Merloteando pelo Cone Sul

Presença indispensável em vinhos ícones de Bordeaux,a uva merlot ganha destaque na América do Sul

José Ivan Santos Publicado em 21/09/2006, às 09h00 - Atualizado em 15/02/2019, às 17h10

 

Locais da Serra Gaúcha e da Campanha têm ótimos terroirs para o cultivo do merlot

As virtudes da uva merlot se definem a partir de suas diferenças com a cabernet sauvignon, sua quase eterna companheira nos cortes dos grandes tintos de Bordeaux. Apresenta aroma mais doce, é mais suave na boca e menos ácido. O merlot é o acompanhante nos vinhos da margem esquerda do Gironde, o rio que separa os estilos de vinhos de Bordeaux. Mas a leste de Bordeaux, na margem direita do rio, em Pomerol e St. Emilion, é a estrela máxima, graças a tintos ícones no mundo. Existem muitos exemplos, ainda que bastasse citar somente um: "Pétrus", talvez o tinto mais célebre do planeta. Dois outros hiper-exemplos são o "Ausone" e o "Cheval Blanc". A doçura da fruta do merlot se converte numa sinfonia quando o clima da margem direita colabora, originando uma potência inusitada na boca.

 

No Novo Mundo, o merlot geralmente não atinge esses níveis, embora existam exceções. Nos Estados Unidos, o merlot do Vale do Napa alcançou grande notoriedade. Lá, até pouco tempo atrás, pedir uma taça de merlot era a máxima sofisticação. Um amigo americano, professor da Universidade de Nebraska, em visita ao Brasil, ao sentir o aroma de um morango me disse: "essa fruta tem aroma de merlot". Nos Estados Unidos já houve várias tentativas de destronar o merlot no gosto dos americanos. A maioria já ouviu falar ou assistiu o filme Sideways, no qual o protagonista é um aficionado da pinot noir e diz que abandonaria uma mesa de jantar onde uma convidada pedisse merlot. Porém, ironicamente, no grande momento do filme, ele toma o "vinho de sua vida", o "Cheval Blanc", safra 1961, feito com 50% de merlot.

Uma boa parte dos vinhos tintos do Cone Sul tem a merlot em sua composição. Desde 1994, no Chile, quando se descobriu que muito do que se conhecia como merlot era na verdade carmenère, houve um grande avanço com os vinhos chilenos dessa uva, o que não ocorreu com merlot. Somente agora começam a chegar ao mercado bons merlots chilenos. Isto só foi possível depois que os produtores constataram que a merlot originava bons vinhos com uvas vindas de clima frio.

 

O "Merlot Reserva Expression 2004", de Villard (Decanter, R$ 56,00), vem de Casablanca e seus aromas nos levam a algo repleto de especiarias, com um toque de canela e cravo-da-índia, misturados a pimentão verde, sobre taninos suaves de textura aveludada.

 

As uvas do merlot de "Calina" vêm do Maule, as do "Torreón de Paredes" vêm dos pés dos Andes no Alto Cachapoal, e as de "Cousiño Macul" do vinhedo de Buin, que fica pés nos Andes no Alto Maipo. Já o "Ventisqueiro Merlot Gran Reserva" usa uvas do Bajo Maipo.

A Argentina tem obtido bons merlot em Tupungato e Alto Agrelo, zonas mais frias que Mendoza. O merlot de Salentein tem dado o que falar por suas notas de framboesa e pimenta recémmoída; com ou sem madeira ("Finca El Portillo"), tem características bem definidas e grande tipicidade.

Com clima mais ameno que Mendoza, situado no paralelo 39, Neuquén, na Patagônia, tem grandes amplitudes térmicas diárias, o que garante vinhos com mais frescor. Com condições que não favorecem o desenvolvimento de fungos e pragas, os vinhedos são conduzidos naturalmente de forma orgânica, o mesmo ocorre na vizinha província de Rio Negro.

O "Merlot Newen 2003", de Bodegas Del Fin del Mundo (Reloco, R$ 95,00), vem do vale de San Patrício del Chanar, em Neuquén, e ao lado de um ligeiro frescor mostra aromas evoluídos de ameixa preta e uva-passa. É um merlot bem estruturado com taninos evoluídos.

O Uruguai tem nos enviado belos vinhos dessa uva, como o "Merlot Premium 2002", de Filgueira (Decanter, R$ 68,00). É um vinho muito elegante, vindo de Canelones, uma região de clima temperado, mais úmido e com grande índice pluviométrico, onde se situa a bodega.

No Brasil, alguns locais da Serra Gaúcha e da Campanha têm se revelado próprios para o cultivo da merlot. São vinhos com ótima relação qualidade/ preço; vinhos nacionais nos quais o valor de cada garrafa vale cada real. O "Desejo Merlot 2004" (R$ 60,00), novo lançamento da Salton, é um desses vinhos. Elegante, estagiou um ano em carvalho, bom corpo e acidez, aromas complexos que misturam madeira (baunilha) com especiarias (pimenta preta), notas de tostado e final longo, marcado por frutas roxas (ameixa, framboesa).

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