Vantagens e desvantagens de guardar um vinho por mais de 10 anos

Confira cinco bons motivos para guardar um vinho e cinco motivos para se preocupar

Arnaldo Grizzo Publicado em 17/08/2018, às 12h00

É sempre bom lembrar que a maioria dos vinhos não foi pensada para ser envelhecida. Um equívoco comum de quem não está acostumado a beber e tampouco tem muita familiaridade com a cultura do vinho é pegar uma garrafa que ganhou de presente, colocar no fundo de um armário e deixá-la lá anos a fio (guardada ou esquecida). E, em um determinado momento, decidir abri-la ou então vendê-la, imaginando que possui um tesouro guardado quando, na verdade, tem um “vinagre”.

No entanto, não há enófilo que não tenha uma relíquia aguardando o momento oportuno para ser degustada. Quando você começa a se interessar por vinho e entender esse universo, uma das primeiras providências é comprar algumas garrafas especiais que pretende envelhecer. Pode ser um vinho da safra do nascimento do seu filho, pode ser um do ano da abertura da sua empresa, pode ser um do ano do seu casamento, enfim, não importa o motivo, seja ele qual for, sempre haverá uma garrafa que merece ser guardada para ser aberta anos mais tarde em um momento especial.

Então, quando adquirimos rótulos especiais, logo pensamos em quanto tempo eles podem envelhecer e como estarão quando finalmente decidirmos abri-los. Quem pensa “a longo prazo”, tende a selecionar vinhos já consagrados, que comprovaram sua capacidade de guarda durante muitos e muitos anos. Falamos aqui dos grandes châteaux de Bordeaux, de Vinho do Porto, de Brunello di Montalcino, de Barolo, de grandes vinhos de Ribera del Duero, de vinhos doces consagrados como Sauternes, Tokaji, entre outros comprovadamente “duráveis”. Mais que isso, muitos não somente mostram-se capazes de suportar a guarda, como também de evoluir e tornar a degustação mais prazerosa do que quando jovens.

É pensando em tudo isso que escolhemos as garrafas para guardar em nossa adega por cinco, 10, 15, 20 ou ainda mais tempo. Mas será que vamos mesmo ser recompensados pela espera? O tempo sempre será um aliado? Vale a pena conferir uma pequena lista de vantagens e desvantagens de guardar vinhos por 10 anos ou mais e ponderar. Vamos aqui nos ater, de certa forma, aos vinhos tintos tranquilos, cujos grandes exemplares podem ter uma guarda bastante longa, de cerca de 20 anos “sem perder vivacidade”, deixando de lado os “seculares”, como Vinho do Porto e outros que podem perdurar muitas décadas mais.

 

Certeza de algo único

Guardar um vinho para “a posteridade” é uma forma de garantir um momento singular no futuro. A partir do momento em que você separa uma garrafa e a deixa em sua adega por 10 anos ou mais, sabe que, não importa o momento em que ela for aberta, isso será algo especial. Muitos rótulos, mesmo os mais celebrados, costumam ser consumidos pouco após irem ao mercado. Cada vez mais, há uma ânsia dos enófilos em degustar os vinhos cada vez mais jovens. Então, guardar uma garrafa por tanto tempo é uma exceção capaz de proporcionar um momento único futuramente, quando poucos poderão dizer que provaram tal vinho de tal safra com tantos anos de idade.


Pós-ápice

Todos já ouviram falar que os vinhos costumam ter “curvas de degustação” e que você pode estar provando um rótulo em um momento de “dormência”, ou então em seu ápice, ou ainda já “decadente”. Ao guardar um vinho por um bom tempo, você corre esses riscos. Você tanto pode abrir no momento exato e ele parecer soberbo, quanto pode ter esperado demasiadamente e ver que ele já está se transformando em algo não tão bom. Acertar esse ponto pode não ser tarefa das mais simples. Talvez seja preciso acompanhar “reavaliações” de críticos para não perder a oportunidade de beber um vinho ainda em seu ponto alto.

 


Transformações e equilíbrio

Apesar de a vitivinicultura ter mudado muito nos últimos anos, fazendo com que cada vez mais os produtores se preocupassem em ter seus rótulos 100% prontos para beber quando saem no mercado, alguns vinhos, quando jovens, ainda são bastante “duros” e “fechados”. Mesmo já estando prazerosos, você nota que o tempo de guarda lhe faria muito bem. Sendo assim, o envelhecimento ajuda não somente a suavizar taninos, mas a fazer com que diversos elementos que, quando jovens ainda estão muito ressaltados, “assentem” e façam com que o vinho se torne mais equilibrado e elegante com a idade, deixando de lado a volúpia da juventude.


