Descubra os segredos perdidos da vitivinicultura antiga: Provinnage, dolia e feno-grego revelados

A história esquecida da vitivinicultura antiga e os segredos ancestrais da produção de vinhos nos primórdios da civilização

Arnaldo Grizzo Publicado em 02/09/2024, às 11h00

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A vitivinicultura, ou seja, o cultivo da videira e a produção de vinho, é uma prática milenar que evoluiu significativamente ao longo dos séculos. Muitas das técnicas que eram usadas nos primórdios, continuam sendo feitas hoje, mas geralmente de maneiras diferentes.

Há diversos estudos em andamento sobre como a vinha era cultivada e como o vinho era elaborado, e a descoberta de vastas parcelas de terras agrícolas, muitas trabalhadas com fossos, fileiras e trincheiras, tem permitido uma melhor compreensão das técnicas empregadas na condução da videira durante a Antiguidade, especialmente em regiões da França e da Itália.

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Acredita-se que as técnicas de condução da videira variavam conforme as províncias do Império Romano. Entre os métodos identificados, encontravam-se vinhas rasteiras, vinhas baixas sem estacas, vinhas com estacas simples, com estacas e suportes horizontais ou múltiplos, vinhas conduzidas em árvores ou "hautains", e até mesmo vinhas em forma de taça (gobelet). No sul da Gália, percebe-se que as técnicas mais difundidas eram as vinhas rasteiras e aquelas conduzidas sobre árvores. 

Apesar das referências literárias de Columella (em "As Árvores") e Plínio, o Velho (em "História Natural"), não existem evidências arqueológicas que confirmem a condução da videira sobre árvores.

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No entanto, a videira rasteira era particularmente adequada para as regiões ventosas da Gália Narbonense (uma província do Império Romano localizada na região do Languedoc e Provence no sul da França), de acordo com esses autores antigos.

A disposição das fossas de plantio descobertas nessas áreas pode indicar tanto a condução baixa das vinhas quanto o uso de uma técnica chamada de provinage.

Provinage

Na Gália, as fossas de plantio apresentavam várias disposições: em linha, quadrada, ou em quinconce (canteiro em xadrez). A forma mais comum eram fossas isoladas conectadas por pequenas trincheiras para drenagem.

Já a técnica de provinage consistia em multiplicar uma planta enterrando alguns de seus ramos, que seriam separados da planta-mãe quando criassem raízes. Existem duas formas de realizar provinage: curvando um ramo e enterrando-o numa fossa próxima à planta-mãe, ou deitando a própria planta-mãe, enterrando-a e deixando apenas algumas hastes expostas ao ar.

Envelhecimento
Sotolon é uma molécula que se desenvolve durante o processo de vinificação. É responsável pelas notas de avelã e curry que, combinadas com outros aromas, caracterizam os Vin Jaune. As altas temperaturas no verão e o frio no inverno favorecem seu desenvolvimento. Após o engarrafamento, o sotolon continua a se formar. Esta molécula é encontrada em vinhos doces, Porto, Tokay e Jerez e, em concentrações muito elevadas, nos Vin Jaune. 

Esta vegetação ao redor de uma planta-mãe é conhecida como “vigne em foule”, ou algo como “vinha torcida". Essa técnica acabou sendo “descartada”, especialmente depois do ataque da filoxera no século XIX, substituída em grande parte pela enxertia. 

A vinificação na Antiguidade, particularmente na Gália Narbonense, envolvia várias etapas. Inicialmente, o esmagamento das uvas ocorria em uma cuba de chão betonado com um exutor (dispositivo de escoamento) de pedra ou chumbo. O suco resultante escoava para uma cuba revestida de concreto de tuileau (terracota), que possuía uma cavidade de drenagem. 

Após o esmagamento, os talos eram reunidos sob uma prensa. Grandes propriedades utilizavam prensas de alavanca e contrapeso. A tecnologia da prensa de rosca, conhecida na Itália desde o século I a.C., difundiu-se na Gália Narbonense apenas a partir do século II d.C.

O suco de prensa era então colocado para fermentar em grandes jarros, chamados dolia, enterrados em fossas cheias de areia ou terra e selados com pez (resina de pinheiro) fervente para esterilização.

As prensas

Nos primórdios o esmagamento das bagas (foulage) era feito com os pés e os trabalhadores pisoteavam as uvas ao som de flautas

 

O esmagamento das bagas (foulage) era feito com os pés. Os trabalhadores pisoteavam as uvas ao som de flautas, utilizando cordas para manter o equilíbrio. O suco escoava por uma canaleta para recipientes de madeira, jarros ou cubas.

A prensagem mecânica subsequente era realizada com prensas de dois tipos: a prensa de alavanca e contrapeso, e a prensa de rosca vertical, que surgiram no início do Império e evoluíram nos séculos II e III, aumentando a eficiência e a segurança para quem as utilizava. 

Os dolia, os grandes jarros de cerâmica, eram enterrados para facilitar o armazenamento e a conservação do vinho, evitando quebras e absorvendo as variações de temperatura. Esses recipientes, por serem porosos, necessitavam de uma camada anual de resina para vedação, o que conferia ao vinho um sabor característico de alcatrão ou fumo.

Estilo

Os romanos valorizavam vinhos brancos envelhecidos, esperando até 25 anos para consumir os mais prestigiados, como o vinho de Sorrento

Vale lembrar que os romanos preferiam beber vinhos brancos envelhecidos. Dizia-se que chegavam a esperar cinco anos para beber o vinho de Nomentum, 10 anos para o vinho de Sabina, cerca de 20 anos para o Falerno, e nada menos que 25 anos para o vinho de Sorrento.

Por isso, eles desenvolviam técnicas para dar aos vinhos jovens o sabor dos envelhecidos. Columella descreveu uma receita que incluía feno-grego (Trigonella foenum-graecum), cujo composto “sotolon” conferia um sabor envelhecido característico.

Essa técnica foi recriada em tempos modernos, demonstrando que a adição de feno-grego ao mosto de uvas brancas produzia um vinho semelhante ao Jerez ou ao Vin Jaune do Jura.

Como se percebe, as práticas vitivinícolas da Antiguidade, que influenciaram a produção moderna de vinho, já mostravam a adaptabilidade dos romanos para criar algo que refletisse o seu gosto. Hoje, muitas delas estão sendo estudadas e recriadas para entender o estilo dos vinhos de antigamente e como nossos ancestrais trabalhavam.

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