Mendoza, tivemos mais duas visitas interessantes e significativas, visto que, como Noemi, os dois próximos astros ascendentes em nosso continente são respectivamente o espanhol José Manoel Ortega Fournier e o norte-americano Paul Hobbs. Fournier é, sem dúvida, uma das mais recentes personalidades do mundo do vinho. Ex-executivo do setor financeiro, escolheu a Argentina, mais especificamente o Vale do Uco na grande Mendoza, para implantar seu projeto "O. Fournier". Não se contentou com isso e investiu no Chile - Maule e San Antonio -, e em sua terra natal, a Espanha, na Ribera del Duero.
Seus vinhos são todos exuberantes e ricos. Do Chile, seu Centauri Sauvignon Blanc 2008 estreou em grande estilo e seu recém-lançado Alpha Crux Malbec 2006 é um dos mais potentes tintos dessa casta em toda a América do Sul.
Já Paul Hobbs não precisava mais se preocupar com sua carreira de sucesso como enólogo. Seus vinhos da Califórnia, onde vive, já conquistaram o mundo e as mais altas avaliações de renomados críticos, mas ele não se deu por satisfeito e investiu em alguns projetos em nosso vizinho. Como flying winemaker, assumiu o comando dos produtos da casa Pascual Toso e veio ao Brasil mostrar seus novos vinhos. Impressionantes em todas as faixas de preço, com grande destaque para seu Magdalena Toso 40 Barrels 2005 - superdenso, robusto e encorpado (90% Malbec com 10% Cabernet Sauvignon), que está delicioso hoje e deverá continuar evoluindo por mais 15 anos.
Chile, muitas novidades
Do Chile, tivemos muitas visitas ilustres, sendo que algumas vieram mais de uma vez neste ano. Também houve grandes novidades, seja de gente nova despontando, seja de habitués de nossas publicações, e que têm levado os vinhos chilenos a posições de destaque pelo mundo. Sendo assim, destacamos três enólogos.
O primeiro é o australiano John Duval, antigo enólogo-chefe do conglomerado Penfolds e responsável por um dos maiores ícones do mundo, o tinto Grange - seguramente o mais prestigiado e disputado Shiraz australiano. O simpático Duval se aposentou e decidiu seguir carreira solo na terra dos cangurus, mas não deixou de aceitar o desafio do grupo Ventisqueiro e produzir um grande Syrah no Chile.
São muitos os produtores de renome que estiveram no Brasil em 2009 e, se a tendência continuar, cada vez mais os enófilos brasileiros terão a chance de provar o que de melhor há no mundo
Duval veio lançar a espetacular safra 2005 do Pangea. Esse vinho está quase no mesmo nível do Pangea 2004, com um pouco mais de força e potência, enquanto o 2004 é mais elegante e profundo. Ele quer produzir o melhor Syrah do Chile ano após ano. Seu começo nos motiva a acreditar que cumprirá a promessa.
O segundo destaque é o simpático "enólogo investigador" Marcelo Retamal, que comanda a casa De Martino já há alguns anos. Retamal veio ao Brasil duas vezes em 2009. Na primeira visita coordenou uma vertical do vinho top da casa, o antigo Gran Familia, hoje denominado somente Familia. As safras desse vinho apresentadas para a celebração dos 75 anos da Viña De Martino foram 1995, 1997, 1999, 2001, 2002 e o 2005 - o último já com o novo nome. Foi uma experiência única rever os míticos Gran Familia 1999, 2001 e 2002, mas o gran finale da experiência foi o lançamento do irmão mais novo, o Familia 2005. Um predominante Cabernet Sauvignon chileno cheio de raça, que prima pelo equilíbrio entre força e potência, com finesse e elegância.
A maior novidade do Chile veio pelas mãos do enólogo Sergio Cuadra, que comanda a Viña Caliterra, de propriedade do megaempresário local Eduardo Chadwick, também um fanático pelo nosso País. O simpático e descomplicado Cuadra mostrou muita competência apresentando a novidade chamada Cenit, o novo vinho premium da casa Caliterra. O Cenit 2006, um blend de Cabernet Sauvigon (60%), Malbec (30%) e Petit Verdot (10%), estava delicioso e mostrava a qualidade de fruta madura do Vale de Colchagua da excelente safra 2006. Um vinho de alto nível, mostrando que a Viña Caliterra virá forte e com vinhos de excelente padrão.
