Anos 60

De cima das colinas da Catalunha, Jean Leon mostra que o minimalismo também pode ser grande, influenciado nas curvas dos anos 60

por Carolina Almeida

Fotos: Divulgação

Na arquitetura, mais do que desenhar um projeto grandioso, para alcançar sucesso numa empreitada é preciso, antes de mais nada, conhecer o dono do lugar. Porque, se nada ali se parecer com ele, então o projeto, por mais majestoso que seja, não será completo. O que torna uma obra completa é sua “personificação”, é a projeção dela em seus donos. No mundo do vinho, o connoisseur Didú Russo, sempre bem-humorado, uma vez fez uma comparação semelhante: “Olhe o dono e tome o vinho. Se eles forem diferentes, desconfie”. Nas vinícolas e seus donos, então, podemos tomar emprestada a comparação.

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Seja no projeto arquitetônico, na maneira como foi construída ou nos ideais postos em prática, uma vinícola tem sempre a cara de seu dono. Então, para começar a falar da bodega Jean Leon, e de seu Centro de Visitas, é preciso contar a história de quem a idealizou.

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O criador
Jean Leon nasceu no norte da Espanha, com o nome de Ceferino Carrión. Logo pequeno, sofreu várias perdas: um incêndio na casa em que morava e, tempos depois, a morte do pai e do irmão mais velho. Sem dinheiro, aos 19 anos arrumou as malas e foi tentar a sorte viajando pelo mundo. Parou em Nova York e lá começou a trabalhar. O medo de ser pego como ilegal o fez alistar-se como voluntário no exército norte-americano, que lutaria na Guerra da Coreia. Anos mais tarde, então, conseguiu a nacionalidade norte-americana, e, a exemplo de muitos atores da época, mudou seu nome para Jean Leon.

O espaço do Centro de Visitas da Jean Leon está em cima de uma colina rodeada de vinhas e oferece uma visão panorâmica de toda a área da vinícola

Vivendo em Hollywood, Leon começou a trabalhar no restaurante de Frank Sinatra. Lá, conheceu diversos atores em início de carreira e, com um deles, James Dean, resolveu abrir seu próprio negócio. Por ironia do destino, Dean acabou morrendo antes de o projeto tomar forma, mas nem assim Leon desistiu de abri-lo. O lugar, La Scala, transformou-se num sucesso e era frequentado por estrelas como Marlon Brando e Marilyn Monroe, que, junto a outras tantas celebridades, faziam visitas assíduas ao restaurante e ao seu dono. Mesmo assim, cheio de amigos e sucesso, o espanhol sentia falta de algo.

Ele escolhia cuidadosamente os vinhos das refeições que fazia e, algumas vezes, não conseguia encontrar o par perfeito. Foi então que teve a ideia de começar a produzir um vinho seu, que fosse da maneira como ele imaginou que deveria ser o vinho perfeito. E partiu para procurar o local perfeito. Jean Leon escolheu cravar sua bodega em meio aos 27,5 mil hectares de vinhedos da DO de Penedès, na região autônoma da Catalunha.

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O arquiteto Domingo Triay se inspirou na arquitetura norteamericana dos anos 1960 para o projeto

Centro de visitas
A Bodega Jean Leon foi construída em 1964, no estilo dos châteaux de Bordeaux, e se mantém assim até hoje. Ela está rodeada de vinhedos próprios e sempre foi equipada com aparatos tecnológicos de última geração. Mas, a verdadeira obra de arte, Leon guardou para o final. Em 2002, a ousadia do espanhol fê-lo inaugurar seu Centro de Visitas – que contrasta com o visual clássico da bodega –, localizado no coração da propriedade e que lhe permitiu receber melhor seus amigos, visitantes e amantes do vinho, mais ou menos como costumava fazer em seu antigo restaurante. E, mais do que acolher os visitantes, o Centro tem atividades como jantares harmonizados, degustações especiais e palestras, sempre procurando novas formas de engrandecer o lugar.

Há 40 minutos de Barcelona, o espaço está em cima de uma colina rodeada de vinhas e oferece visão panorâmica de toda a área da vinícola. Sem (quase) nada ao redor, a impressão que se tem é de estar numa cena de filme, daqueles em que não há influência urbana e onde tudo é mais calmo e pacífico.

Para o projeto, moderno e minimalista, foi contratado o arquiteto Domingo Triay, responsável por outros desenhos notáveis de vinícolas, como a Aresta, no Napa Valley, por exemplo. Os dois projetos se assemelham em alguns pontos, como o visual arrojado, cheio de curvas, a estética clean e a iluminação e mobília também bastante limpas, que chamam a atenção exatamente pela ausência total do exagero.

Triay se inspirou na arquitetura norte-americana dos anos 1960, período em que Leon ainda morava nos Estados Unidos. Consciente da importância da natureza em todo o mundo do vinho, ele fez questão de integrar o edifício da forma mais natural possível à paisagem, aos vinhedos e às curvas do solo. Essa interferência quase mínima no ambiente foi um dos motivos pelos quais o Centro abusou do uso de vidros, que, além de não “pesarem”, também obedecem a um padrão de economia de energia, uma vez que a luz do sol pode ser aproveitada durante todo o dia e parte da tarde.

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