Uma das mais antigas tradições da vitivinicultura mundial sobrevive até hoje não apenas como brincadeira dos festivais das colheitas
André De Fraia Publicado em 24/04/2021, às 18h00
Por que a pisa a pé em lagares de pedra continua sendo usada?
Sim, a pisa a pé, uma das primeiras maneiras que o ser humano encontrou para prensar as uvas para fazer vinho, ainda é tida como uma das formas de realizar a prensa. Mais: é o método de maceração preferido por alguns produtores.
É interessante pensar no porquê de ela ter sobrevivido, já que as técnicas e tecnologias para prensar e macerar as uvas evoluíram muito rapidamente.
Em pouco tempo, o homem criou maneiras de prensar a uva com o uso de ferramentas e máquinas, fazendo com que o processo fosse muito mais veloz e menos cansativo. Há prensas de vinho quase tão antigas quanto lagares de pisa.
Então, por que a pisa a pé em lagares de pedra continua sendo usada? Seria apenas por tradição? Seria por marketing?
Produtores centenários da região do Douro, por exemplo, até hoje não abrem mão da pisa a pé para seus Vinhos do Porto. Segundo eles, nenhum outro método se mostrou tão eficaz para a produção desses vinhos singulares.
A pisa a pé faz sentido na produção dos Portos. Eles são vinhos que ficam pouco tempo em contato com as cascas para extração de aromas, sabores e cor, e ainda assim são extremamente densos.
A pisa é o método ideal porque o pé humano, ao prensar a uva contra o chão, libera mais cor das cascas e também outros componentes de aroma e sabor se comparado com outras formas de prensagem por máquinas.
“Esta técnica está intimamente ligada à fermentação em lagar e tem a sua história, em Portugal, na produção de vinhos tintos do Douro (fortificados e tranquilos). Acredito que o fundamento para a sua utilização seja a rápida, total e suave extração de todos os componentes da uva. ”, conta o enólogo Rui Cunha, da Secret Spot Wines.
A diferença principal da pisa a pé para as maquinas é que a maioria das prensas mecânicas tende a romper as sementes de uva, potencialmente liberando elementos amargos, muitas vezes indesejáveis. Já o pé humano, não importa o quão forte alguém pise na uva, é incapaz de romper uma semente.
Muitos veem a pisa como um processo pouco higiênico, mas vale lembrar que muitos dos possíveis patógenos humanos que poderiam estar presentes não sobrevivem no vinho.
No entanto, um dos fatores para que a pisa tenha sido substituída com o tempo é o seu processo lento e custoso.
Não é fácil e muito menos barato manter um grupo de pessoas pisando uvas por várias horas. Não à toa, muitos produtores de Vinho do Porto – que não querem abrir mão da tradição, mas também sabem que não podem ficar arcando com seus custos eternamente – têm buscado mecanizar a pisa a pé, criando robôs que simulam os movimentos e a pressão exercida pelos pés e pernas humanos.
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