A Associação Brasileira de Enologia premiou novamente a revista ADEGA com o Troféu Vitis
Silvia Mascella Rosa Publicado em 23/11/2023, às 08h00
No ano de 2007, a Revista ADEGA ainda não tinha completado dois anos de vida e eu fui apresentada ao Christian Burgos através de um amigo em comum, grande expoente do mundo do vinho no Brasil, Carlos Cabral. Christian tinha uma meta e uma proposta, e esse amigo achou que eu seria a pessoa que poderia auxiliar nessa demanda.
Numa reunião durante um longo almoço, Christian me disse que precisava de um jornalista de formação, que tivesse respeito pelo vinho brasileiro, nenhum preconceito e muita disposição para editar uma seção da revista chamada Terroir Brasil, além de degustar às cegas os vinhos nacionais.
Como jornalista e sommeliére eu achei que aquela proposta era boa demais para ser verdade. Aceitei e, durante sete anos, respondi pela seção. Orgulho-me de ter feito o trabalho que conectou o público com as vinícolas através de dezenas de artigos sobre todas as regiões do Brasil. Atravessamos grandes desafios, como as discussões sobre impostos, a salvaguarda, escândalos dentro da indústria, o grande preconceito com a produção nacional e, admito, provei muitos vinhos nem tão bons assim.
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No final de 2010 o cenário já havia começado a mudar um pouco e Christian me pediu um projeto para um guia apenas de vinhos brasileiros. Ele se tornou realidade em 2011, com as 66 primeiras vinícolas que decidiram enviar os vinhos para degustação. O editor Eduardo Milan, respeitado degustador, me conta que na edição de 2024 do guia são 101 vinícolas participantes, seguindo com mais de 900 vinhos degustados.
Em setembro de 2012 fui chamada para compor a mesa de comentaristas da 20a edição da Avaliação Nacional de Vinhos, organizada pela Associação Brasileira de Enologia. Estava tranquila, pois não era a primeira vez (eu tinha estado naquele palco em 2008) e para completar estava ao lado de um amigo, o enólogo Daniel dalla Valle. Quando o então presidente, Christian Bernardi, começou a anunciar o Troféu Vitis eu trocava umas palavras com Daniel. E ele me disse: "Olha, acho que é você". Eu olhei para os lados e pensei: impossível! Mas não era. Foi meu nome que chamaram. As pernas falharam, o olhar buscou o de meu marido no meio do público e me dirigi ao púlpito. Dizem que falei bonito, na verdade, não sei exatamente o que falei. Mas me lembro da sensação de enorme satisfação ao ser premiada por pessoas cujo trabalho eu admirava e acompanhava muito de perto.
Na última Avaliação Nacional de Vinhos, em sua 31a edição, quem subiu ao palco como comentarista foi Christian Burgos. Também estava tranquilo pois não era sua primeira vez lá. Mas essa seria especial, e ele também não sabia. Christian é um homem de negócios, mas sei que a paixão pelo vinho também passou a correr forte em suas veias. Transformou-se num degustador experiente, conheceu terroirs do Brasil e do mundo, foi fazer outra faculdade (de História desta vez) e vejo em suas demandas e seus trabalhos uma determinação de serem cada vez mais corretos e abrangentes. Eu entendo isso. Eu admiro isso. Eu aplaudo isso da mesma forma que fui aplaudida 11 anos atrás.
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Sabem o que o Christian me disse quando eu o cumprimentei? "Estou seguindo os seus passos" e eu retruquei: "Foi você quem pavimentou essa estrada para que pudéssemos trabalhar junto ao vinho brasileiro". Durante a Avaliação Nacional, Christian Burgos conta que foi tomado de surpresa, ficou emocionado e feliz, pois sabia que o Troféu Vitis era uma honraria para poucos, poucos mesmo. Foram apenas 30 troféus para enólogos e mais 30 para pessoas que trabalham com correção e verdade pelo vinho brasileiro.
Ao longo de todos esses anos, trabalhando com vinho na imprensa e em tantos outros projetos, não degustamos apenas os vinhos perfeitos, não ficamos amigos de todos ao longo do caminho, não fugimos das polêmicas e também não vendemos nossa liberdade por uma viagem ou uma caixa de vinhos (que nunca é de graça). Sabemos que o trabalho é árduo e não se resume aos elogios e aos prêmios. "O troféu é, na verdade, um símbolo pesado de que precisamos ser cada dia melhores", disse Christian Burgos.