Dupla poda permite MG surgir como expoente de vinho fino

Técnica inverte o período de colheita das uvas, e produtores mineiros esperam aproveitar a ProWine para difundir o trabalho feito recentemente no estado

Larissa Avilez Publicado em 03/10/2024, às 06h00

No stand de Minas Gerais, na ProWine 2024, estão sendo expostos 37 rótulos: 20 da Casa Geraldo, cinco da Estrada Real, seis da Vinícola Pioli e seis da Vinícola Barbara Heliodora - Larissa Avilez

Em 2024, de forma inédita, Minas Gerais participa da ProWine com um estande próprio do estado, montado em parceria com o Sebrae. Ao todo, são quase 40 rótulos expostos, elaborados por quatro produtores. A presença na feira e o desejo deles de mostrar os vinhos da região ao mercado se devem à técnica chamada de “dupla poda”.

Trata-se de um método no qual o ciclo produtivo da videira é invertido, para que ocorra no inverno, quando a amplitude térmica é maior — com dias quentes e noites frias — e há pouca chuva. Nesse sentido, o trabalho de Murillo de Albuquerque Regina, pesquisador da Epamig (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais), foi destacado de forma unânime.

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“A Estrada Real é a vinícola precursora na dupla poda no Sudeste, sobretudo no Sul de Minas Gerais. Colhemos a uva no inverno para podermos ter uma maturação fenólica plena, condições de vinhedo mais sadias e com menos chances de doenças fúngicas”, afirmou o sommelier Savio Garcia, em entrevista ao site da Revista ADEGA.

A idade do vinhedo mais antigo da Estrada Real — só 20 anos — exemplifica o quão recente é esse trabalho na região. Atualmente, as vinhas ficam em Três Corações e São Gonçalo do Sapucaí. Já a vinícola, no município de Caldas. A entrada no mercado ocorreu em 2007. Para a ProWine, trouxe três tintos (incluindo um premium), um branco e um espumante.

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Dentre os produtores presentes no estande, o mais antigo e com maior portfólio é a Casa Geraldo, de Andradas, no sul de Minas Gerais. “Estamos na quinta geração da família, mas começamos a produzir o nosso próprio vinho em 1969, com Geraldo Marcon. Em 2010, eu e meus irmãos assumimos a empresa”, disse o enólogo Carlos Geraldo Marcon.

Segundo ele, antigamente, a região produzia apenas vinhos de mesa, elaborados com uvas rústicas. No entanto, a partir da difusão do trabalho de Murillo Regina, a Casa Geraldo arrancou essas varietais e passou a trabalhar somente com uvas finas. Hoje, são 14 cepas plantadas em mais de 50 hectares, com destaque para Syrah e Sauvignon Blanc.

Sob um conceito de “vinícola boutique”, surge o trabalho da vinícola Barbara Eliodora, também em 2015, a partir do conhecimento sobre a técnica da dupla poda. “O projeto foi idealizado pelo meu pai. Ao conhecer os vinhos de inverno, resolveu plantar três hectares em 2015, cuja primeira safra foi em 2018”, contou o proprietário Henrique Bernardes.

Nos últimos seis anos, a área plantada aumentou cinco vezes, chegando a 18 hectares, com oito tipos de uva. De acordo com o executivo, a produção de rosés e brancos ainda é baixa — motivo que o levou a expor seis tintos. “Apesar de todos serem 100% Syrah, cada um tem suas próprias características. Dois são jovens e quatro são barrigados.”

A caçula do estande mineiro é a Pioli, nascida em 2017, em Jacutinga. A representante comercial da vinícola, Amanda Izidoro, explicou que o casal fundador já tinha uma fazenda de café, quando viu o potencial vitivinícola da região e decidiu destinar 12 hectares da propriedade à plantação de uvas para a produção de vinho.

“Hoje, plantamos oito variedades: Syrah, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Petit Verdot e Pinot Noir (tintas); e Chardonnay, Chenin Blanc e Viognier (brancas). Temos desde vinhos rosés até vinhos mais evoluídos, com passagem de 12 meses em barricas de carvalho francês, além de tintos jovens”, detalhou.

Vitrine para driblar o desconhecimento
Representantes de uma região ainda sem tradição no mundo do vinho, os produtores de Minas Gerais apontaram a falta de conhecimento do mercado e até o preconceito com os rótulos locais como dois dos principais desafios enfrentados pelo estado no setor. Por isso, a presença na ProWine tem um papel estratégico.

“A maior dificuldade, hoje, é fazer com que o brasileiro entenda que também somos capazes de fazer produtos bons. Falando de Minas Gerais, onde não existe essa cultura do vinho, é também fazer com que as pessoas conheçam os produtos, as técnicas e a qualidade. Dessa forma, começamos a mudar o cenário”, defendeu Henrique Bernardes.

O desconhecimento envolve tanto a região em si quanto o próprio método de produção, na visão de Amanda Izidoro. “O Sudeste ainda é muito novo nesse setor. Então, tem bastante gente conhecendo os nossos vinhos e o que é a dupla poda. Graças a Deus, estamos conseguindo uma aceitação bacana e atingindo novos públicos na feira”, disse.

Para o enólogo Savio Garcia, a expectativa é de um resultado expressivo com a ProWine. “Os investimentos estão sendo feitos, a tecnologia está chegando e a gente tem melhorado, ano após ano, a viticultura de precisão. Este evento é uma referência a nível internacional e é uma vitrine de extrema importância para pequenos produtores”, declarou.

Ao encontro dos colegas produtores, Carlos Marcon também destacou as singularidades inerentes aos rótulos apresentados. “O vinho de inverno tem mais tanino, mais polifenóis e mais resveratrol. Um tanino mais aveludado. É importante estar aqui para surpreender as pessoas, mostrando que Minas Gerais não veio só para fazer vinho, mas para fazer grandes vinhos”, concluiu.

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