Um protetor natural dos vinhos

A goma arábica auxilia na estabilização dos aromas do vinho. Nos espumantes também melhora a persistência do perlage

João Carlos Cainelli Publicado em 16/05/2007, às 07h20 - Atualizado em 27/07/2013, às 13h44

A goma arábica melhora a consistência da "efervescência" dos espumantes

O vinho tem, inegavelmente, uma imagem de produto natural e saudável. Jean Ribéreau-Gayon resumiu perfeitamente este conceito: "O vinho é um produto natural e deve permanecer natural; mas, se o produto se alterar, ele deve submeter- se a ações e tratamentos necessários para lhe permitir subsistir".

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A goma arábica, produto muito conhecido em enologia, tem a maior parte de sua produção proveniente do continente africano. Atualmente, o Sudão é responsável por 85% da produção, que corresponde a 30 mil toneladas por ano. Neste país, na província de Kordofan, foram feitas as primeiras plantações da goma arábica. A região também é responsável pela goma Verek, a de melhor reputação no mercado.

A goma arábica natural é um composto neutro ligeiramente ácido que contém entre 10 e 15% de água e taninos. Ela é utilizada em enologia por seu excelente poder estabilizante. A goma arábica é caracterizada pelo gosto agradável, que melhora consideravelmente os vinhos, em particular aqueles que apresentam notas ácidas ou tânicas acentuadas. A estrutura molecular complexa da goma lhe permite atuar sobre os receptores das papilas gustativas retardando ou diminuindo as percepções adstringentes e amargas. Igualmente, participa das sensações tácteis do gosto (arredondamento).

A adição de goma arábica no vinho tem como objetivo a estabilização dos aromas. Por serem perceptíveis, as substâncias constituintes do buquê do vinho devem estar presentes sob forma volátil. Estas substâncias têm tendência a se liberar, da solução, de forma espontânea. Os polissacarídeos aumentam a estabilidade dos aromas do vinho, porém estão em quantidades muito pequenas para exercerem uma ação perceptível. A adição de colóides glucídicos exógenos é um meio eficaz para melhor evidenciar a personalidade e as características olfativas do vinho.

O vinho é uma suspensão coloidal. Os colóides micelares (matéria corante, tartarato, fosfato férrico etc.) são mantidos em dispersão pela ação das cargas elétricas que garantem uma repulsão das partículas. Os colóides macromoleculares (proteínas, polissacarídeos) são estabilizados pelo duplo fenômeno da hidratação e de cargas elétricas. O vinho contém uma grande variedade de macromoléculas, que podem se aglomerar em partículas finas. Elas ficam em suspensão, deixando-o turvo, ou acabam floculando e formando depósitos. Estes problemas podem ser resolvidos por duas intervenções enológicas. A primeira consiste em eliminar as moléculas potencialmente instáveis por clarificação/filtração muito fina. Esta técnica conduz geralmente a um empobrecimento organoléptico do vinho. A segunda estratégia consiste em associar as macromoléculas instáveis a outras mais estáveis também conhecidas como "colóides protetores".

Estas operações clarificantes suprimem a matéria coloidal em suspensão, mas não previnem a formação posterior de novos colóides instáveis. Este é o caso, por exemplo, da matéria colorante coloidal que continua a se formar mesmo após o engarrafamento, e que pode precipitar se as condições forem favoráveis (frio).

A goma arábica é empregada em enologia para estabilizar a matéria corante coloidal nos vinhos tintos e para proteger contra os riscos de quebras metálicas superficiais. Na prática, a goma arábica é utilizada para a estabilização tartárica e para a estabilização protéica dos vinhos brancos.

O vinho é uma suspensão coloidal

Preservar a cor dos vinhos tintos é uma necessidade importante principalmente durante as estações frias. Nos vinhos jovens, a fração de substâncias corantes no estado coloidal pode ser eliminada pela clarificação. Desta forma, observase uma absorção das antocianinas e uma perda de intensidade corante. A solução ideal do ponto de vista técnico e econômico é a estabilização da substância corante natural dos vinhos tintos jovens pela goma arábica que abranda os fenômenos da polimerização e a precipitação da matéria corante na garrafa.

Os colóides hidrófobos são provenientes de uma primeira transformação físico-química que provoca a passagem de moléculas em solução a micelas coloidais dispersas. Ainda que os fenômenos ligados a sua formação sejam pouco conhecidos, é certo que alguns compostos podem impedir a floculação destas micelas e a turvação conseqüente do vinho. Uma das substâncias mais ativas no que diz respeito ao colóide protetor é a goma arábica que se opõe com eficácia às turvações e aos depósitos de natureza coloidal de todos os tipos (casse protéica, cúprica, férrica, insolubilização da matéria corante etc.). A goma, adicionada ao vinho, combinada com o ácido metatartárico, reforça a eficácia antitartárica porque impede o desenvolvimento dos cristais de tártaro, através do envolvimento de suas superfícies.

Graças à ação coloidal, a goma arábica é preconizada por melhorar a fineza e a persistência do "perlage" dos vinhos espumantes, abrandando a dispersão das pequenas borbulhas de anidrido carbônico e melhorando a consistência da "efervescência" na taça.

A adição de goma arábica ao vinho torna sua filtração mais difícil, aumentando seu índice de colmatagem devido a suas propriedades, descritas acima. Ela pode ser utilizada de duas maneiras: a primeira, por dispersão direta no vinho, de preferência em um tanque com agitação ou seguida de uma recirculação para conseguir uma boa homogeneização; a segunda, por injeção de uma solução concentrada de goma no vinho durante o engarrafamento com ajuda de uma bomba dosadora. A dose a ser usada não deverá ultrapassar 30 g/hL, mas não existe nenhum limite de emprego regulamentar.