Dicas para rechear seu santuário do vinho da melhor maneira
Por Arnaldo Grizzo Publicado em 28/03/2016, às 16h30 - Atualizado às 16h36
Quem compra uma adega dá um passo sem volta na direção de se tornar um colecionador. Comprar uma adega significa que você já foi definitivamente fisgado pelo mundo do vinho e valoriza a sua cultura. Entre outras coisas, você sabe que seus vinhos, por mais simples que possam ser, precisam ser guardados em um lugar seguro, escuro, úmido e com temperatura controlada. Você sabe também ter paciência, uma das maiores virtudes do vinho, para poder apreciar as nuances que o tempo traz, guardando algumas garrafas especiais.
Por tudo isso, ter uma adega climatizada em casa obrigatoriamente o torna um colecionador. No começo, todos pensamos em comprar uma adega pequena, de 12 lugares, por exemplo. Em um mês, ela já está abarrotada. Passa-se, então, para uma de 50 lugares. Em seis meses, ou menos, você está espremendo garrafas para ver se cabem mais. A solução parece sempre ir para uma maior, e maior, e maior, pois você não se cansa de acumular vinhos – o que, convenhamos, é uma tarefa deliciosa. É um desejo quase incontrolável. Você vê (ou prova) um vinho, encanta-se, e logo compra uma ou mais garrafas para poder saboreá-lo em um momento especial. Isso é totalmente compreensível.
Assim que você compra uma adega climatizada, passa a colecionar rótulos. Então, é preciso se organizar para que não falte espaço para suas preciosidades
No entanto, para não se ver atulhado de garrafas pela casa mesmo tendo uma adega que você considera suficiente para as suas necessidades, é preciso saber como gerenciá-la. O primeiro passo é fazer alguns cálculos bem simples de quantos vinhos consome e quantos vinhos compra por mês em média. É fácil: se você compra seis garrafas por mês e consome apenas metade delas, ao final de um ano precisa ter espaço para guardar mais de 30 garrafas na adega. Dessa forma, uma de 50 lugares ficará abarrotada em pouco tempo. Ou seja, mesmo para quem está começando, é interessante optar por tamanhos a partir de 50 lugares, a não ser que você esteja preocupado somente em ter vinhos de consumo rápido. Neste caso, sinceramente, talvez nem valha a pena ter uma adega, já que a geladeira ou o armário debaixo da escada podem funcionar tranquilamente.
Depois de escolhida a adega, a questão se volta a como recheá-la. Pense no seu perfil de consumidor. Se você costuma receber amigos para jantares e se preocupa em manter uma boa variedade boa de estilos para poder escolher dependendo da ocasião e harmonização, deve considerar ter vinhos de todos os tipos: espumantes, brancos, rosés, tintos e doces, assim como variações dentro desses temas. Mesmo que você tenha preferência por algum deles, é bom ter um leque amplo para estar preparado para qualquer situação. Depois, obviamente, é importante reservar espaço para vinhos de guarda, para os momentos especiais.
Se o seu intuito é apenas colecionar, juntar raridades, sem se preocupar em guardar vinhos para o dia a dia, também vale a pena reservar espaços para tipos diversos e vinhos com evoluções diferentes.
Vamos começar sugerindo uma ideia de divisão para quem quer ter uma adega mais focada na variedade de opções do que nos vinhos de guarda. Ainda assim, considerando uma adega de 100 lugares, invariavelmente você vai separar de 15 a 20% do espaço para vinhos de guarda – aqueles que serão guardados dois ou mais anos antes de serem abertos.
Depois, vamos pensar numa divisão interessante por tipos a começar pelos espumantes. Vale a pena sempre ter de seis a 10 garrafas à disposição. Além de serem excelentes aperitivos e combinarem com quase qualquer tipo de comida, são ótimos para os momentos de celebração. Dentre essas garrafas, opte pelos Brut preferencialmente, alternando entre espumantes de método tradicional (Champagne, Cava e Franciacorta, por exemplo) e Charmat. É interessante ter um Prosecco, assim como alguns bons representantes nacionais.
No que tange os vinhos brancos, mesmo quem não é fã, precisa ter em sua adega, pois eles são muito versáteis, harmonizando bem com pratos mais leves, frutos do mar, saladas, peixes etc. Ter umas 15 garrafas deles também está de bom tamanho, mas é importante variar os estilos e castas. Você pode dividi-los em brancos de uvas aromáticas e não aromáticas. Entre os não aromáticos, os mais clássicos são os Chardonnay. Por outro lado, no campo dos aromáticos, está a Sauvignon Blanc. Se quiser completar o leque, vale a pena investir nos Riesling, sempre muito ecléticos. Mas também é uma boa ter alguns Vinhos Verdes, Sémillon, Gewürztraminer, Torrontés, Viognier, Chenin Blanc, Viura, dentre outros.
Em uma adega eclética, com vinhos para todas as ocasiões, garrafas de longa guarda podem representar de 15 a 20% do espaço
Se você gosta de rosés, tenha um ou dois da Provença, isso basta. Quanto aos doces e fortificados, é importante ter sempre, pelo menos, dois Vinhos do Porto (Tawny, Ruby ou LBV) ou então um Jerez, Madeira, Banyuls, e mais outros dois brancos doces com grande acidez como os Late Harvest, ou então algo mais sofisticado como Tokay e Sauternes. Isso vai lhe dar uma margem de manobra para harmonizar sobremesas ou apenas para ter um “vinho de meditação”.
