A Serra Gaúcha já possui uma considerável infra-estrutura para receber os turistas interessados em vinhos. E a nossa paisagem ajuda
Sílvia Mascella Rosa Publicado em 03/07/2008, às 08h38 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h45
Há pouco tempo, um site especializado em negócios relacionados ao vinho na Argentina fazia menção a bem-sucedida rede de hotéis e vinícolas que formam a base do enoturismo brasileiro. Eles comentavam que os argentinos ainda não conseguiram se organizar da mesma forma que o fez a Serra Gaúcha, coração desse movimento. Parece um pouco de exagero, mas o fato é que o Brasil tem tido grandes vitórias no enoturismo.
Para quem viajou até a metade da década de 1990 para o sul do Brasil, os vinhos já eram uma realidade turística, mas a organização ainda deixava a desejar, assim como as opções disponíveis. É bem verdade que a precariedade da estrutura permitia alguns passeios hoje impossíveis, favorecidos pela boa vontade dos proprietários das vinícolas. Em 1994, tive o privilégio de conhecer as caves subterrâneas e a sala de degustação (saída de um filme dos anos 50) da Peterlongo, empresa que ajudou a mudar para sempre a história do espumante brasileiro. Tudo era improvisado, mas a recepção era calorosa e os produtos premium muito especiais, embora ainda não tivessem volume para chegar ao mercado paulista. Nessa época, entre as poucas vinícolas com tour já organizado pela cantina e degustação ao final estavam a Vinícola Aurora e a antiga Forestier. Durante a mesma viagem, estive no canteiro de obras do que hoje é a sede da Miolo Wine Group, com sua cantina semipronta e os espaços ainda sendo dimensionados.
Passados 13 anos dessa viagem, a Miolo realizou um sonho antigo e ambicioso, seu luxuoso hotel, concretizado por meio de parcerias importantes com empresas da região e do exterior. Uma mostra clara da força consumidora do mercado de vinhos e de que o investimento na região é válido e necessário. Em números atuais, as mais de 30 vinícolas abertas para visitação e degustação do Vale recebem ao menos 120 mil visitantes por ano em suas instalações. Só no começo de 2008 (de janeiro a março), o fluxo de turistas foi 80% maior do que o registrado no mesmo período de 2007. Segundo a Secretaria de Turismo da cidade de Bento Gonçalves, muito desse desenvolvimento é devido às associações que se formaram na região e que trabalham para a melhoria da qualidade de seus produtos e o avanço do enoturismo. Os gaúchos estão levando esse assunto tão a sério que já existe um curso tecnológico de gestão em turismo, com ênfase somente em enoturismo, na cidade de Garibaldi. O objetivo é deixar melhor preparadas todas as pessoas que trabalham na cadeia produtiva do turismo da região, desde taxistas até garçons.
Hoje, conhecer o Vale dos Vinhedos é passeio obrigatório para viajantes brasileiros e estrangeiros. O frio da serra, a beleza dos vales, a preservação histórica e a estrutura que se formou - boa parte dela iniciada com o roteiro Caminhos de Pedra, que une gastronomia, vinhos de mesa, artesanato e história da colonização - está apta a atender visitantes de variadas faixas etárias, classes sociais e conhecimentos de vinhos. Um pouco para frente do Vale dos Vinhedos também é possível conhecer a Rota dos Espumantes, com visitas a vinícolas como a Chandon, na cidade de Garibaldi. Uma coisa está certa, é difícil ficar indiferente aos vinhos depois de um passeio entre os parreirais, após uma visita às frescas caves e uma degustação junto dos produtores. É uma mudança de cenário muito bem-vinda para turismo brasileiro.
Sonho antigo da Miolo, o hotel no Vale dos Vinhedos | Hotel Villa Europa, detalhes surpreendentes |
Em uma grande empresa (Miolo ou Valduga) ou em um médio produtor (Marco Luigi, Pizzato, Dal Pizzol, Vallontano), a diversão é a mesma, embora a estrutura de atendimento possa variar. Por exemplo, a Miolo e a Casa Valduga já têm seus próprios hotéis, assim como a Don Giovanni, com sua pousada singela acomodada em uma paisagem idílica. Mas não é necessário hospedar-se na vinícola para fazer um belo passeio, embora essa imersão em vinho seja tremedamente recompensadora. Quase todas as vinícolas brasileiras de algum porte oferecem um tour por suas instalações, que pode incluir um almoço entre os parreirais ou um jantar na cave.
É importante informar-se pelos sites sobre horários e tipos de passeio (em grupo ou individuais). As lojas dentro das vinícolas sempre têm preços atraentes e embalagens para viajantes.
Aqui cabe uma informação: como o leitor de ADEGA já conhece mais de vinhos do que o viajante tradicional, peça para provar os outros vinhos das vinícolas - além daqueles que são servidos aos grupos. Normalmente, a maioria dos viajantes degustam os vinhos mais fáceis e baratos das empresas. Isso é mais estratégia de marketing do que economia de vinhos. Como a maior parte do público ainda busca os vinhos mais suaves e leves, as empresas começam por oferecer esse tipo de bebida, mas assim que sabem que o visitante conhece um pouco mais, terão prazer em servir seus produtos especiais. As pessoas que trabalham nessas lojas, muitos deles estudantes de turismo ou de enologia, têm sido treinadas para entender que os turistas de vinho são consumidores potenciais. Assim, aproveite para conhecer as novidades que demoram a chegar ao mercado do sudeste e do nordeste e saiba que, na maioria das vezes, a taxa cobrada para entrar e degustar pode ser descontada das compras finais. Essa prática é internacionalmente adotada e contém o desperdício.