Ainda do Chile tivemos a presença do gentilíssimo José Miguel Viu, proprietário da vinícola Viu Manent. José Miguel, que tem uma das mais lindas propriedades em Colchagua, produz nessa região - com vocação para grandes vinhos à base de Carménère - os melhores Malbecs do Chile. Seu top de linha, o Viu 1, já tem uma sombra, o Malbec Single Vineyard San Carlos State. Esse vinho da safra 2005 se aproximou muito de seu irmão mais famoso, apresentando uma qualidade incomum para um Malbec chileno.
Em novembro, tivemos por aqui a presença ilustre de Don Alfonso Larraín, sócio e presidente da Concha y Toro, uma das maiores e mais imponentes vinícolas do mundo. Acompanhado da enóloga Paula Gajardo, a missão de Don Alfonso foi lançar em solo brasileiro o Marques de Casa Concha Carménère 2007. Esse Carménère foi o primeiro da consagrada "família" Marques de Casa Concha - que já brilha no mundo com o Cabernet Sauvignon, Merlot e Chardonnay - e é excelente e expressa com perfeição a cepa. O enólogo da linha Marques, Marcelo Papa, decidiu colocar 10% de Cabernet Sauvignon no blend final para dar mais presença no vinho.
Estados Unidos, Zinfandel e Pinot Noir, experiências deliciosas
Durante muitos anos, os norte-americanos focaram somente no mercado interno que, com sua alta demanda, fazia com que a preocupação com a exportação praticamente inexistisse. Mas, neste ano, foram diversas visitas, com destaque para as femininas.
Camille Seghesio, descendente de piemonteses, é quem comanda - com a família - a casa que produz um dos mais descomplicados e deliciosos Zinfandels da América. A vinícola produz vinhos à base dessa casta em diferentes terroirs em Sonoma e Russian River, Califórnia. Todos muito potentes e alcoólicos, mas impressionantemente gastronômicos no acompanhamento de pratos robustos e também encorpados.
Degustamos quatro vinhos à base dessa cepa que fez história na Califórnia. Todos excelentes, começando pelo magnífico Sonoma County 2007, passando pelos deliciosos Old Vine 2005 e Alexander Valley Home Ranch 2006, e finalizando com o Cortina, também da safra 2006. Talvez essa tenha sido a degustação mais difícil do ano para destacar um dos vinhos já que todos estavam exuberantes. Um empate técnico com uma pequena vantagem (depois de duas horas de degustação) para o Home Ranch 2006.
A outra visita ilustre representando a Califórnia foi de uma catalã de Barcelona chamada Marimar Torres. Ela é irmã de Miguel Torres, um dos mais importantes homens da história do vinho na Espanha, que inclusive já foi laureado com o título de "Men of the Year" pela Decanter. Marimar, de personalidade firme, casou-se com um note-americano e, mesmo depois de sua separação, convenceu seu pai que podia elaborar grandes vinhos na Califórnia. Com muita perseverança, conseguiu atingir níveis espetaculares com seus Pinot Noirs e Chardonnays.
Marimar é fã confessa dessas castas e consequentemente de vinhos da Borgonha. A gentileza dessa espanhola radicada nos Estados Unidos cativou a todos em uma prova que realizou em São Paulo. Foram dois Chardonnays e três Pinot Noirs degustados, sendo um deles um vinho reluzente, imponente e cheio de personalidade, o Marimar State Pinot Noir Cristina Russian River Valley 2005 - Viñedo Don Miguel (vinhedos orgânicos) - que foi o melhor Pinot Noir não francês degustado em 2009. O nome Cristina é uma homenagem à filha, que a acompanhou nessa viagem ao Brasil, e Don Miguel, uma homenagem a seu pai e patriarca que iniciou o império da família Torres, que, além de Espanha e Estados Unidos, tem importantes negócios no Chile e China.
E o ano não acabou...
Enquanto publicamos essa matéria na última edição de ADEGA em 2009, temos outros encontros agendados com vários produtores que desembarcam no Brasil em novembro e dezembro. Entre eles, José Maria Soares Franco, de Portugal, que vem apresentar seu projeto Dourum, em parceria com o arrojado enólogo João Portugal Ramos; o genial Primo Franco, o homem que colocou seus Prosecco's como espumantes de classe em todo o mundo; Felipe Ramírez, enólogo-chefe da vinícola Nativa Viñedos Orgânicos, etc...
* Para verificar a avaliação dos vinhos dos produtores citados, você pode acessar o site: OMelhorVinho.com.br.