O que comer e beber nesta região da Itália que inclui Florença, Pisa, Siena
Por Arnaldo Grizzo e Vanessa Sobral Publicado em 03/01/2019, às 20h00 - Atualizado em 26/07/2019, às 15h49
Fim de tarde. Os tons dourados do sol do verão europeu velam as montanhas recobertas de verdes vinhas e oliveiras. O entardecer revela novas cores no horizonte poente – uma versão ocre, vinda da mistura entre o sol e terra, encantadora. Com vagar, em um adeus pesaroso, a luz do dia vai se recolhendo em meio aos montes. Taça de vinho à mão. O pensamento voando – tão longe quanto as vilas medievais que se escondem nos cumes ao redor. Cada instante e cada gole é um momento de deleite.
Estar na Toscana é desfrutar. Ao mesmo tempo em que se pode contemplar os belos recortes dos Apeninos que ocultam cidades, castelos e outras tantas construções “sobreviventes” da Idade Média, observa-se ainda o ápice da cultura renascentista florentina, tudo isso tendo em mãos o melhor da culinária regional e também dos seus clássicos vinhos.
Quando se trata da Toscana, porém, estamos falando de um região bastante ampla. Não é só aquela área entre Firenze (Florença) e Siena. Ela se estende ainda por Pisa, Arezzo, Luca, Grosseto etc, somando mais de 280 comunas. Ou seja, cada canto tem sua particularidade, suas belezas, suas delícias. No entanto, é possível vivenciar uma “típica experiência toscana” em poucos dias, em um roteiro repleto de opções culturais e enogastronômicas – e também românticas.
Ao pensarmos na Toscana, provavelmente a primeira cidade que nos vêm à mente é Firenze, berço do Renascimento, por onde passaram mestres como Leonardo da Vinci, Sandro Botticelli, Michelangelo, Rafael, Donatello, Giotto, boa parte deles patrocinada pela família Médici, uma das mais influentes da Europa durante séculos a fio. Conhecer esse templo da cultura renascentista é imprescindível.
A maior cidade da região também é a que mais e melhores opções de acomodação oferece (especialmente por abrigar as principais redes hoteleiras mundiais), além de ser um ótimo ponto de partida para os seus roteiros nos arredores. No entanto, para quem quer viver uma experiência mais ao estilo “Sob o sol da Toscana”, vale a pena investir em alguns dos diversos hotéis, pousadas, casas de campo etc fora de Firenze e outras grandes cidades.
Para isso, há vinícolas que oferecem estadia em pequenas e charmosas pousadas, como as sugeridas pela Fontodi, ou então hotéis de alto padrão, como o caso da Il Borro, perto de Arezzo, e do Relais da Borgo Scopeto, próximo a Siena.
Ao visitar a Toscana, é preciso conhecer Firenze, o grande templo da cultura do Renascimento
Uma dica para quem quer ficar perto de Firenze (menos de 20 quilômetros) são os hotéis Villa Il Poggiale e Villa I Barronci, que ficam muito próximos um do outro em San Casciano in Val di Pesa, cidade conhecida por ter abrigado Nicolau Maquiavel em seu exílio, época em que ele escreveu sua obra mais famosa, O Príncipe. O local também foi escolhido pela poderosa família Antinori para construir sua mais nova vinícola, a Antinori nel Chianti Classico, encravada na montanha.
Ambas as Villas são aconchegantes e possuem vistas maravilhosas dos vinhedos e dos olivais nas montanhas ao redor de Firenze, dentro da região de Chianti. É possível aproveitar o esplendoroso pôr do sol nos parapeitos ou nas piscinas incrustadas na colina.
Barronci tem estilo mais moderno e restaurante a la carte com ótimo serviço. Vale a pena pedir a tradicionalíssima bisteca fiorentina se estiver em grupo – não há porções individuais –, ou o “simples”, porém saboroso, espaguete com trufas (negras ou brancas). A carta de vinhos, bastante respeitável, conta obviamente com os maiores clássicos da Itália, especialmente os toscanos e, melhor, com pouca diferença para o preço “de loja”.
Já Poggiale é uma “dimora storica” (casa histórica) da época renascentista e, todas as noites, seu restaurante serve um jantar frugal com diversas especialidades toscanas, desde pães, queijos e frios, até massas e outros preparados que variam conforme a estação e os dias (tudo por menos de 30 euros por pessoa). A carta é mais modesta, mas traz alguns dos principais clássicos locais. Vale dizer que os quartos maiores têm mini-cozinhas.
