ADEGA preparou ainda um resumo com alguns dos melhores rótulos para investir nos últimos anos
Christian Burgos Publicado em 18/12/2021, às 08h00
Vinho pode ser um excelente investimento
Um bom investimento é aquele que, com o tempo, devolve mais do que o montante investido. Quanto maior o retorno, melhor o investimento. Sob qualquer ótica, o vinho de qualidade é um grande investimento, pois apresenta enormes retornos emocionais, sensoriais e até financeiros.
Em termos emocionais, compartilhar um bom vinho com amigos, família e pessoas amadas tem um valor impossível de quantificar. Outro aspecto nos bons vinhos refere-se à sua evolução e ao fato de que tomaremos, no futuro, um vinho melhor do que o mesmo vinho na data que o compramos.
Estes são, na nossa opinião, os retornos mais importantes e reconhecidos por nossos leitores ao investir em uma garrafa de vinho.
Mas recebemos vários contatos de leitores querendo saber se uma garrafa (ou quais garrafas) se valorizará economicamente com o tempo a ponto de se constituir numa reserva de valor e investimento financeiro. E até neste contexto, grandes vinhos podem ser um excelente investimento. Mas quais vinhos e em que condições?
Você certamente já viu preços astronômicos pagos por determinados vinhos, como a garrafa de Domaine de La Romanée-Conti 1945 arrematada por 558 mil dólares em um leilão da Christie’s recentemente. Além da raridade, contribuíram para isso, o enorme prestígio do vinho, a qualidade da safra de 1945, além do contexto histórico do fim da II Guerra Mundial.
Degustações en primeur estão ocorrendo em diversos locais do mundo
Não precisamos ir a estes extremos para reconhecer que o vinho como investimento se encontra na interseção do metal precioso com uma obra de arte. Existe até uma plataforma de informações, chamada Liv-ex, que acompanha a valorização (ou desvalorização) do preço de vinhos pelo mundo, uma espécie de Bloomberg dos grandes rótulos.
Para investir, o momento de maior atividade de compra se dá no “en primeur” de Bordeaux, quando vinhos que ainda serão lançados são degustados, comprados e vendidos pelos “négociants” em Bordeaux.
A cada ano, entre março e abril, são comercializados os vinhos da safra do ano anterior, e que serão entregues apenas dois anos depois. Assim em 2021, aconteceu o en primeur dos vinhos da safra de 2020, que serão efetivamente entregues aos compradores em 2022.
Para quem quer saber mais sobre o que é o sistema en primeur, clique aqui e veja nosso material completo.
Para decidir se você continua interessado, narro minha própria experiência como comprador de en primeur aqui no Brasil. No ano passado, dadas as incertezas da crise do Covid-19, vi que os preços históricos estavam muito baixos e fiz alguns investimentos. Comprei vinhos “normais” apenas para consumo futuro e outros para consumo ou investimento. Estudei as pontuações dadas por grandes críticos que degustam os vinhos ainda não prontos. Também analisei a safra 2019 em Bordeaux frente a outras safras, e de que regiões sairiam os melhores vinhos pensando em seu potencial de evolução e minha preferência pessoal.
Dessa forma, como compra para tomar belos vinhos sem pagar seu preço no futuro aponto como exemplo:
E para investir elegi alguns vinhos, entre eles:
Valorização da safra 2019 do ano passado até este ano: 53% acima do valor de lançamento.
Valor de lançamento de 2020: 27% mais caro que 2019.
Valorização da safra 2019 do ano passado até este ano: 82% acima do valor de lançamento.
Valor de lançamento de 2020: 28% mais caro que 2019.
Para mim este vinho era claramente a melhor compra do ano, pois estava com o preço excessivamente baixo para sua pontuação e seu histórico.
Estamos próximos da abertura das vendas no Brasil dos vinhos comprados por importadores no en primeur da safra 2020 de Bordeaux. Para escrever este artigo (e também decidir por minhas compras deste ano), consultei longamente Caroline Falk e André Zangerolamo, respectivamente gerente de produto e head sommelier da importadora World Wine, a principal importadora de vinhos en primeur no Brasil. Ambos foram muito generosos em compartilhar suas estratégias de análises e compras conosco.
