Entre altos e baixos

Conheça o renovado Château La Lagune

Um Troisième Cru renascido e novamente cultuado que preza a Petit Verdot

por Arnaldo Grizzo

divulgação
Casa do Château La Lagune foi construída em 1730 com projeto arquitetônico do barão Victor Louis, que construiu o Grand Théatre de Bordeaux. Sua escadaria é inspirada no castelo de Fontainebleau

Tão logo se pega a rota dos “Châteaux do Médoc” avista-se uma pequena, porém charmosa, mansão neoclássica que chama a atenção por sua escadaria frontal, uma versão diminuta da que tem o castelo de Fontainebleau. A casa, erguida em meados do século XVIII, com projeto arquitetônico do barão Victor Louis – que construiu o belo Grand Théatre de Bordeaux –, é a sede do Château La Lagune, um Troisième Cru da classificação de 1855.

O interior da casa também foi restaurado pela família Frey, com motivos neoclássicos

A propriedade fica a pouca distância do centro de Bordeaux em direção ao estuário do rio Gironde, na região sul do Haut-Médoc, antes de chegar à zona de Margaux. Lá, antes mesmo da construção do pequeno Château em 1730, os vinhedos já estavam plantados nas redondezas. Alguns dos primeiros documentos atestam que havia uma fazenda na área por volta de 1580, que lentamente foi sendo transformada em uma propriedade vinícola.

Inúmeros foram os donos dessas terras até que uma poderosa família de negociantes bordaleses, Sèze, assumiu o controle e manteve La Lagune até 1886, pouco mais de 30 anos depois da célebre classificação de 1855, quando conseguiram que sua propriedade fosse encaixada entre as de terceiro melhor ranking. De meados do século XIX até o seu final, foi difícil manter a propriedade devido à filoxera. Depois, vieram as grandes guerras mundiais, que também atrapalharam os negócios e, por fim, em 1956, uma enorme geada devastou completamente os vinhedos do Château.

Caroline, filha de Jean-Jacques Frey, assumiu a enologia de La Lagune, com ajuda de seu professor Denis Dubourdieu, e vem recebendo muitos elogios da crítica

Dois anos depois, a família Sèze vendeu suas terras para Georges Brunet, que iniciou um processo de renovação da propriedade – extremamente devastada na época. Todavia, como o aporte financeiro era demasiadamente alto para isso, o produtor não conseguiu se manter e foi em direção à Provence, onde estabeleceu o prestigiado Château Vignelaure. La Lagune, porém, continuou a decair.

Em 1999, o bilionário suíço Jean- Jacques Frey comprou a propriedade e começou a restauração

Restauração de Champagne

Em 1961, com o Château e seus vinhedos ainda quase completamente desfalecidos, René Chayoux, presidente do Champagne Ayala, decidiu adquirir a propriedade e retomar a renovação iniciada por Brunet. Na época, a situação de La Lagune era tão ruim que o eminente crítico francês Alexis Lichine disse: “Você precisa ser louco para comprar esse Château”. Ainda assim, isso não desencorajou o champenois.

Ao poucos, a empresa começou a se recuperar, porém, oito anos depois de ter comprado o lugar, em 1969, Chayoux faleceu sem deixar herdeiros e, dessa forma, seu colaborador Jean-Michel Ducellier assumiu a companhia, incluindo La Lagune – que, em 1998, acabou nas mãos de seu filho, Alain.

Nova era na mão de suíços

Pouquíssimo tempo após Alain Ducellier tomar as rédeas do negócio, um bilionário suíço – com inúmeras atividades, entre elas imobiliárias e também do ramo da moda –, Jean-Jacques Frey, comprou La Lagune e Ayala. Ele também tem parte da Billecart-Salmon e é dono da Paul Jaboulet Aîné, no Rhône (em 2004, Ayala acabou vendida para o grupo Bollinger).

Quem assumiu o comando das ações no Château foi a filha de Frey, a bela Caroline, que estudou enologia em Bordeaux e segue os conselhos de seu professor Denis Dubourdieu, que é o consultor de La Lagune. Foi com essa ajuda que ela e o pai empreenderam uma grande revitalização de toda a propriedade, a começar pela casa, que foi completamente restaurada e hoje ostenta jardins bem cuidados e um interior ricamente decorado, baseado no período neoclássico, com móveis e tapeçarias trabalhadas, além de obras de arte, quadros e esculturas, e também lustres imponentes.

Os vinhedos, obviamente, foram reformados e foram replantadas diversas vinhas que ainda estavam faltando nas treliças. O maior investimento, contudo, deu-se nas caves, com uma moderna sala de cubas de aço inoxidável desenhada pelo arquiteto Patrick Baggio em formato de ferradura, que recebe as uvas, e todo o processo, a partir daí, é gravitacional. Ela foi finalizada em 2003.

fotos: divulgação
Historicamente, a Petit Verdot é muito presente no vinho da propriedade, em proporção costumeiramente muito maior do que na maioria dos vinhos de Bordeaux

Terroir e vinho

O solo no Haut-Médoc é uma mistura de areia e cascalho com pedras de calcário-argiloso em algumas partes do subsolo. Isso faz com que os vinhos de La Lagune nunca sejam muito densos e potentes. Segundo o mestre de cave do Château, Patrick Moulin, que trabalha lá há mais de 40 anos, a estrutura do seu terroir está mais para a região de Pessac do que para Pauillac, e o vinho, por vezes, se parece muito com os de Margaux.

La Lagune possui 80 hectares de vinhedos em que estão plantadas 60% de uvas Cabernet Sauvignon, 30% Merlot e 10% Petit Verdot. Historicamente, a Petit Verdot é muito presente no vinho da propriedade, em proporção costumeiramente muito maior do que na maioria dos vinhos de Bordeaux.

A propriedade produz, em média, 450 mil garrafas por ano, sendo o Château La Lagune seu principal vinho – que costuma manter a proporção das variedades plantadas, às vezes com acréscimos de Petit Verdot – que passa cerca de 18 meses maturando em barricas de carvalho 50% novas.

O segundo vinho, Moulin La Lagune, criado apenas em 1998, segue a mesma linha, porém com um pouco mais de Merlot, cerca de 40%, passando um ano em barricas, sendo um terço delas novas. Eles produzem ainda mais um vinho, o Mademoiselle L, lançado em 2004, feito de metade Cabernet Sauvignon e metade Merlot, um rótulo para ser bebido jovem.

O trabalho de Caroline Frey à frente de La Lagune tem sido elogiado por alguns dos principais críticos de vinho do mundo, como Robert Parker, por exemplo, que tem dado boas notas para seus vinhos e, além disso, chegou a declarar que ela promoveu uma das maiores viradas qualitativas do mundo do vinho. Seus rótulos têm se mostrado muito elegantes e frescos, com taninos bem equilibrados e maduros, mesmo quando ainda jovens. A primeira safra feita pelas mãos da jovem enóloga foi a de 2004, mas já foi possível sentir o seu toque.

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