Com ares de artista, Ernesto Catena mostra que a enologia é uma arte e a Bonarda é a "uva da vez" na Argentina
Fábio Farah Publicado em 23/07/2007, às 13h12 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h44
Na infância você já pensava em trabalhar com vinhos?
Queria trabalhar com tecnologia, computação. Quando estava na Universidade, nos Estados Unidos, recordei das minhas raízes, da bodega da minha família, em Mendoza, que começou com meus avós. Essas memórias me emocionaram e me inspiraram. Hoje me dedico ao vinho mais como um compromisso poético do que outra coisa. Meu trabalho é criar. Sou um poeta dos vinhos.
Esse é seu estilo de fazer vinho?
Um artista tem que criar constantemente. Tento fazer em cada vinho algo diferente, descobrir um sabor novo. Muitos brasileiros dizem que nossos vinhos são únicos, diferentes de outros que costumam degustar. Isso é muito gratificante, pois é justamente o que busco fazer em Mendoza. Busco cortes que me surpreendam. Aí vem a semelhança com os artistas. Cada vez que apresentam suas obras, eles devem se surpreender antes do público.
Qual é o maior diferencial da Tikal?
Levamos o sommelier para dentro da bodega. Ele não prova o vinho depois de pronto, mas ajuda em sua elaboração. Nosso diferencial não está na tecnologia, mas no processo. Enquanto os enólogos fazem os blends, servimos o vinho para várias pessoas. Vemos a resposta imediata, em suas expressões. O consumidor torna-se parte importante na elaboração e nossos vinhos. Além disso, acompanho tudo, desde a criação do vinho até o desenho dos rótulos e sua comercialização.
O que os consumidores têm buscado nos vinhos?
Faço um vinho que eu gosto. Assim, o público que busco é parecido comigo. Um público de mente jovem, que aprecia coisas de qualidade. Não apenas nos vinhos, mas nos lugares.
Estamos em belos restaurantes. As pessoas estão cansadas dos mesmos vinhos. Meus consumidores buscam coisas novas, não têm a mente fechada para os vinhos, como os europeus, que possuem gostos estabelecidos.
Quero que bebam meus vinhos quem não carrega o peso da história e esteja disposto a escrever a própria história.
O que aprendeu com seu pai?
Sua obsessão pelos detalhes. Ele procura sempre o máximo. Não é fácil fazer um grande vinho sem isso. Penso no meu pai para fazer grandes vinhos e fico atento a todo o processo. E esse processo não termina nunca. O cuidado é com todos os detalhes todos os dias. O enólogo é como um poeta, mas em vez de montar versos com palavras, utiliza uvas. Tento aplicar a experiência de meu pai.
Seu pai gosta de seus vinhos?
Ele gosta muito. Embora faça vinhos com sabores mais clássicos, para pessoas mais conservadoras. Faço vinhos mais modernos. Por esse motivo, a Tikal utiliza blends e não possui uma linha monovarietal.
A Argentina é conhecida internacionalmente pelo Malbec. Isso inibe a criatividade dos produtores?
Estamos conseguindo ótimos resultados com a Syrah. Ela vai muito bem nas zonas mais áridas de Mendoza. Nesse momento, também estamos tendo sucesso com a Bonarda. O nosso vinho Patriota utiliza um blend com Bonarda. O futuro da Argentina está nessa varietal. O Bonarda argentino é muito elegante, com aromas de flores. O italiano não tem isso.
Temos vinhos Bonarda bem posicionados em restaurantes chiques de Nova York e Miami. Com isso, mostramos ao mundo que não temos apenas o Malbec.
Segundo Catena, o enólogo faz poesia com os vinhos |
Qual é a sua próxima novidade?
Acabamos de elaborar um vinho de alta gama que representará uma síntese de tudo o que fizemos até agora.
E com um sabor que nos distingue do resto do mundo. Mas ainda não temos nome. Serão apenas 1500 garrafas magnum de um blend de Cabernet Sauvignon e Malbec. Ele está pronto, evoluindo na garrafa, e deve chegar ao mercado em dois anos.