O ano de 2020 marcou o mundo com a pandemia, não foi diferente no mercado en primeur
O ano de 2020 foi bastante ativo para vinhos de alto valor agregado no Brasil e inclusive para a venda do en primeur 2019. A safra 2020, como 2019, foi uma safra com produção moderada, e será seguida por uma com produção comprometida por questões climáticas em 2021. O ano de 2020 foi quente e as regiões com maior capacidade de retenção de água foram beneficiadas. Por isso, em Bordeaux, a Margem Direita desempenhou melhor que a Esquerda. Assim Saint-Émilion brilha em 2020. A campanha da safra 2020 veio com valor superior à de 2019, mas ainda abaixo historicamente, sobretudo se comparada aos preços recordes da safra 2018.
A safra 2020 se lançou com preço 5% acima do ano anterior e, ao final da campanha, já estava 30% acima do ano anterior. As condições climáticas que comprometeram a produção de 2021 devem gerar escassez e já colocam pressão de preços da campanha de 2020. Também devem ajudar a valorizar os vinhos dos anos anteriores.
Existem diversas outras formas de você fazer compras que carreguem as características de bons investimentos, como vinhos muito bem avaliados, de pequena produção e pequena alocação para o mundo, e especialmente para o Brasil. Para isso, o acesso aos importadores é fundamental, como acontece ao degustarmos antes e solicitarmos uma alocação de garrafas especialmente para nosso clube.
Participar deste mercado exige uma história de relacionamento com os négociants de Bordeaux. Sobretudo nos grandes vinhos e nas safras com menor produção, pois os negociantes sempre oferecem e privilegiam compradores com um histórico de relacionamento, e sobretudo os compradores do ano anterior, na chamada allocation (ou quantidade dedicada a cada comprador).
Com a pandemia fechando fronteiras, o procedimento de críticos e importadores irem a Bordeaux para avaliar os vinhos ficou impossibilitado e contribuiu para uma grande incerteza. Dessa forma, os primeiros lançamentos foram precificados bem abaixo de seus patamares históricos. Pontet-Canet foi um dos primeiros a serem lançados, com um posicionamento de preço muito baixo para a qualidade e fama desse produtor. Quem teve a coragem de comprar naquele momento fez um dos melhores investimentos do ano.
Château Pontesac é um dos destaques do ano
A safra 2019 foi muito fora da curva e veio após uma safra muito boa e muito cara, que foi 2018, algo que por si só já gera alguma desvalorização por receio de que grandes consumidores estejam sobre-estocados após uma safra especial. Alguns vinhos foram vendidos em 2019 pela metade do preço de 2018.
Agora no en primeur da safra 2020 houve uma revalorização média de 14% em relação ao valor de partida de 2019. Alguns vinhos, especialmente os Premier Grand Cru Classés se valorizaram ainda mais. O Château Margaux valorizou 31%; e Château Haut-Brion e Château Mouton-Rothschild foram lançados 53% acima do valor do ano anterior. Ainda assim se apresentaram como boas oportunidades, pois tendem a continuar se valorizando com o tempo, além de ainda terem sido lançados em patamares inferiores a safras como 2015 e 2016, que servem como benchmark, e tiveram pontuação inferior a 2020.
Os anos de 2015 e 2016 são reconhecidos como safras quentes e muito boas, embora não históricas como 2000 e 2010. Elas servem como referência para 2020, sobretudo como benchmark para vinhos da melhor margem de cada ano. Vale apontar que 2016 foi melhor na Margem Esquerda e 2015 melhor na Margem Direita.
Os vinhos de 2020 têm um perfil com mais estrutura de boca e menos álcool. O Château Lafite 2020, por exemplo, foi lançado com graduação de 12,8%. Já 2018 é uma safra muito bem avaliada pelos críticos, mas possivelmente não tem o mesmo potencial de longevidade de 2019. O ano de 2020 não tem o mesmo potencial de guarda de 2019, mas tem um estilo mais clássico e sutil. Para 2020, a comparação escolhida pela World Wine foi 2016, que já conta com um horizonte temporal que permite analisar sua curva de valorização, e que, em seu lançamen to, estava num mercado crescente que culminou com o recorde de preços de 2018.