O ponto crucial da adega, porém, costuma ser os tintos. Você pode reservar de 30 a 40% do espaço para eles, pois são diversos os tipos e estilos. Sendo assim, vamos separar em três categorias: leves, de médio corpo e encorpados. Na primeira categoria – que geralmente não passam por barrica ou, se passam, é por pouco tempo –, selecione alguns Pinot Noir (varie entre Borgonha, Nova Zelândia, Estados Unidos e outros países do Novo Mundo de sua preferência), Barbera, Mencía (Joven), e rótulos mais simples (sem passagem por madeira) de Merlot, Tempranillo, Syrah. Eles serão agradáveis, fáceis de beber, de acompanhar uma refeição ou uma conversa. Por isso, eles podem ser a maior parte dos tintos, cerca de 20.
Buscando espaçoUm alerta: ao comprar uma adega, geralmente nos sentimos impelidos a comprar mais vinhos para preenchê-la. Uma dica para quem, de repente, vê-se sem espaço é realocar seus vinhos de consumo imediato para a geladeira, de preferência espumantes e brancos, cujas temperaturas de serviço são mais próximas das do refrigerador (entre 5o e 10oC). A pouca umidade desse ambiente pode ressecar as rolhas, assim como o contato com a luz pode acelerar o envelhecimento, mas, se for por pouco tempo (uma semana), não há problema. Se possível, porém, evite. |
Ao passar para a categoria dos vinhos de corpo médio e encorpados, é preciso parcimônia, pois, como muitos deles são feitos para suportar anos de guarda, você pode facilmente enquadrá-los na categoria “de guarda” e acabar “esquecendo-os” lá. Lembre-se: estes você decidiu beber. Você já deixou espaço para os de guarda, não se preocupe. Sendo assim, de médio corpo, que tal selecionar alguns bons espanhóis Crianza e também italianos, como os Chianti e alguns Supertoscanos? Há ótimos exemplares de vinhos alentejanos não tão pesados, assim como Carménère chilenos, Malbec argentinos e Cabernet Sauvignon de ambos os países. Separe 10 lugares para eles.
No grupo dos encorpados, vale a pena investir em Tannat do Uruguai, alguns blends do Douro, assim como do Rhône com seus GSM (Grenache, Syrah e Mourvèdre), ou então partir para os Rosso e Brunello di Montalcino, ou Barolo e Barbaresco da Itália – quem sabe um Primitivo. Isso sem falar dos cortes bordaleses. Lembrando sempre que você está guardando esses vinhos para consumir. Eles geralmente serão reservados para momentos em que estarão ao lado de refeições (preparações mais pesadas e elaboradas) ou para agradar paladares que gostam de bebidas mais potentes. Então, reserve também espaço para 10 garrafas desse tipo.
Enfim, fazendo um cálculo rápido, com 10 espumantes, 15 brancos, dois rosés, 40 tintos, cinco doces e 20 rótulos de guarda, você terá 92 vinhos em sua adega de 100 lugares, com uma folga para preencher como quiser ou apenas para servir de “margem de manobra”, quando, por exemplo, quiser comprar mais garrafas de um mesmo vinho para um jantar especial.
Quem não está preocupado em reservar espaço para vinhos de consumo “rápido” em sua adega, também costuma se ver atulhado de garrafas de uma hora para outra. Para evitar isso, também é interessante promover algumas divisões e pensar em prioridades.
Peguemos como exemplo, novamente, uma adega de 100 lugares. E também vamos considerar que você pretende consumir boa parte dos seus vinhos em, no máximo, 30 anos. Convenhamos, você não vai viver para sempre. Então, a não ser que esteja guardando os vinhos para os seus filhos e netos, é bom pensar em desfrutar deles a partir de determinado momento.
Lembre-se, cedo ou tarde, você precisa começar a abrir seus velhos vinhos
Assim sendo, vamos separar a adega em períodos e estilos. Uma boa divisão seria ter cinco espumantes de guarda (Champagnes Vintage, por exemplo), que você provavelmente vai consumir entre cinco e 10 anos, assim como 10 brancos (Chablis e outros borgonheses Grand Cru, por exemplo), que provavelmente também serão abertos nesse período de tempo. Nos tintos, vamos separar três etapas de consumo. A primeira, até 10 anos, a qual terá o maior espaço, com 25 lugares. Depois, tintos que serão consumidos entre 10 e 20 anos de envelhecimento, com 15 lugares e, por fim, cinco lugares para os “heróis da resistência”, aqueles tintos que ficarão lá por cerca de 30 anos. E não podemos esquecer de uns 10 lugares para doces e fortificados que, sempre longevos, muitas vezes merecem longas guardas, de 20 a 30 anos também, ou mais.
Assim, você terá 70 rótulos “dormindo seu sono de beleza” em sua adega, enquanto aguardam o melhor momento para serem degustados. Com isso, você pode comprar entre 20 e 30 vinhos durante os próximos 10 anos (mantendo a proporção) que sua adega sempre terá espaço suficiente para as suas relíquias.