Para aqueles que podem viajar sem o compromisso de um grupo, algumas dicas são importantes para se hospedar nos hotéis ou pousadas no Vale dos Vinhedos: na Don Giovanni, não deixe de provar o Espumante Brut Ouro e o brandy da casa. A família é a antiga dona dos conhaques Dreher e hoje, sob outra marca, produzem um brandy muito especial. A localização da pousada remete à Toscana e, embora as instalações estejam merecendo uma renovação, o aconchego e a simpatia das pessoas são muito agradáveis.
Na Casa Valduga, o profissionalismo impera e você terá todos os confortos de uma pousada bem montada, além de vários restaurantes e do parreiral à vista das janelas dos quartos. No restaurante, peça o lançamento do ano da empresa, o tinto Storia, e não deixe de provar ao menos um dos espumantes. O top de linha entre os hotéis é o novo empreendimento da Miolo. No Villa Europa, localizado dentro do Vale dos Vinhedos bem em frente à sede da vinícola, os preços são mais elevados que os vizinhos, mas quem paga não se decepciona. Além da maravilhosa adega climatizada, entre tantos outros detalhes surpreendentes, você poderá desfrutar do Spa Caudalie Vinotherapie, única franquia da rede de Bordeaux abaixo do equador. Depois de uma massagem com sementes de uvas e de jantar à luz de velas com vista para o vale, além de algumas taças do exclusivo Merlot VE, dá para entender porque dos argentinos acreditarem que o Brasil sabe o que está fazendo.
Spa Caudalie Vinotherapie, franquia da rede de Bordeaux no Brasil |
Serviço
Vôos: o aeroporto mais perto do Vale dos Vinhedos fica em Caxias do Sul (a 42 km), mas durante o outono e o inverno é bastante sujeito a nevoeiros, que obrigam os vôos a desviarem para o aeroporto internacional de Porto Alegre (a 130 km).
Aluguel de carros: ambos os aeroportos têm empresas que oferecem aluguel de carros. É importante utilizar os mapas oficiais da região.
Estradas: a condição das estradas é, em geral, muito boa. Os perigos mais comuns são o excesso de caminhões, as pistas únicas nos trechos de serra e o nevoeiro. Todas as estradas têm radares para controle de velocidade. Eles também estão na entrada da maioria das cidades.
Hotéis: a maior rede hoteleira está em Caxias, cidade mais importante da região, mas é mais conveniente ficar em Bento Gonçalves, cuja hotelaria é dominada pelo grupo Dall'Onder, com três hotéis de diferentes preços e estilos (www.dallonder.com.br). Dentro do Vale dos Vinhedos é possível se hospedar na Casa Valduga (www.casavalduga. com.br), no hotel Villa Michelon (www. villamichelon.com.br) e no Villa Europa (www.villaeuropa.com.br). A Pousada Don Giovanni fica no município vizinho de Pinto Bandeira, acessível por dentro do Vale (www.dongiovanni.com. br) e na mesma região está a Pousada Fornasier (www.vinhosfornasier.com.br). Em Garibaldi a melhor opção é o antigo e simpático Casacurta (www.hotelcasacurta. com.br) que tem boa estrutura e um ótimo restaurante.
Restaurantes: a Cantina Giuseppe (na estrada entre Garibaldi e Bento Gonçalves) é um exemplo do capricho na culinária local tradicional, isso sem falar no bom serviço e na impressionante carta de vinhos nacionais. No mesmo prédio de pedra está um dos poucos locais da região para comer uma refeição leve fora do horário do almoço (gaúchos almoçam pontualmente ao meio-dia e muitas portas estarão fechadas já às 14h), o VinCaffé tem tratamento caprichado e horários mais flexíveis. Ainda na estrada, ao lado da entrada da cidade de Bento Gonçalves, fica o Canta Maria, instituição da região, frequentado por turistas e residentes. Na cidade existem algumas opções mais populares, pizzarias e um self-service caprichado, chamado Manjericão, perto do pequeno Shopping Center. Dentro do Vale é possível comer muito bem em algumas vinícolas - embora a maioria sirva refeições típicas com sopa de capeletti, risotto e carnes. Uma das exceções é a Cordelier, com seu restaurante Don Ziero. Outra opção é o novíssimo Café Vallontano, que investe na variedade de alimentos e bebidas. Uma sugestão muito popular, fora das vinícolas, é o Sbormea's, com culinária típica e bem-servida. No vizinho distrito de Faria Lemos está a Dal Pizzol (que também tem um parque temático) com um restaurante que atende grupos pré-agendados. Além disso, o acesso aos restaurantes dos hotéis é livre para os não hóspedes, mas para o jantar, muitas vezes é necessário reservar. No distrito de Tuiuty, está o Pignattela, com seu cardápio tirolês, uma opção bem diferente.
O profissionalismo impera na Pousada Valduga | Restaurante Sbornea's, no Vale dos Vinhedos | Na Don Giovanni, Brut Ouro e brandy da casa |