Investimento em vinho

Um pequeno, comprovado e embasado estudo sobre os prós e contras do investimento em vinhos. Confira e pense duas vezes antes de investir.

por Edgar Rechtschaffen

A questão se investir em vinhos finos pode ser rentável é bastante complexa. Alguns especialistas do ramo de vinhos pretendem que os mais bem sucedidos conseguem retorno de até 30%. Mas a realidade é que a maioria dos vinhos habitualmente cotados nos leilões apresenta uma performance bem mais modesta, com taxas de retorno positivas podendo atingir a faixa de 10% a 15%. Mas, como toda ação, também pode cair de valor, para níveis negativos, com mesma faixa de variação.

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Ao contemplar a idéia de vinho como investimento é importante ter em mente que ações freqüentemente pagam dividendos, o que não ocorre com o vinho. Também, a taxa de custódia de uma ação junto a um banco ou corretora é muito baixa, ao passo que o custo anual para armazenar uma caixa com 12 garrafas é de £6 (em Londres). Pode parecer pouco, mas para vinhos com preço por garrafa de £50 (US$ 100), isso representa, ao cabo de cinco anos, um custo acumulado de 5% sobre o preço de aquisição. Fora isso, ao vender um vinho através de uma reputada casa de leilões, a comissão do leiloeiro é da ordem de 10% sobre o valor da venda. Adicionam-se ainda eventuais impostos do tipo Value Added Tax-VAT (taxa de valor agregado, algo como nosso ICM).

Portanto, a mera comparação do comportamento do preço dos vinhos, com índices globais de ações ou commodities, deve ser feita com bastante cautela. De mais a mais, ao contrário da crença generalizada, poucos vinhos são feitos para envelhecer e esses, além de caros, são de difícil obtenção, armazenagem e venda. Além de requererem um profundo know-how e conexões para entrar no jogo e, ainda assim, sem garantia de que se ganhará dinheiro.

A par dessas considerações bem genéricas e que apenas abordam alguns aspectos que diferenciam o vinho de uma ação, resolvemos entrar nesse jogo de cabeça, através da elaboração de um case-study. Assim, montamos uma carteira (virtual) composta por 20 rótulos, toda de vinhos de alta extirpe, principalmente da aristocrática Bordeaux, complementados por três ilustres rótulos da Borgonha e dois emblemáticos Sauternes. Para cada rótulo, elegemos três safras: excepcional (ocorre de seis a sete vezes a cada século), ótima (uma a cada dez anos) e muito boa (uma a cada seis anos). No total, portanto, formamos uma carteira com 60 caixas de doze garrafas: 720 garrafas do que há de mais fino em termos de vinhos franceses.


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Para os vinhos de Bordeaux (incluso os cinco 1er grands crus classés do Médoc juntamente alguns dos grandes de St Emilion e da vizinha Pomerol) elegemos as safras 1982, 1990 e 1996. Para os vinhos da Borgonha, as safras escolhidas foram 1978, 1982 e 1989 e para os Sauternes, bem mais longevos, 1962, 1975 e 1976. A carteira inclui Ch.Petrus, Ch.Cheval Blanc, Ch.Latour, Ch.Margaux, Ch.Lafite Rothschild, Ch.Haut Brion, Ch.Mouton Rothschild, La Tâche, Richebourg e Ch. D'Yquem, entre outros.

Bordeaux 1982/1990/19961982 Feb-101982 Feb-06ganho nominalganho efetivo1990 Feb-101990 Feb-06ganho nominalganho efetivo
Lafite440036301.2120.84517821.5661.1380.793
Latour391045100.8670.604302524201.2500.871
Margaux363029701.2220.852385033001.1670.813
Mouton418034101.2260.854126514850.8520.594
Haut-brion218517601.1760.820126510451.2110.844
Leoville las cases207017601.1760.820126510451.2110.844
Cos d' estournel135111551.1700.8158287701.0750.750
Palmer7506991.0730.7488257151.1540.804
Cheval blanc483040151.2030.839407039601.0280.716
Ausone184035200.5230.364121015950.7590.529
Figeac10939521.1480.8009908801.1250.784
Petrus9775137500.7110.4961100093501.1760.820
Certain de may181523100.7860.5484186380.6550.457
La conseillante154010001.5401.073143013001.1000.767
L'evangile209017601.1880.828165014581.1320.789

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Nossa referência de preços foi a Decanter Fine Wine Price Watch, publicada mensalmente pela revista inglesa homônima, e que apresenta os preços médios ocorridos nos principais leilões do Reino Unido, incluindo aqueles organizados pelas renomadas casas de leilão Sotheby´s e Christie's. Evidentemente, todos os vinhos que compõem nossa carteira são regularmente cotados pela Decanter Fine Wine Price Watch.

A metodologia consistiu em comparar os preços em dois períodos distantes entre si de quatro anos: fevereiro de 2006 X fevereiro de 2002. Para se ter uma rentabilidade comparável a alguns títulos de renda fixa, impusemos uma rentabilidade mínima de 6% ao ano (a juros compostos), de modo que as cotações de fevereiro de 2002 tiveram que ser corrigidas (majoradas) em 26,245%, para incorporar essa rentabilidade mínima. Assim, passamos a ter o preço de venda que tornaria o investimento equivalente a uma aplicação de baixa rentabilidade, que mal consegue compensar a desvalorização da moeda.


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Aqui há que salientar que nos últimos sessenta anos, a taxa media de inflação do dólar norte americano foi de aproximados 5,5% ao ano. O que equivale a 100% de desvalorização a cada 13 anos. Dessa forma, podemos confrontar os preços reais com os preços corrigidos e verificar, por mera divisão do valor atual pelo valor corrigido, se houve ganho ou perda. Mas isto, sem contar as despesas de venda: comissão do leiloeiro e eventuais impostos VAT. No total usamos 13,5% para representar essas despesas, a serem deduzidas do hipotético preço de venda, de fevereiro de 2006.

A Tabela acima é auto-explicativa.

Tabela
Verificamos que, sem considerar a desvalorização e os custos de venda, nossa carteira apresenta um ganho de 10%, com 73% dos vinhos apresentando alguma valorização. Mas, quando os redutores são introduzidos, o quadro muda de figura. E, o primeiro fato que chama a atenção é que, dos 60 vinhos considerados, apenas quatro passam a apresentar um (modesto) ganho real: La Conseillante 82, Certain de May 96 e La Tâche 78 e 82. Os dois primeiros, da região do Pomerol e os dois últimos da Bourgogne.

Com mais detalhe, e de forma global, o valor nominal de nossa carteira em moeda de fevereiro de 2002 era de £132.320 (US$ 264.640), perfazendo um preço médio por garrafa de US$ 368. Mas, esse valor, quando atualizado para fevereiro de 2006, passa a ser £167.054 (US$ 334.108), correspondendo a um valor médio de US$ 464 por garrafa. Por outro lado, descontados os custos de venda (principalmente a comissão de venda), se nossa carteira tivesse sido totalmente vendida em fevereiro de 2006, o resultado líquido desta venda reduzir-se-ia de £146.691 (US$ 293.382) para £126.888 (US$ 253.776). O valor médio de cada garrafa teria caído para US$ 352. Ou seja, o resultado global de toda a operação representaria uma perda no valor da carteira de 24%, num período de quatro anos.

Concluindo, podemos afirmar que, no período contemplado, o investimento em vinhos franceses finos, não foi um bom negócio. Mas, para consolo de alguns, algo melhor que no badalado ramo de telecomunicações.

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