Evolução não tão agradável

Sim, a vitivinicultura e a enologia avançaram muito nos últimos anos, assim como o gosto do consumidor. Dessa forma, aqueles vinhos “duros” e “fechados” de antes foram se tornando cada vez mais “suaves” e “abertos”. Hoje, é quase impensável um rótulo sair ao mercado sem que ele seja capaz de dar prazer quando consumido jovem. E essa mudança de estilo muitas vezes faz com que esses vinhos sejam mais agradáveis quando jovens do que quando envelhecidos, pois, na juventude, a fruta ainda está exuberante. Ao amadurecer, “sem” essa fruta, você terá de se “contentar” com outros sabores.

 

 


Aromas e sabores totalmente diferentes

O grande encanto de um vinho que foi envelhecido é exatamente a evolução dos aromas e sabores. Aqui deixamos de lado os tons frutados exuberantes, a potência, a pungência, para falar de algo mais voltado às notas de frutos secos, à delicadeza, à sutileza. Um vinho envelhecido oferece uma experiência de degustação completamente diferente. É preciso saber reconhecer e admirar essas tonalidades dadas pela “experiência”, sentir o que é a evolução, de onde ele veio, até onde ele chegou e, quem sabe, para onde ele vai. A sabedoria de guardar um vinho dá a oportunidade de desfrutar de algo diferente.


Má conservação?

Diz-se que plantar uma árvore e guardar um vinho são sinais de sabedoria. No entanto, não é nada sábio pegar uma garrafa e simplesmente colocá-la no fundo de um armário da cozinha. A chance de esse vinho estar bom depois de 10 anos lá esquecido é extremamente remota. Sem um bom acondicionamento, ele fatalmente sofrerá as consequências e estragará. Então, para ter o mínimo de certeza de que, depois de um longo tempo, seu vinho ainda estará bebível, guarde-o em uma adega climatizada e garanta que ele esteja sempre bem acondicionado durante todo o tempo.

 


Comparações

Quando se tem o costume de guardar vinhos por longos períodos, cria-se uma paleta de safras, estilos, produtores etc. que dá ao enófilo uma vasta experiência e a possibilidade de comparações que poucos costumam fazer. Diante de rótulos que esperaram 10 ou mais anos para serem abertos, pode-se compreender as diferenças entre fases da vitivinicultura, estilos de vinificação, uso de determinadas tecnologias, e outras tantas coisas mais que deixam suas marcas nos vinhos e podem ser reconhecidas mesmo depois de tanto tempo. Abrir um vinho envelhecido é voltar no tempo.


Guardar mais que beber

Um enófilo de verdade não deve apenas “colecionar” rótulos em sua adega. Vinhos foram feitos para serem bebidos. Quando começamos a guardar garrafas por muito tempo, corre-se o risco de ficarmos viciados apenas em adquirir novos vinhos, sem apreciar os que já estão lá aguardando há um tempo para serem degustados. Às vezes, depois de tanto guardar, você vai se dar conta de que possui mais vinhos do que é capaz de consumir, ou ainda, que sua expectativa de vida talvez não seja suficiente para esperar alguns rótulos envelhecerem tanto quanto gostaria. Então, guarde, mas beba também.


Ativo que valoriza com o tempo

Uma pesquisa divulgada no final do ano passado mostra que o investimento em vinhos finos foi um dos que mais rendeu dividendos desde 1900. Os valores subiram 61% nos últimos cinco anos e 231% em uma década. Em 2017, os vinhos lideraram o “índice de investimento de luxo” com crescimento de 25%, superando carros, joias e arte. Ou seja, mesmo que você não pretenda “liquidar” seu patrimônio depois de um tempo, ele pode ter rendido o suficiente para que você considere vender a garrafa.


Expectativa frustrada

Você comprou um vinho há 10 anos. Na época, provou-o na casa de um amigo e resolveu comprar outra garrafa para guardar e tomar futuramente. Agora, ao abrir, depara-se com um vinho que não tem nada a ver com o que você imaginava, que não evoluiu como você pensava, que não está lhe dando o prazer que esperava. Sim, pode acontecer. E pode ser ainda pior, você pode ter guardado um vinho contaminado por TCA e, ao abrir depois de tanto tempo, ver que ele está bouchonné, intragável. Sim, você pode se frustrar, e, quando maior a expectativa, maior pode ser a frustração. Mas, ainda assim, não tenha medo de guardar um vinho. Sua espera pode, sim, ser recompensada.

 

 

 

guardar vinho evolução" "adega vantagem desvantagem