Em uma entrevista exclusiva Laurence Helfrich conta a história do maior grupo de vinhos da França
Nada menos que 3.470 hectares de vinhas em diversas regiões vitivinícolas francesas, que vão da Alsácia ao Jura, passando por Borgonha, Rhône, Provence, Languedoc, Bordeaux e Loire. Marcas mundialmente famosas como J.P. Chenet, Grand Sud, Calvet e Divine também fazem parte.
Fora da França, possuem vinícolas no Chile, Hungria e Espanha, além de ter negócios na China. Talvez não à toa o grupo se chame Grand Chais de France, hoje o maior produtor e negociante de vinhos da Europa e o maior exportador da França.
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A empresa nasceu há mais de 40 anos, primeiramente voltada à distribuição de Cognac, mas logo passou aos vinhos. A sede do GCF está localizada em Petersbach, na Alsácia. Em pouco tempo, desenvolveu marcas de rótulos a preço baixo (que eles chamam de “premier prix”), no entanto, ao longo dos anos, foram adquirindo propriedades importantes ao redor da França e passaram a atuar em toda a gama, dos rótulos de valores mais acessíveis aos Grand Crus topo de linha, criando assim um “império” que abrange uma diversidade enorme de produtos.
Conversamos com Laurence Helfrich, esposa de Joseph Helfrich, fundador da Grand Chais de France, que nos conta mais sobre a sua história e os planos da empresa.
- Poderia contar um pouco da história da empresa?
Ela começou em 1979. Foi Joseph Helfrich, meu marido, que criou a empresa do nada. Não tinha muito dinheiro no bolso, mas dizia: “porque não desenvolver um negócio de vinho?” No início, era um comércio, para comprar e comercializar na Europa. Por uns bons dez anos, era um negócio de “primeiro preço” (linhas de produtos baratos) e, ao longo do tempo, ele disse para si mesmo: “Primeiro preço é uma coisa, mas eu estou realmente interessado em vinho e gostaria de adquirir propriedades”. O primeiro investimento foi em 1984, no Jura, e assim ele começou a ter um interesse mais próximo pela vinificação, visto que não fazia vinificação na época. No início, interessava-se em fazer vinho por métodos tradicionais. E seu primeiro grande cliente foi François Montand. Depois, com o tempo e o sucesso, a empresa cresceu e compramos uma primeira vinícola em 2003, no Languedoc, o Domaine de la Baume, uma propriedade que pertenceu a australianos, que fizeram uma mistura entre técnicas australianas e francesas.
- Como assim?
Os australianos colhiam à noite e os franceses não. Então, eles trouxeram essa técnica de vindimar à noite para evitar ao máximo a oxidação das uvas. E nós, ao nível do nosso tecnicismo naquela altura, refrigerávamos durante a vinificação – isso se complementou entre a Austrália e a França. Na época, a propriedade tinha 30 hectares, hoje são 1000, ou seja, compramos ao redor para poder vinificar e completar as castas que não tínhamos. E temos o Domaine Saint-Paul que fica em frente. Hoje, nesta propriedade, que completou 20 anos, fizemos um centro de vinificação e comercializamos uvas para vinificar em outras marcas. Investimos muito e, ao longo dos anos, Joseph realmente se apaixonou pelo terroir francês e, em cada uma das regiões, compramos propriedades. Temos 72 propriedades na França. Destas, selecionamos 27, as melhores, onde investimos na reestruturação da vinha, nas técnicas de vinificação, nas ferramentas e homens, para se tornarem propriedades de alta gama.
- Como o negócio de venda de vinhos influencia na vinificação?
Por sermos da parte comercial, fazemos desde o primeiro preço até o Grand Cru, pois temos uma linha generalista. Mas não somos absolutamente generalistas em nossas propriedades. Mantivemos os homens em cada terroir e cada propriedade tem a sua identidade, mas é verdade que o chapéu do grupo mascara um pouco esse “savoir-faire”. É por isso que resolvemos criar um portfólio Famille Helfrich, que tem coisas realmente muito bonitas.
- De qual parte do negócio você mais gosta? Produção ou comércio?
Os dois lados são muito legais. A parte da vinificação é uma parte muito importante e necessária do nosso trabalho, e é gratificante estar perto das nossas equipes no campo, porque sentimos a sua paixão, e isso faz vibrar a paixão pelo vinho. E depois, do outro lado, vender o vinho nos diferentes mercados e poder conversar e partilhar, é bom também, é muito agradável. Vinho é convívio, é isso que queremos na Famille Helfrich: oferecer os vinhos de forma a serem acessíveis, para que todos possam se beneficiar deste convívio, porque vinho é isso, é partilha, é prazer. No programa da Famille Helfrich temos várias propriedades em cada uma das regiões. Mas o importante é que Famille Helfrich não sou eu, não é meu marido, mas são todos que contribuem para nossas propriedades. A gente quer apresentar a Solange, nossa enóloga no sul, Vincent, que vinifica o Château Quentin, é ele quem tem o mérito, não somos nós. Estamos ali para financiar, para progredir, mas são eles que fazem o vinho. Queremos falar dessas pessoas através do seu know-how.
- Qual a importância disso?
Somos os porta-vozes, porque quando compramos todas essas propriedades, elas estavam muito mal. Então é salvar a profissão, é ajudar cada viticultor que esteve por trás dela e trazer-lhe o tecnicismo, o toque moderno, com o know-how dele; e também dar acesso ao mercado.
- Muitos produtores costumam montar suas próprias distribuições em diferentes mercados para verticalizar o processo e entender mais do negócio. Vocês fizeram o caminho inverso. Como isso contribuiu?
Procuramos sempre adaptar-nos da melhor forma às expectativas dos consumidores. Isso é muito importante, ou seja, o vinho não deveria, há 20 anos, ser o mesmo de hoje porque o consumidor, há 20 anos, não comia como hoje. A comida mudou. O produtor deve ouvir o que o consumidor quer. E isso nem todo mundo faz. Nós, seja nas propriedades, seja nas marcas, procuramos ver quais são as necessidades do consumidor. Se virmos que o consumidor quer frutas e coisas mais fáceis de beber, vamos abordar isso, mantendo, claro, a identidade da região. Não se trata de igualar a margem direita à margem esquerda. A gente tem que se adaptar. Vamos então tostar menos na barrica para o vinho não ficar muito marcado pela madeira. Refletimos e tentamos adaptar as nossas vinificações em relação a tudo isso, e recebemos muita ajuda. Olivier Poussier, que foi o melhor sommelier do mundo em 2007, trabalha muito conosco e é ele que nos vai aconselhar na escolha dos nossos fornecedores de barricas e nas várias coisas que é necessário fazer para o envelhecimento dos diferentes vinhos. Também somos assessorados por Michel Roland há um bom tempo. É bom ter pessoas ao nosso lado que vêm e ajudam-nos a melhorar, porque também eles nos trazem um certo know-how e melhoramos ano após ano.
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