No entanto, caso prefira fazer suas refeições fora dos hotéis, próximo dali, em Cerbaia in Val di Pesa, há um restaurante estrelado, o La Tenda Rossa, de ambiente intimista e familiar, com pouquíssimas mesas, mas com refeições de alto padrão. Outra boa opção é o Rinuccio 1180. Aberto apenas para almoço, o restaurante “no teto” da Antinori é uma ótima pedida, de uma visita à vinícola. O cardápio tem uma harmoniosa mistura de bistrô com cantina italiana, excelente para combinar a ampla gama de vinhos do produtor.
Antes de iniciarmos as indicações de roteiros de um dia partindo de Firenze (ou de San Casciano in Val di Pesa), seguem algumas dicas. Primeiramente, é muito interessante alugar um carro para poder se locomover pela ampla região da Toscana. Aliás, se estiver inspirado, uma excelente experiência (com vistas deslumbrantes) é chegar à Itália (por Roma, Milão ou qualquer outra cidade) e dirigir até Firenze passando pelas estradas, muito bem conservadas, que cortam os Apeninos.
Alugue um carro, percorra as estradas da região e aprecie as incríveis paisagens
É importante ainda alugar um GPS ou, melhor ainda, adquirir um chip de celular com acesso à internet (é possível comprar por menos de 30 euros) para poder traçar suas rotas com comodidade. Para começar, vamos limitar um pouco o território. Sendo assim, desta vez não daremos tanta relevância à região de Chianti (que serátema central em outra edição) e Siena. E acredite, mesmo com o pesar de as deixar de lado, podemos nos deliciar com tantas outras atrações tão imperdíveis quanto.
Entre as primeiras “missões” de qualquer turista que visita a Toscana, obviamente, tem que estar Firenze. Para apreciar a beleza de seus prédios históricos ladeados pelo rio Arno, um dos pontos de partida pode ser o belvedere da Piazzale Michelangelo, com uma réplica de seu famoso David em bronze (o original, em mármore, está na Galleria dell’Accademia). De lá, pode-se avistar todo o centro da cidade com as montanhas ao fundo.
Um pouco abaixo está o Arno e, sobre suas águas amareladas, a histórica Ponte Vecchio, construída no século XIV, repleta de lojas, especialmente joalherias e ourives, consagrada na ária “O mio babbino caro”, de Puccini. Logo ao lado da ponte está a imperdível Galleria degli Uffizi, que abriga algumas das principais obras do Renascimento.
Além obviamente de clássicos de Da Vinci, Botticelli, Rafael, Michelangelo etc, osenófilos certamente vão gostar de ver as diversas esculturas de Baco, além da famosa pintura do deus do vinho feita por Caravaggio ou do Baccanale de Peter Paul Rubens.
Uma dica importante para quem quer visitar a galeria: compre os ingressos com antecedência. As filas são enormes e demoradas – há um controle do número de pessoas que ingressam. Se não conseguir comprar antes, a melhor saída é ir até uma bilheteria externa que vende ingressos de entrada com hora marcada. Assim você pode aproveitar um pouco mais da cidade e não apenas ficar plantado aguardando para entrar.
Em duas horas de visita, é possível admirar boa parte das obras com calma. Então, se possível, programe sua ida para a parte da manhã. Saindo de lá, na Piazza della Signoria, fica o Palazzo Vecchio (prefeitura), rodeado de magníficas esculturas, entre elas, a fonte de Netuno.
Caminhando reto pela Via dei Calzaiuoli chega-se à Piazza del Duomo, onde está a Catedral de Santa Maria del Fiori, com seu magnífico domo pintado internamente com uma versão do Juízo Final. Logo em frente está o Batistério de São João, com suas famosas portas de bronze esculpidas com motivos religiosos, e o Campanário de Giotto, de onde é possível ter uma linda vista depois de subir mais de 400 degraus.
E, para finalizar o dia, aproveitando a vista das margens do Arno, vale a pena tomar uma taça de vinho (ou talvez um spritz) no restaurante SE·STO, no sexto andar do hotel The Westin Excelsior.
De Firenze a Montalcino são cerca de 100 quilômetros de distância, mas, é outro passeio imperdível. Então, programe-se. Acorde cedo, pegue o carro e siga pelos caminhos que levam até a terra do Brunello. Obviamente, agende com antecedência visitas a vinícolas. Para os enófilos que curtem história, passar pela histórica Tenuta Il Greppo é imprescindível, pois foi a família Biondi Santi a criadora do conceito dos vinhos Brunello di Montalcino em meados do século XIX.
