Uma das variedades mais plantadas no sul da França, a Syrah exibe seu potencial no Novo Mundo
José Ivan Santos Publicado em 26/10/2006, às 07h21 - Atualizado em 26/02/2019, às 15h26
Os grandes vinhos da uva syrah vêm do norte do Rhône. Lá, em appellations célebres como Hermitage e Cote-Rôtie, a syrah alcançou seus primeiros êxitos, no começo do século XIX. Seus vinhos chegaram a rivalizar, em prestígio e qualidade, com os grandes tintos de Bordeaux, o que, convenhamos, não é pouco. Hoje os melhores exemplares de syrah do Rhône vêm de uvas de velhas videiras, cultivadas em encostas muito inclinadas.
Essa variedade se converteu em uma das favoritas do mundo, primeiro pela qualidade dos grandes vinhos franceses e depois pelo sucesso de seu similar australiano (grafado shiraz), que se converteu em uma força global.
Atualmente, a syrah é uma das variedades mais extensamente plantadas no sul da França, tendência que se repete na Itália e em Portugal.
Os vinhos de syrah têm como grande trunfo o poder de seduzir os consumidores com uma intensa sensação de fruta madura, bom volume de boca e taninos agradáveis. Os syrahs franceses, por virem de uma região não muito quente, têm mais acidez e são considerados mais elegantes; os australianos, de clima mais quente, são mais encorpados e dão ênfase à fruta.
Na América do Sul, estão surgindo vinhos dessa uva no Chile, na Argentina e no Brasil. No Chile, há dez anos, só havia cerca de 20 hectares plantados. Atualmente há quase 3 mil hectares. Durante os primeiros anos de plantio, admitia-se que o syrah só daria bons resultados em zonas quentes, como Aconcagua, Maipo e Colchagua. O vinho tem um estilo australiano clássico, ou seja, bastante fruta madura e doce (lembrando geléia), encorpado, algo como os vinhos do sul da Austrália (Barrosa). No Chile, em Apalta, subzona de Colchagua, a cepa cultivada em encostas de quase 45º de inclinação deu origem a syrahs chilenos de extrema potência e concentração.
Mesmo na Austrália, há pelo menos 10 anos, se procurava um novo modelo de shiraz, o que o levou a regiões frias, como Margaret River ou Eden Valley. Os australianos, assim como os franceses do Rhône, concluíram que a syrah era uma uva de ótima adaptabilidade, inclusive em climas com brisas frias. No final dos anos 90, ela foi plantada no Chile, em locais próximos ao Oceano Pacífico e sob a influência de brisas marítimas frescas (Casablanca e San Antonio). Surgiram, então, syrah chilenos premiados pela crítica e pelos próprios consumidores. Na Argentina, em Mendoza, nos solos quentes de pedregulhos em Barrancas, obtém-se syrahs clássicos de clima quente. Já os que vêm do Valle de Uco mostram todo seu frescor, moderado pelas brisas frias dos Andes. Na região de San Juan, onde o clima é bastante quente, têm-se outros exemplos de interessantes syrahs. No Brasil, há syrahs de climas quentes produzidos no Vale do São Francisco, onde a uva se adaptou bem. Também começam a aparecer alguns de clima frio, como os vindos de uvas cultivadas na serra de Santa Catarina.
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Os syrahs de clima quente têm cor mais evoluída, são vinhos com aromas mais expressivos desde o início, com notas intensas de torrefação, tostado e defumado, misturados a frutas vermelhas maduras e doces. Esses vinhos têm alto teor alcoólico, revelando o sol intenso que amadureceu suas uvas. Os de clima frio são vinhos mais fechados no nariz, inicialmente, mas logo vão se abrindo, oferecendo diferentes tons aromáticos: floral (violeta), frutas vermelhas, notas de couro velho (animal), às vezes, grafite, que se misturam com tons sutis de carne (recordam toucinho ou carne-desol). Na boca, mostram corpo médio, taninos presentes e uma acidez aguda, que desperta as papilas gustativas.
• O "Errázuriz La Cumbre Syrah 2004" (Terroir, R$ 300) vem do vale de Aconcagua e é um dos grandes syrahs do Chile, apresentando aromas de frutas vermelhas maduras, especiarias doces e uma acidez presente, sem ser agressiva, equilibrada com taninos finos, o que dá uma sensação de suculência na boca.
• O "Matetic EQ Syrah 2004" (Casa do Porto, R$ 190) é feito com uvas plantadas no norte do vale de San Antonio. Vindo de clima frio, seduz, com nota de frutas vermelhas frescas, um leve mineral e acentuadas especiarias. Com uma acidez pulsante, lembra um belo Rhône.
• O "Callia Magna Syrah 2004" (Decanter, R$ 40,20) é um dos melhores syrahs da Argentina. Feito com uvas da região quente de San Juan, tem maturidade olfativa, taninos "doces" e incrível potência gustativa.
• "XIV Avaliação Nacional de Vinhos - Safra 2006" realizada simultaneamente em Bento Gonçalves (RS) e em São Paulo, dentre as 16 amostras selecionadas pelos degustadores, destacou-se o syrah de Villa Francioni, ainda não lançado no mercado. A amostra revela o potencial da serra catarinense para elaborar um bom syrah brasileiro de clima frio.