Utilizados como conservantes, a adição de sulfitos é uma prática antiga no mundo do vinho e não são os vilões da dor de cabeça
Redação Publicado em 15/06/2022, às 12h30
Dióxido de enxofre. SO2. Anidrido sulfuroso. Ou, ainda, sulfitos, como são chamados os compostos que levam o íon de sulfato. Eles são tidos como os vilões do vinho e causadores das dores de cabeça. Mas se são tão ruins, para que servem os sulfitos no vinho?
Essa composição química de moléculas de enxofre e oxigênio ocorre naturalmente em diversos processos e está presente em quase todos os lugares, inclusive no corpo humano. Os sulfitos são muito usados na indústria de alimentos como conservantes, por sua ação antioxidante e bactericida. Há quem seja alérgico a esses compostos, daí a legislação de diversos países obrigar os fabricantes de produtos que levam S02 a estampar essa informação no rótulo. Os vinhos estão incluídos nessa categoria. Só produtos com menos de 10 miligramas por litro escapam dessa regra.
Um vinho não poderia ter menos de 10 mg/l de enxofre? Talvez sim, mas provavelmente não. Por quê? Um dos processos cujo resultado é a produção de sulfitos (entre outras coisas) é a fermentação. Justamente o processo primordial da produção de vinho tende a gerar mais SO2 do que isso. Mas não é nada alarmante. Acredita-se que hoje a maior parte dos vinhos tenha entre 50 e 200 mg/l de sulfitos, ou seja, há muito menos compostos do que numa fruta desidratada, por exemplo.
Sabe-se que a adição de enxofre ao vinho é uma prática muito antiga. Há quem acredite que ela é ancestral, pois há referências (um pouco vagas, é verdade) sobre isso em escritos de Plínio e Homero. Mas, acredita-se que o uso “formal” do dióxido de enxofre na vitivinicultura tenha ocorrido na Idade Média.
O primeiro documento “regulamentando” a utilização é de 1487, na Alemanha. Na época, encharcava-se um pedaço de madeira com enxofre em pó, ervas e incenso. Essa madeira
era queimada dentro da barrica que receberia o vinho. Isso protegia a bebida, evitando o escurecimento e retardando a deterioração. Com o tempo, obviamente, a técnica foi aprimorada e o uso se disseminou, assim como a regulação.
Na União Europeia, por exemplo, nenhum tinto pode passar de 160 mg/litro e nenhum branco de 260 mg/l. Há estudos que apontam que a dose mínima para proteger o mosto da oxidação seja de 15 mg/l de enxofre.
Apesar de ser difícil não utilizar o SO2 em alguma etapa da vinificação, há produtores cada vez mais dispostos a minimizar ou mesmo não acrescentar o composto em seus produtos. Para isso, são necessários níveis absurdos de higiene na vinícola, além de um monitoramento constante de todas as fases, para que o vinho não corra o risco de estragar. Qualquer mínimo problema pode colocar tudo a perder, por isso, são poucos os que se arriscam dessa forma. A maioria usa os sulfitos parcimoniosamente.
Uma pesquisa feita pela Master of Wine Sophie Parker-Thomson mostra que os sulfitos (SO₂) podem não ser os vilões da ressaca e dor de cabeça após beber um vinho.
Segundo ela a substância que teria maior potencial para causar problemas são as aminas biogênicas - compostos que têm maior probabilidade de causar dores de cabeça no vinho do que os sulfitos e são encontradas em níveis mais elevados em vinhos que não têm sulfito adicionado antes da fermentação.
Isso porque a parcela da população sensível às aminas biogênicas é muito maior do que a que tem sintomas adversos ao sulfito. O artigo de Sophie Parker-Thomson MW descobriu que vinhos com mais de 30 mg por litro de SO₂ adicionado antes da fermentação tinham níveis muito mais baixos de aminas biogênicas.
Assim, a presença de sulfitos nesses vinhos pode muito bem mitigar os efeitos negativos que um bebedor de vinho pode sentir ao consumir um vinho com níveis mais elevados das aminas biogênicas. Segundo Sophie Parker-Thomson MW, a pesquisa mostra que o argumento de que vinhos naturais, com pouca ou sem adição de SO₂, não causam dor de cabeça não é uma verdade.
Afinal os sulfitos não seriam os vilões como estão sendo pintados atualmente.