Localizada no noroeste espanhol, o terroir vem chamando a atenção com seus grandes vinhos
Redação Publicado em 15/10/2021, às 15h00
Bierzo talvez não seja um dos primeiros nomes citados quando alguém porventura questiona sobre uma denominação espanhola com profusão de vinhos de alto gabarito.
Contudo, nas provas para o Guia de Vinhos – ADEGA Espanha, pudemos notar que é preciso ficar de olho nessa região às vezes esquecida do noroeste espanhol. Bierzo emplacou nada menos do que sete rótulos de destaque no guia, sendo um deles o melhor do ano, o Post Crucifixion – que ficou empatado com o Castillo Ygay de Marqués de Murrieta (temos uma entrevista incrível com o Vicente Dalmau Cebrián-Sagarriga, enólogo da vinícola).
Bierzo fica no noroeste da província de León, na região de Castilla y León, fazendo dividas com as regiões da Galícia e Astúrias e também com Ourense e Lugo.
Acredita-se que as origens da vitivinicultura local sejam muito antigas, pois já havia citações de Plínio, o Velho, e Estrabão que falavam de vinhas na área, originariamente derivada da cidade pré-romana de Bergidum. Mas o “auge” ocorreu durante o período medieval com os monges cistercienses e seus mosteiros, mas especialmente pela região ficar na rota dos peregrinos do Santiago de Compostela.
O terroir de Bierzo é lar de alguns dos novos ícones espanhóis
Depois do surgimento da filoxera, Bierzo teve altos e baixos, com o início da recuperação a partir dos anos 1960, época do surgimento de cooperativas. Em 1989, a denominação de origem foi reconhecida e 20 anos depois, em 2019, criou-se uma classificação de vinhedos similar à da Borgonha, em que alguns “Crus” foram delimitados e hierarquizados.
Tudo isso graças a uma revolução que vem ocorrendo no local, com produtores tradicionais – e também novos – buscando resgatar vinhedos seculares, técnicas e variedades para dar origem a vinhos verdadeiramente excepcionais. Nomes como Raul Perez, Alvaro Palacios e Diego Magaña são alguns dos que vêm fazendo com que Bierzo ganhe destaque internacional. Tanto que a região chamou a atenção do argentino Gerardo Michelini e sua esposa Andrea Mufatto, que decidiram iniciar um projeto lá em 2015 junto com o viticultor local Javier González.
Os vinhedos de Bierzo são bastante fragmentados, com microparcelas de vinhas em encostas, de 450 a 800 metros. O solo das partes mais baixas tem textura argilosa, moderadamente ácida, com ausência de carbonatos, típica de climas úmidos. Os solos das encostas são compostos por uma mistura de minerais, quartzito e ardósia. O microclima é caracterizado pela barreira natural da Serra de los Ancares, que aplaca as tempestades atlânticas e resulta em um clima continental com a influência do oceano. A pluviosidade anual é de 721 mm e a temperatura média de 12,3°C.
Região de Bierzo foi um dos destaques no Guia ADEGA Espanha 2021
As variedades autorizadas são Mencía e Garnacha Tintorera entre as tintas, e Godello, Doña Blanca, Palomino e Malvasía, entre as brancas. Recentemente as castas tintas históricas Estaladiña e Merenzao foram incluídas na denominação.
Contudo, a cepa de maior destaque é, indiscutivelmente, a Mencía.
Ela representa quase 75% das uvas plantadas na região e responde bem aos solos argilosos e à base de ardósia, produzindo cachos pequenos e uvas de pele fina. Dependendo de como é vinificada, pode oferecer vinhos mais concentrados e estruturados, mas os exemplares que vêm se destacando costumam ter coloração delicada, serem mais verticais e tensos, aliando força com sutileza, podendo, nesse último caso, ser comparados a bons Pinot Noir ou Nebbiolo.
Confira uma seleção de excelentes vinhos de Bierzo provados por ADEGA:
Elaborado a partir de Mencía, Alicante Bouschet e Sousón, com estágio de 12 meses em barris de carvalho francês este é um vinho cheio de camadas, com estrutura e concentração, mas ao mesmo tempo elegante e profundo.
Este é um blend das uvas Mencía, Alicante Bouchet, Souson e Doña Blanca, advindas de vinhas de idade média de 80 anos, fermentado com engaços e estágiado 12 meses em barris de carvalho francês. Um autêntico lobo em pele de cordeiro. Atrás da aparente facilidade em degusta-lo, esconde nuances de sabores e de textura, que conferem profundidade e verticalidade.
Composto de uvas Mencía, Garnacha e Sousón, advindas de idade média de 80 anos, fermentado com 50% de engaços e estágiado 14 meses em foudres de carvalho francês é um que chama a atenção pelas notas florais, especiadas e de ervas frescas dão o toque final de complexidade.
Esse 100% Mencía impressiona pelos taninos tensos e de grãos finos e pela acidez elétrica, que conferem profundidade, persistência e fluidez ao vinho. Tem final cativante, com toques terrosos e de cerejas.
Este é um blend de 50% Mencía, 20% Merenzao, 10% Palomino, 10% Bracellao e 10% Godello, fermentado em ânforas de barro, com cachos inteiros, sem adição de leveduras, com 311 dias de maceração pelicular e estagiado durante 3 meses em barris usados de carvalho francês de 500 litros. Para esse vinho foram utilizados vinhedos quase seculares e vinificação minimamente intervencionista. Tem a virtude de ser extremamente frutado, mas também austero, acessível, mas também introspectivo, direto, mas também profundo, aparentemente simples, mas, ao mesmo tempo, muito complexo.
Um 100% Mencía com estágio de 10 meses em barricas de carvalho francês e americano fluido e vertical. O seu final persistente, com toques terrosos, salinos, de amoras e de ameixas convidam a uma segunda taça. Surpreende pela vivacidade e pela juventude, mesmo com quase 10 anos.
Este é um 100% Mencía sem passagem por madeira. Chama atenção pelos taninos de firme textura e pela acidez vibrante, que trazem vibração ao conjunto e equilibram toda sua fruta. A fermentação com os engaços tem papel fundamental para aportar profundidade, meio de boca e tensão.
» Receba as notícias da ADEGA diretamente no Telegram clicando aqui