A vinícola, que até hoje serve de casa para os herdeiros, é muito simples e tradicional, como a maioria dos produtores de Brunello. Lá é possível provar e comprar vinhos de safras antigas. O local fica muito próximo da cidade de Montalcino – que vale a visita por sua bela fortaleza pentagonal. Outro bom motivo para parar alguns instantes na pequena vila medieval é a possibilidade de comprar vinhos top italianos por ótimo preço (melhor do que nas vinícolas e nas grandes cidades). Uma opção é a Enoteca di Piazza, na Piazza Garibaldi, que tem verticais incríveis de rótulos clássicos, não somente Brunellos.
Em Montalcino, é possível visitar produtores históricos, como Biondi Santi
Um pouco mais adiante na mesma estrada (della Badia di Sant’Antimo) da Biondi Santi, está a Fattoria dei Barbi, outro produtor histórico. Lá, além de provar seus Rossos e Brunellos, você ainda pode fazer uma refeição simples e saborosa na Taverna da família. Ambas as vinícolas ficam a menos de 5 quilômetros ao sul da cidade. Para quem quiser se aventurar um pouco mais distante (quase 20 quilômetros ao sul de Montalcino), pode optar por visitar o tradicionalíssimo Castello Banfi. A imponente propriedade comporta um museu, uma taverna e um confortável hotel.
No entanto, na hora da fome, se você estiver mesmo interessado na gastronomia regional, siga rumo à Pienza, uma das terras tradicionais do Pecorino, que fica há menos de meia hora de carro de Montalcino. Aliás, o trajeto entre essas duas cidades é deslumbrante, com paisagens encantadoras de plantações sobre as suaves colinas que se sucedem no Val d’Orcia.
Em Pienza, além das inúmeras queijarias e salumerias (outras especialidades são a carne de porco, “maiale” como dizem os italianos, e de javali, “cinghiale”) – que dá o tom aromático da principal rua do centro histórico –, há diversas lojas de artesanato local e restaurantes típicos e sem muito requinte, mas que oferecem os famosos pratos de leitão, como o Maialino da latte arrosto, por exemplo. Opções são o La Buca delle Fate e a Trattoria Latti di Luna.
As cidades de Pienza e San Gimignano também devem fazer parte do roteiro
Montalcino e Pienza são vilas minúsculas, cujos passeios podem ser feitos rapidamente caminhando. Compre uns vinhos, queijos e embutidos e desfrute deles aproveitando a vista.
San Gimignano é famosa pelas torres medievais e pelo sorvete
Há cerca de 50 quilômetros de Firenze está uma das mais belas cidades muradas medievais da Itália. San Gimignano é famosa pelas diversas torres que sobreviveram às guerras e também pelo sorvete. Isso mesmo, lá são feitos os melhores sorvetes do mundo (segundo os italianos, claro). Por tudo isso, vale a pena visitar essa charmosa vila, caminhar por suas ruas de pedra com um “cono” (casquinha) com uma bola de “fior di latte”(nata) comprado em alguma das sorveterias que disputam o título de “melhor do mundo” na Piazza della Cisterna, e depois subir em alguma de suas torres ou mesmo nos resquícios da muralha na parte mais alta da cidade para admirar a paisagem ao redor.
Uma sugestão para “casar” com esse passeio seria visitar uma vinícola em Chianti pela manhã. A Antinori, por exemplo, onde, logo após a visita pode-se desfrutar de um saboroso almoço e, logo em seguida, rumar para San Gimignano para passar a tarde e ver o pôr do sol. Outra seria passar a manhã na cidade das torres e depois ir a Pisa.
Vale dizer que, no verão, os estacionamentos em volta de San Gimignano costumam ficar lotados, então é preciso um pouco de paciência ou então aceitar parar um pouco mais distante e caminhar. Um detalhe: não se espante com as filas das gelaterias, elas são rapidíssimas. Para almoçar, você pode optar pelo simples e honesto Ristorante Perucà, de cozinha tradicional (carnes de caça e massas, óbvio, são as especialidades). E, se tiver sede, que tal uma taça de um fresco Vernaccia di San Gimignano?
La Tenda Rossa – San Casciano in Val di Pesa
Rinuccio 1180 – Bargino/San Casciano in Val d Pesa
SE·STO – Firenze
La Buca delle Fate – Pienza
Trattoria Latte di Luna – Pienza
Ristorante Perucà – San Gimignano
Galleria degli Uffizi – Firenze Em poucos dias, é possível desfrutar da Toscana em todos os seus aspectos, da linda paisagem, passando pela rica cultura até chegar à enogastronomia
Enoteca di Piazza - Montalcino
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