Redação Publicado em 31/03/2020, às 19h12 - Atualizado em 01/04/2020, às 17h56
Enquanto alguns tentam se defender da calamidade (Itália, Espanha) e outros países, como a Argentina, estão em plena colheita, caiu como uma bomba no mercado o e-mail enviado pela importadora Grand Cru para produtores de vinhos que integram seu portfolio em todo o mundo. Para um desses produtores “foi um míssil disparado do Brasil”. No comunicado (veja abaixo), a Grand Cru informa simplesmente: “Na tentativa de amenizar os efeitos negativos dessa pandemia no emprego, na renda e na estrutura do nosso negócio, viemos comunicar aos nossos fornecedores a suspensão temporária de alguns pagamentos por produtos adquiridos e a necessidade de negociação de novos prazos de pagamento, solicitando ainda a suspensão temporária da emissão de faturas, boletos ou notas fiscais contra a Grand Cru ou suas coligadas até que a situação se estabilize.”
Segundo outro produtor, que prefere não se identificar, era justamente de países como Brasil e Estados Unidos que esperava alguma forma de apoio para atravessar esta crise de enormes proporções. Com verbas de marketing e compromissos de compra acordados com a importadora, esse produtor, desolado, comentou: “Agora, não tenho nem as novas vendas, nem recebo o que já vendi; estou perdido”.
Obviamente, a situação no Brasil é gravíssima. Mas o negócio do vinho, mais que um negócio entre empresas, é um negócio entre pessoas. E a calamidade afeta a todos. Aliás, outro importador ressaltou, de forma muito lúcida, que esta é a primeira vez que enfrenta uma crise em que não precisa explicar aos produtores de outros países o que está acontecendo no Brasil: o mundo todo está no mesmo barco.
Com certeza, a Grand Cru passa pelo que parece ser a tempestade perfeita. O grande diferencial da empresa é sua rede de lojas espalhadas pelo país. E, desde o ano passado, trabalhava intensamente para reconquistar espaço no on trade, as duas frentes mais duramente atingidas na atual quarentena. Nesta situação, os grandes geradores de caixa da empresa param, assim como os motores de um grande navio atingidos por torpedos. Mesmo que não vá a pique, o navio fica à deriva.
O que parece ter mais ofendido, ou exasperado, os produtores, é que a Grand Cru, ao invés de contatar diretamente cada um, explicar a situação e tentar negociar novas condições como prazos de pagamento e outras, optou, pelo menos até agora, por enviar o lacônico comunicado em que termina dizendo apenas que “manterá os fornecedores informados sobre desenvolvimentos futuros”.
Vindo de uma das maiores importadoras do Brasil, essa atitude relembra o tempo em que uma outra gigante na importação teve sérios problemas de caixa e deixou de honrar pagamentos e contratos. Na época, isso afetou não apenas a reputação daquela importadora, mas a de todos os importadores do Brasil. Mesmo os que estavam em boa situação financeira passaram a ser vistos com desconfiança e enfrentaram dificuldades ao negociar prazos, condições, e até mesmo para contratar seguros de crédito.
Momentos de crise exigem ações enérgicas. Mas é também nesses momentos que transparência, respeito pelos parceiros (muitos dos quais de longos anos) e confiança mútua na busca da melhor solução para todas as partes envolvidas mais se fazem necessários. É nesses momentos que relacionamentos, mesmo entre empresas, se fortalecem, ou ficam trincados para sempre.