Conheça os estilos de Tokaj e saiba o que revelam os puttonyos em cada garrafa
por Sergio Inglez De Sousa (*)
Na época em que Cabral descobriu o Brasil, os vinhos de Tokaj apresentavam paladar seco, resultante da vinificação de uvas colhidas no estado normal de maturação. #R#
Consta que em 1630, um tal de Laczkó Máté Szepsi, abade particular da senhora Zsuzsanna Lorántffy, mulher do príncipe da Transilvânia, resolveu retardar a colheita na região com medo de um novo ataque dos turcos, que iriam, provavelmente, carregar todo seu vinho. Dessa maneira, deixou de colher as uvas nas datas habituais dos vinhedos das encostas do Oremus, em Sátoraljaújhely, fronteira com a República Eslovaca.
Os invasores não encontraram vinho para levar, muito menos tiveram uvas para comer, uma vez que elas mostravam- se apodrecidas nas videiras. Na verdade, as uvas apresentavam péssima aparência devido ao ataque do fungo Botritis cinerea, estavam botritizadas.
A vinificação desta colheita abriu caminho para os néctares húngaros. A partir de então o momento da vindima foi sendo paulatinamente atrasado e chegou-se às bagas concentradas de açúcar que resultaram nos vinhos Aszú (em húngaro, vinhos feitos de uvas botritizadas). Se na primeira experiência foi algo acidental, logo tornou-se prática corrente da região.
Os vinhos ganharam a fama. O abuso do emprego do nome de origem obrigou a oficialização, em seguidas regulamentações, de vinhedos, produção e produtores em 1641, 1655 e 1660. Coroando esses esforços, em 1700 foi estabelecido um sistema de produção de vinho Aszú que detalhava os sofisticados processamentos e cuidados envolvidos na elaboração dos Tokaji Aszú, apontando para a primeira delimitação dos vinhedos classificados em 1730, com status legal nacional e aperfeiçoamentos a partir de 1765.
A situação de Tokaj-Hegyalja sob o regime comunista assistiu a fusão das fazendas estatais, entre 1967 e 1974, resultando em uma organização estatal gigante, a Tokajihegyaljai Allami Gazdaság Borkombinát (Conglomerado Fazenda Estatal de Vinho), num total de 7.400 hectares de área cultivada. Neste período, a qualidade do Aszú decaiu para dar lugar à produção maciça de vinhos comuns para o mercado russo, pouco exigente. A privatização começou efetivamente em 1991. Houve também a união de produtores em torno da Tokaji Renaissance e a adoção de classificação dos vinhedos em grand crus. Atualmente são considerados 23 vinhedos notáveis de alta qualidade que produzem os distintos tipos de Tokaj.
Os vinhos Szamorodni resultam de uvas colhidas sem seleção, indistintamente maduras, supermaduras, desidratadas e botritizadas. As uvas são prensadas e permanecem em maceração por algum tempo. Depois são novamente prensadas. O mosto resultante é deixado para fermentação. O resultado pode revelar um vinho seco ou doce, dependendo da composição de uvas colhidas.
Os vinhos de colheita tardia não são comuns e a primeira iniciativa oficial ocorreu em 1995. De lá para cá, o número de produtores que colhem as uvas supermaduras, antes da botritização, vem aumentando.
Os Aszú Esszencia são vinhos superiores de uvas botritizadas, que são colocadas em um recipiente de aço inoxidável com o fundo perfurado. O peso dos cachos superpostos exerce pressão sobre a camada inferior, que libera um líquido grosso, o Essenczia, com até 250 gramas de açúcar por litro. Esta concentração de açúcar não se transforma totalmente em álcool porque a fermentação ocorre somente numa camada superficial. Ela pode prolongar-se por anos, raramente ultrapassando os 4% de álcool. Este é um produto especialíssimo com conteúdo de açúcar igual a 180 gramas/litro, suportando envelhecer por 50 anos ou mais.
Por sua vez, o Aszú é elaborado a partir da massa (sem o mosto do Essenczia) que, prensada, forma uma pasta concentrada, armazenada em cestas de 25 quilos (puttony) para futuramente ser colocada em barricas de 136 litros (gönc), juntamente com o vinho seco novo da safra seguinte. De acordo com o número de puttonyos adicionado em uma barrica obtém-se um nível de Aszú: 3 puttonyos / 60 gramas de açúcar por litro; 4 / 90; 5 / 120 e 6 /150.
O envelhecimento do Aszú tem uma regra de ouro que determina o amadurecimento em barricas pelo mesmo número de anos do que o dos puttonyos adicionados. Este tempo pode ser complementado por um período de dois anos a mais de madeira.
(*)Sergio Inglez de Sousa é colaborador de ADEGA e responsável pelo site www.todovinho.com.br