Entenda o que é açúcar residual nos vinhos

O açúcar residual afeta a doçura e a percepção gustativa dos vinhos finos secos, influenciando sua experiência de degustação

Arnaldo Grizzo Publicado em 17/08/2020, às 18h00 - Atualizado em 14/10/2024, às 08h02

Você já se perguntou por que um vinho rotulado como "fino seco" pode surpreendentemente apresentar uma nota de doçura ao ser provado? A resposta geralmente está no açúcar residual, um componente natural que pode alterar significativamente a percepção gustativa do vinho.

Entender a formação e o impacto do açúcar residual é essencial para apreciadores que buscam decifrar as complexidades de seus vinhos favoritos. Quando falamos em açúcar no vinho, não necessariamente estamos falando do mesmo açúcar que usamos no dia a dia, geralmente feito de cana-de-açúcar – apesar de ele poder ser usado em momentos específicos da produção (veja explicação no quadro).

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Ou seja, não pense que um vinho doce é assim classificado por ter recebido açúcar. Ele provavelmente só tem uma grande quantidade de açúcar residual.

Mas que açúcar é esse? É o natural da uva. A levedura se alimenta dele e o converte em álcool etílico e dióxido de carbono. Assim, é a quantidade de açúcar no mosto que vai determinar o nível de álcool de um vinho e também o açúcar residual – ou seja, o que não foi completamente consumido pelas leveduras após a fermentação.

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Os principais açúcares da uva são glicose e frutose. Qualquer um deles que sobrar ao final da fermentação é açúcar residual. Geralmente, apesar de as concentrações desses dois tipos serem aproximadamente iguais nos vinhos, a frutose é quase duas vezes mais doce do que a glicose.

Ou seja, em vinhos com o mesmo teor de açúcar residual, aquele com mais frutose parecerá mais doce. Vale lembrar ainda que o vinho também contém concentrações muito pequenas de açúcares não fermentáveis – açúcares que a levedura não pode converter em álcool, como a pentose, que contribui para a concentração de açúcar residual.

O doce mais doce

Mas, quanto de açúcar residual um vinho pode ter? A concentração residual de açúcar refere-se à quantidade de sólidos de açúcar em um determinado volume de vinho após o final da fermentação, além de qualquer adição de açúcar.

Açúcar de cana?
Outra fonte de glicose e frutose no vinho pode ser o açúcar de cana, que consiste em sacarose. Ele pode ser usado para chaptalizar (adicionar açúcar) ao mosto para aumentar o potencial de álcool do vinho. Quando o açúcar de cana é adicionado, a sacarose se divide em glicose e frutose.

A concentração residual de açúcar é expressa em gramas por litro ou como uma porcentagem do peso em volume. Por exemplo, um vinho com açúcar residual de 0,2% contém dois gramas de açúcar em um litro de vinho. 

Os vinhos secos costumam estar próximos dessa faixa de 0,2% até 0,5%. No entanto, cada país tem a sua classificação. No Brasil, a lei diz que para vinhos tranquilos e frisantes serem considerados secos, o máximo seria 4 gramas por litro de glicose, e, para espumantes, ditos nature (ou seja, sem adição de açúcar no chamado licor de expedição), até 3 gramas (confira a tabela da legislação brasileira no quadro).

No entanto, nos Estados Unidos, por exemplo, não há qualquer indicação sobre esse tema. Já nas regulamentações da União Europeia, os vinhos secos com acidez moderada podem conter não mais que 9 gramas por litro de açúcar residual, exceto quando o ácido estiver acima de 7 g/l.

Sensibilidade

E a partir de que quantidade percebemos a doçura no vinho? Um vinho seco sempre contém uma pequena quantidade de açúcar, que, na maioria das vezes, é imperceptível. Em alguns casos, o dulçor dos açúcares residuais não é detectado, mas o glicerol – um subproduto da fermentação alcoólica – e o álcool também contribuem para a sensação de doçura, confundindo um pouco nosso paladar com o real teor de açúcar residual. 

Um vinho doce não é assim classificado por ter recebido açúcar, mas provavelmente por contar com uma grande quantidade de açúcar residual

Nossa percepção de doçura ainda é afetada por outros componentes. Vinhos com acidez ou amargor elevados costumam mascarar o dulçor. Para se ter uma ideia, vinhos brancos ditos secos, como alguns Rieslings alemães, por exemplo, permitem açúcares residuais proporcionalmente mais altos quando a acidez está acima de um certo nível, porque ainda assim passam a sensação de serem secos.

Em alguns casos, aromas mais adocicados de variedades como Gewürztraminer, Moscato ou Torrontés, por exemplo, também podem fazer com que você intuitivamente sinta esses vinhos mais doces do realmente são – e há casos em que eles são extremamente secos! 

Além de tudo isso, há a percepção individual. Um mesmo vinho pode parecer seco para você e doce para outra pessoa, que talvez tenha mais sensibilidade ao açúcar. De qualquer forma, diz-se que um dos limiares da percepção humana para doçura, quando saímos do seco para o meio-seco, seja algo em torno de 20 gramas por litro de açúcar residual, o equivalente a aproximadamente uma colher de sopa.

Mas, enfim, e se um dia algum vinho seco lhe parecer doce, tente saber o açúcar residual (é difícil encontrar essas informações) e tente descobrir qual o seu próprio limiar. 

Vinho Doce açucar