Quem são os novos agentes do vinho sul-americano? O que eles propõem?
Por Patricio Tapia Publicado em 11/01/2017, às 12h00
A 1.100 metros de altura, as Sierras de Bellavista são uma paisagem completamente diferente de qualquer outra no Vale Central do Chile. Montanhas repletas de pinheiros, lagos de águas cristalinas, a neve caindo no inverno, deixando tudo um branco impecável. Depois de ver essa paisagem, é estranho pensar que se trata do tradicional Vale de Colchagua, um dos berços do vinho no Chile.
Foi esse o lugar onde o enólogo Camilo Rahmer (Viña Tres Palacios) decidiu fazer vinhos. “Com minha família, estamos há muitos anos na região. De fato, temos uma casa lá. Desde que me lembro, sempre quis fazer um vinho daquele lugar”, disse Rahmer. Graças a uma sociedade com a família Ergas, dona de uma fazenda na região, Rahmer estreará logo com uma nova vinícola: Sierra de Bellavista, e com dois vinhos, um Pinot Noir e um Riesling, de vinhedos plantados ali. Ambos, com certeza, não têm nada a ver com o que até agora tinha sido feito em Colchagua. “O lugar, inclusive, é mais frio que as costas do Chile”, assinala Rahmer. E a radicalidade do clima se sente nesse primeiro Riesling Sierra de Bellavista, um branco corpulento, intenso em aromas minerais, firme e de grande estrutura. Se Paredones com seus brancos costeiros já havia transformado a ideia que se tinha de Colchagua, o Riesling de Rahmer muda-a novamente, dessa vez em 180 graus.
Do outro lado da Cordilheira dos Andes, em Mendoza, Sebastián Zuccardi assumiu o comando da famosa Bodega Zuccardi. Concentrou-se em vinhos de terroir, tintos que respeitam sua origem e que falam o mais claramente possível de si, mas também se focou em expandir as fronteiras da Malbec.
Sebastián Zuccardi produz um Malbec diferente de tudo o que foi feito até agora em Mendoza
Durante muito tempo, insistiu-se que a Malbec era uma cepa que necessitava do sol mendocino para alcançar sua correta maturação, uma madurez suculenta e doce que acentuava a suavidade da casta. Também se dizia que a única maneira de obter grandes Malbecs era maturá-los ao máximo, envelhecendo-os por longos meses em barricas novas. Todos esses paradigmas Zuccardi seguiu, mas também começou a questionar.
O caso mais exemplar é seu novo vinho Polígonos San Pablo, um Malbec que nasce a cerca de 1.400 metros acima do nível do mar, em Tunuyán, no Vale do Uco. Sobre solos calcários, Zuccardi obteve uma fruta deliciosa e fresca, com apenas 12,5% de álcool, produto de colheitas muito mais adiantadas, buscando uma maturação “distinta”, mais concentrada no frescor da fruta do que no dulçor. O vinho foi fermentado em cimento e maturado em barricas muito velhas por cerca de 10 meses.
O resultado é um Malbec completamente diferente de tudo o que foi feito até agora em Mendoza, ao menos nos círculos comerciais do vinho. Fresco, repleto de frutas vermelhas, intenso em sabores de especiarias e comandado por uma acidez que se move pela boca como um animal selvagem em uma jaula.
Estes são apenas dois exemplos do que está ocorrendo hoje na América do Sul, uma pequena revolução que está levando os produtores a experimentar por caminhos que nunca antes tinham andado: novas cepas, novos lugares, novas técnicas, mas também a revalorização do que antes tinham aprendido. Um momento excelente em que vivemos como enófilos, consumidores, jornalistas.
República de Chachingo
O projeto pessoal de Alejandro Vigil (Catena, Bodegas Aleanna) é uma pequena rede de loucuras, vinhos inéditos, completamente fora dos moldes, mas todos com um ponto em comum em seu grande frescor.
Zorzal
Os irmãos Michelini parecem atuar com completa liberdade quando se trata de fazer vinhos. Baseados na região de Gualtallary, em Mendoza, seus vinhos – especialmente os tintos – são preciosas fotografias do lugar e todos muito, mas muito fáceis de beber.
Bodega Polopuesto
O norte-americano Paul Andnes trabalha junto com Matías Michelini em Passionate Wines (outra vinícola das revolucionárias na Argentina), mas também tem seu pequeno projeto chamado Polopuesto, dois Malbecs feitos com o método de maceração carbônica. O resultado: tintos deliciosos em seu frescor, para beber aos litros.
Lucas Pfister – Bodega 40/40
Lucas Pfister, um jovem produtor de vinhos da região de Ugarteche, em Mendoza, propõe, com seu 40/40, um novo caminho para o Cabernet Sauvignon. Este tinto é uma delicadeza raras vezes vista do outro lado dos Andes, um suco delicioso e com aparência muito simples, que faz salivar. Uma pequena revolução no mundo do Cabernet sul-americano. Pura franqueza e pureza.
Pablo Morandé (acima) e Louis Antoine Luyt não têm medo de experimentar no Chile
De Martino
Comandada pelo enólogo Marcelo Retamal, esta vinícola de Maipo provocou um verdadeiro terremoto no panorama de vinhos chilenos. Suas técnicas de vinificação (vasos de cerâmica, foudres, nada de madeira nova) fizeram todos pensar, especialmente por seus vinhos, cheios de personalidade.
Bodegas Re
O projeto familiar de Pablo Morandé, um dos enólogos mais importantes do vinho moderno no Chile, é uma coleção de rótulos experimentais, cada um mais particular que o outro.
Louis Antoine Luyt
Pioneiro no resgate da cepa País no Chile, este francês inquieto e sempre experimentando, foi um visionário, mas também um enólogo de grande convicções e centrado em uma região como o Maule que, graças a ele, hoje tem um grande protagonismo.
Maitía
O francês David Marcel fez um par de vinhos para não se esquecer. Primeiro, Maitía, um tinto com base de Carignan, que é uma delícia de frescor. E, claro, Aupa, um “pipeño”, um tinto feito da uva País que se bebe perigosamente rápido. O vinho para competir com a cerveja.