Como funciona a prova de xícara: método oficial de avaliação do café no Brasil

Como trabalham os provadores de café, que dão a palavra final sobre a classificação e a qualidade da bebida

Juliano Ribeiro* Publicado em 12/05/2010, às 05h59 - Atualizado em 07/08/2025, às 08h20

Conheça as etapas da prova de xícara, usada para classificar cafés no Brasil

 

Apesar da modernização dos equipamentos analíticos e das atuais metodologias de análise de resultados disponíveis, os compostos responsáveis pelo aroma e pelo sabor do café encontram-se apenas parcialmente identificados.

Não bastasse a complexidade de sua identificação e de suas propriedades como composto puro, há ainda que se compreender os efeitos das misturas deles, como ocorre no grão. Por essa razão, a determinação da qualidade do café conduzida por análises químicas ainda é limitada, e a palavra final sobre a classificação e qualidade da bebida ainda é dada pelos resultados da "prova de xícara".

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A primeira abordagem técnica sobre o sistema de prova de xícara foi introduzida em 1961. Nela foi estabelecida uma escala de valores para as bebidas (estritamente mole = 24 pontos; dura = 11 pontos; rio = 1 ponto). Essa escala foi importante para determinar a origem da bebida riada (mínimo de 10% de grãos rio misturados com padrões de bebida mole) e, finalmente, para quantificar a influência dos defeitos na bebida do café.

Em 1989, foi criada uma nova classificação da bebida do café arábica, estabelecendo a separação dos atributos sensoriais em classes daqueles responsáveis pelo gosto da bebida (ácido, azedo, amargo, doce e salgado); pelo sabor e aroma (químico/medicinal, caramelo, nozes, queimado/fumaça etc.) e pelas sensações bucais (adstringência e corpo).

Assim, as descrições da bebida obtida de cafés corresponderiam à da bebida "estritamente mole" como sendo uma de sabor e aroma suave e adocicada, encorpada, etc.; a "bebida mole", com as mesmas características, mas menos acentuadas; a bebida dura, com a predominância de um sabor/aroma metálico ou uma característica sensorial de adstringência e aspereza mais acentuadas; as bebidas "riada" e "rio" seriam aquelas com leve sabor de iodo e maior ou menor intensidade do gosto/sabor químico ou medicinal; e, por último, a bebida "rio zona" com características ainda mais acentuadas do que as da bebida "rio". Para os cafés robusta, a classificação por bebida ainda é extraoficial.

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O processo de avaliação sensorial do café segue etapas padronizadas

Escalas

Atualmente, de acordo com a portaria Nº 49 do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, de 25/03/2008, no Brasil, a prova de xícara deve ser realizada por classificadores (provadores) habilitados para analisar o produto e devidamente registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Esses profissionais avaliam o conjunto dos atributos sensoriais e físicos da amostra de café e atribuem o seu conceito sobre cada um deles. Para isso, usam uma escala linear que varia de equipe para equipe, mas, geralmente, vai de 1 a 5, 1 a 10 ou 1 a 100, em que 1 se refere a um café muito ruim e 5, 10 ou 100 representam cafés excelentes. Todo o processo das provas de xícara é regulamentado por portaria do Ministério da Agricultura e realizado por profissionais.

Procedimento

Antes de ser provado, o café deve ser torrado e moído. Em uma xícara ou tigela pequena, as amostras são preparadas por infusão de 10 gramas de pó em 100 ml de água mineral quente ao ponto da primeira fervura. A fragrância é sentida com café seco. Após misturar com uma pequena concha, o provador avalia o aroma da infusão. Depois disso, a espuma é retirada e o café é deixado a decantar.

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O processo de degustação é iniciado quando o pó estiver depositado no fundo da vasilha e a mistura estiver morna (aproximadamente 60°C). Com o auxílio da concha, o degustador sorve uma quantidade de líquido, que mantém na boca o tempo suficiente para sentir o sabor e memorizar todos os seus detalhes. Em seguida, esse líquido é expelido em um recipiente, chamado "cuspideira".

As provas de xícara são feitas com teste cego. Por esse motivo, o grupo de dois ou mais provadores deve apresentar um paladar apurado e calibrado, para poder distinguir com a mesma intensidade as diferenças entre as bebidas. Entre cada prova, os degustadores devem enxaguar a boca com quantidade suficiente de água para não prejudicar a percepção sensorial quando da análise da próxima amostra.

Na análise dos resultados, para cada uma das características sensoriais avaliadas, deve-se calcular a média aritmética e o desvio padrão entre os valores atribuídos por todos os classificadores. A distinção das categorias gourmet, superior ou tradicional é determinada em função do resultado obtido pela nota da qualidade global, a qual refletirá o resultado da maioria das características sensoriais avaliadas, podendo algumas das características desviar-se da categoria final atingida.

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Os provadores costumam ser empregados em indústrias de alimentos de um modo geral, no mercado do café e nas fábricas de perfume, chá, fumo e vinho. Nas indústrias de café, nas exportadoras e nas cooperativas, cabe normalmente a um ou alguns poucos provadores classificar a matéria-prima e definir a composição do blend e o grau de torra ideal para o mercado comprador.

*Juliano Ribeiro é doutor em química pela UNICAMP e especialista em café

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