Para ele, fazer vinhos é tocar uma música composta pela natureza
Redação Publicado em 23/07/2008, às 10h38 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h45
Muito tem se falado ultimamente sobre vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais. Alguns são devotos do assunto e dos vinhos, outros pensam em marketing, e uma grande maioria desconhece o que embasa e norteia estes conceitos.
Este ano, o Brasil foi visitado por Phlippe Pacalet, uma das maiores autoridades sobre o assunto no mundo e produtor de ótimos exemplares, que já tivemos a oportunidade de avaliar em nossas páginas e integraram a seleção de inesquecível enogourmet.
Este afável francês, com jeito hippie, 44 anos, casado e pai de quatro filhos, é o arquétipo do que se espera de um produtor de vinhos biodinâmicos na Borgonha.
Como você fundou sua vinícola?
O mais importante foi selecionar uma boa propriedade, com vinhedos antigos e boas plantas.
Esta seleção foi feita como?
Andei por muitos lugares, falei com as pessoas, experimentei os vinhos e as uvas. Foi uma busca de dez anos. Nada da maneira como as coisas são feitas nos negócios hoje, tudo muito rápido e apressado. Atualmente trabalho o vinhedo como as pessoas o faziam na Idade Média. Utilizo o estilo clássico de trabalho com coisas modernas. Assim, o terroir é essencial.
Sua formação inclui microbiologia e enologia. Como você concilia estas ciências modernas com a prática de técnicas ancestrais?
Isto me ajudou a entender o que faço. E quanto mais você entende algo, mais você pode avançar e com mais profundidade. Eu uso o conhecimento para produzir vinhos sem SO2.
E quando você começou a produzir vinhos naturais?
Em 1990, aos 26 anos.
Você viveu sua infância na Borgonha, presenciando vinhos produzidos com técnicas ancestrais e depois foi para a faculdade onde seus professores lhe diziam para produzir vinhos de outra maneira. Você tinha um ponto de vista crítico sobre o que lhe era dito?
Não. Era muito cedo. Eu apenas tentava associar minha prática ao conhecimento. Mas eu sempre fui muito orgânico por causa de meu tio.
Durante a degustação você disse: "no vinho não há nada a produzir, apenas a expressar"...
Eu realmente acredito nisto. Assim como o músico toca a composição de outro, eu faço o vinho com o que a natureza proporciona.
E isto carrega muitos riscos. Não?
Há muitos riscos, sobretudo no que diz respeito ao tempo, ao clima. São muitas decisões a tomar sobre o quê e quando fazer. E você só saberá depois se fez o certo ou não.
Muitas pessoas dizem que vinhos naturais não envelhecem bem. Isto é verdade?
Algumas vezes, é. Mas tenha em mente que muitas vinícolas fazem vinhos não para serem bebidos, mas apenas para serem comprados e guardados para sempre. Meus vinhos envelhecem sem problemas.
#Q#
Por quanto tempo?
Este ano degustei um vinho que fiz em 1992 e estava okay.
Como você consegue isto?
De maneira muito sutil. Meu trabalho para o envelhecimento é estabilizar o vinho. E isto é muito importante na Borgonha, pois não trabalhamos com os taninos. É a acidez que mantém nossos vinhos.
Há muita confusão nos conceitos orgânico, biodinâmico e natural. É possível sumarizar e distinguir estes conceitos?
Parece muito complicado, mas de fato é bastante simples. Eu estou interessado em vinhos naturais, então eu parto de cultivos orgânicos ou biodinâmicos. Mas quero fazer vinhos. Você pode ser muito bom no cultivo, mas fazer vinhos é diferente. Para produzir, eu cultivo as uvas com métodos orgânicos ou biodinâmicos e depois faço uma vinificação natural. Para fazer bom vinho eu preciso destes tipos de cultivo. Mas você deve ter cuidado com o marketing em volta disto.
"Você bebe vinho porque se sente bem, sociável e vive emoções" Philippe Pacalet |
Você fala muito em emoções durante a degustação...
Sim, acho que o vinho tem a ver com isto: emoções. Este é o ponto. Você bebe vinho porque você se sente bem, sociável e vive emoções. Vinho é como música.
Como você vê o mercado brasileiro?
Brasil é meu quinto maior mercado agora. Meus principais mercados estão na Ásia e em países latinos. Não consigo precisar o porquê. Acredito que por sermos países latinos. Já o mercado italiano, por exemplo, é muito forte.
Como se sente com isto?
É muito bom, pois é um país produtor de vinhos. Acho que a Borgonha é um local único, mas de alguma forma similar ao Piemonte, pois são muito próximos. Considero que a Borgonha tem mais a ver com o Piemonte do que com Bourdeaux.
Qual sua produção atual?
Cerca de 50 mil garrafas. Somos muito pequenos. Mas, como dizem, "small is beautifull".