O famoso vinho grego teve sua origem alemã e a vinícola foi visitada por diversas celebridades, como o astronauta Neil Armstrong
Por Arnaldo Grizzo Publicado em 16/11/2022, às 16h00
Na década de 1850, um bávaro, represente de uma empresa que comercializava frutas, encantou-se por uma região montanhosa nos arredores da Patras, na Grécia.
Gustav Clauss decidiu então fixar-se na colina de Achaia, próxima à cidade, em 1854, onde construiu um complexo residencial, que mais tarde se tornaria uma vinícola, que recebeu o nome da colina acrescido ao seu sobrenome Achaia Clauss.
Há quem suporte que seu primeiro interesse na região era a produção de groselha. Mas em 1861, ele plantou os primeiros vinhedos, cerca de 6 hectares de terra, e também construiu seu “château”, um prédio com estilo de castelo medieval preservado até hoje. Clauss foi um empreendedor e um inovador na enologia grega.
Nos anos seguintes, ele criaria vinhos que marcariam a história da vitivinicultura da Grécia. O primeiro, feito em 1873, foi um tinto doce que teria sido batizado em homenagem à sua amada grega, Daphne, uma jovem de olhos negros (mavro) que faleceu precocemente. Ou então, com bem menos romance – Clauss foi casado com Thomaida Karpouni, com quem teve uma filha em 1860 –, ele teria apenas usado uma uva já conhecida, que havia sido transplantada das ilhas jônicas para a sua região, que tinha o nome de Mavrodafni, cujo significado é “louro negro”.
O “louro” estaria relacionado ao formato dos cachos que, de certa forma, lembrariam uma coroa de louros. Nascia assim o Mavrodaphne de Patras, o vinho doce mais popular da Grécia.
Mais tarde, em1899, Clauss teria criado o primeiro vinho branco seco da Grécia, o Demestica, com uvas da vilade Demestiha também em Achaia. Acredita-se ainda que Gustav Clauss é considerado o inventor do conceito de enoturismo na Grécia, quando recebeu a visita da imperatriz austro-húngara Isabel, em 1885, em cuja homenagem ele nomeou uma de suas caves: “adega imperial”
Em 1872, Theodor Harburger e Gustav Clauss, juntamente com os donos da Fels and Co., empresa que Clauss representava, fundaram a Achaia Wine Company, que foi gerida até 1881 por Emil Werl e posteriormente por Clauss. Na virada do século, a empresa se especializou na produção dos vinhos Mavrodaphne e Demestica.
Clauss morreu pouco antes da I Guerra Mundial (1914-1918), quando a vinícola foi confiscada pelo governo grego. Hoje, ela pertence a Nikos Karapanos.
Durante sua história, a vinícola recebeu visitantes ilustres como o compositor Franz Liszt, o dramaturgo Eugene O’Neill, o astronauta Neil Armstrong, a primeira ministra britânica Margaret Thatcher, entre outros.
Receita
Até hoje a vinícola mantém um foudre que conteve a primeira safra. Ele está marcado com o número 601, que denota a página em um caderno em que a receita original do Mavrodaphne foi feita. A vinícola teria ainda dois foudres contendo vinhos de 1882, além de uma impressionante coleção que remonta aos seus primeiros anos.
Existe uma denominação de origem Mavro-daphne de Patras que abarca a parte central da província de Patras e inclui áreas como Vrachnaiika, Dymi, Larrissos, Messatida, Paralia, Farres e Olenia.
O vinho, obrigatoriamente um tinto doce, obviamente deve conter a uva que dá o nome à denominação, mas também pode levar até 49% de Korinthiaki. O Mavrodaphne de Patras é fortificado, ou seja, é acrescentada aguardente vínica para interromper a fermentação. Os vinhos podem envelhecer em tanques de aço inoxidável ou de cimento, mas geralmente são envelhecidos em grandes e antigos barris de carvalho.
Os vinhos mais densos vêm de barris que não estão totalmente preenchidos para que possam ser gradualmente expostos ao oxigênio, criando aromas mais complexos. As perdas em volume, devidoà evaporação, são complementadas com vinhos das safras mais recentes, num sistema de solera.
A maioria dos vinhos no mercado, portanto, é de misturas de safras e eles devem envelhecer durante, pelo menos, um ano em barris de carvalho com capacidade máxima de 100 litros.
Para os vinhos Reserva, são necessários pelo menos dois anos no barril e um na garrafa. Para ser rotulado Vielle Reserve, os vinhos devem envelhecer por, pelo menos, cinco anos com ao menos dois no barril e dois na garrafa.
Já para o Grand Reserve são necessários sete anos, pelo menos três no barril e três na garrafa. Existe ainda uma denominação Mavrodafni de Kefaloniá, bastante similar, com a principal diferença sendo que os vinhos precisam ser varietais.
Por tudo isso, os vinhos costumam ser tão ricos, densos e fortes que se tornam muito longevos. A maioria pode envelhecer facilmente por mais de uma década, mas há exemplares em vinícolas com mais de cem anos de idade. Apesar de ter passado por momentos turbulentos desde os anos 1980, a vinícola de Gustav Clauss é considerada até hoje um dos bastiões do Mavrodaphne de Patras, o vinho grego com sotaque alemão.
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