Vinhedos do Château Montrose
Já em 2019 foi melhor para a Margem Esquerda, e 2020 foi melhor para Saint-Émilion e Pomerol. A campanha durou dois meses, sendo que o primeiro vinho de Saint-Émilion foi lançado em 4 de maio de 2020, o Grand Cru Bellefont-Bellcier, que apesar da pontuação importante, chegou sem aumento. Uma semana depois, no dia 11, o Château Cheval Blanc chegou com 3% de aumento em relação ao ano anterior. A partir daí muitos dos melhores foram lançados no final da campanha com aumentos superiores a 30%. Esse mesmo comportamento aconteceu em 2016.
O Château Lafite Rothschild 2020 (96-98 pontos Robert Parker) foi lançado no dia 11 de junho com 20% de aumento com relação ao en primeur da safra 2019. Já seria um aumento considerável, inclusive acima de 2015 e 2016, mas ainda 40% abaixo da safra 2010. Duas semanas após o lançamento, os mesmos négociants já estavam ofertando este vinho 16% mais caro, e hoje, três meses depois, na Liv-ex, já está 30% mais caro que no lançamento. Outro dado interessante é verificar a valorização da safra 2016 que até este momento é de 80%.
Os négociants já esperavam um aumento em torno de 20% na safra 2020 por conta da ruptura de 25% da produção, que afetou sobretudo a Margem Direita e seus Cabernet Sauvignon. Some-se a isso a esperada quebra da safra de 2021 e muitos Châteaux, neste ano, disponibilizaram para os négociants um volume 40% menor do que o ano passado. Sendo assim, mesmo quem teve prioridade por ter comprado no ano anterior, não conseguiu repetir a compra com facilidade.
Para os importadores, a campanha é uma corrida em tempo real. Afinal, os vinhos não são lançados todos ao mesmo tempo e muito menos organizados em grupos comparativos de reputação, classificação ou região. Inclusive, nenhum négociant oferece uma lista comparável aos demais em sortimento e quantidade disponível de cada vinho. É comum comprar o mesmo vinho de diversos négociants para chegar à quantidade desejada de garrafas, sendo algumas vezes impossível atingir o volume almejado.
O foco está na Margem Direita, sobretudo nos principais rótulos de Saint-Émilion. Todos subiram significativamente em relação ao ano anterior, e ainda devem ter boa valorização.
Também foram bem as áreas mais argilosas do Pomerol:
Em Pauillac, os Grand Cru Classés foram bem superiores aos demais.
Em Margaux:
Na Margem esquerda vale olhar Saint-Julien:
Em Saint-Estèphe:
Em Pessac-Léognan chamou atenção:
Para que gosta de vinhos de sobremesa:
O ano de 2020 foi muito quente e o amadurecimento de taninos foi a grande questão desta safra. Alguns críticos comentam para tomar cuidado com os Second Vins, já que naturalmente, após as melhores uvas serem usadas nos primeiros rótulos, as demais vão para os segundos e terceiros. Em safras desafiadoras, isso coloca uma pressão adicional na qualidade destes últimos, mas há boas oportunidades para quem fizer uma análise criteriosa.
Entre os bons segundos estão Le Petit Ducru e, de Saint-Julien, o Clos du Marquis estão com uma relação qualidade-preço muito boa. Em Saint-Julien, o Clos du Marquis tem 93-95 pontos Parker a 123 Euros.
É uma grande oportunidade de comprar um vinho que estará bem mais caro quando ocorrer seu lançamento oficial em dois ou três anos, inclusive comparando com o descaminho. É instrutivo e prazeroso poder abrir uma garrafa do mesmo vinho de tempos em tempos e acompanhar sua evolução. No en primeur, você consegue comprar seis garrafas (1 caixa), visto que os melhores vinhos chegam em quantidade tão limitada que a venda costuma ser restrita por pessoa.
Para quem coleciona, saber que as garrafas ficaram na vinícola e de lá vieram direto a você é uma segurança de qualidade de armazenamento nesta rota do vinho até sua adega. Há ainda a questão da exclusividade em garantir um vinho disputado e difícil de comprar no futuro. Da minha parte, estou feliz por tomar meus Pontet-Canets 2019 por um preço muito mais barato do que se deixasse para comprá-lo no futuro, ou ainda, em saber que, se optar por vender meia caixa, poderei tomar a outra metade da caixa de graça.
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