E não pense que vamos só de branco, espumante e rosé. Muitos tintos também rimam com leveza
Arnaldo Grizzo Publicado em 25/03/2022, às 16h00
As temporadas de calor, geralmente bastante intensas no Brasil, clamam por momentos de refrescância.
Mergulhos na piscina, caminhadas em parques arborizados, férias à beira mar... Isso sem falar de bebidas geladas e, obviamente, comidas leves, que não empanturram e não nos deixam ainda mais cansados e acalorados com sua lenta digestão.
Uma feijoada? É sempre bom, mas certamente vai pesar no estômago e potencializar aquela sonolência costumeira pós-refeição. Uma massa repleta de molhos pungentes? Vai nos fazer suar. Uma carne cozida com especiarias? Melhor quando em épocas mais frias. Tudo o que queremos agora é refrescância. Algo saboroso, mas que não seja pesado. E, de preferência, ao lado de uma bebida também refrescante.
Então deixamos de lado o vinho? De forma alguma. Ao contrário do que muitos pensam, vinho não é uma bebida de inverno. É sim muito agradável de consumir também no verão.
Obviamente que você não vai abri aquele tinto ultra encorpado e concentrado achando que ele vai descer fácil nessa época. Mas, no mundo do vinho, há muito mais do que tintos. E, mesmo no âmbito dos tintos, há um ecletismo enorme com rótulos de grande frescor. Sendo assim, fizemos uma seleção de pratos leves e saladas e suas possíveis harmonizações.
Diz-se que o criador da salada Caesar foi o restaurateur Caesar Cardini, um imigrante italiano que tinha restaurantes no México e nos Estados Unidos. As receitas hoje podem variar um pouco, mas costumam conter alface romana, croutons, queijo parmesão, suco de limão, azeite, ovo, molho inglês (Worcestershire sauce), anchovas (há quem conteste esse ingrediente), mostarda Dijon, pimenta preta, lascas de frango (outro ingrediente contestado) etc. Enfim, essa é uma das saladas mais famosas do mundo, juntamente com a francesa niçoise, a grega e a caprese, por exemplo.
Para harmonizar, vamos precisar de um vinho bem leve e refrescante. A primeira pedida provavelmente seria um Sauvignon Blanc com sua gostosa acidez e também seus tons levemente herbáceos que rementem ao verde da salada. Se for acrescentar frango ou até mesmo um salmão grelhado, talvez valha a pena optar por um saboroso rosé, com um pouco mais de corpo, mas sem deixar de lado a acidez.
Composto exclusivamente a partir de Malbec, sem passagem por madeira, é um vinho que apresenta ótimo frescor, com frutas vermelhas e brancas, corpo leve, acidez vibrante, boa textura e final saboroso e sedutor, convidando a mais um gole.
Acredita-se que o nome tartar (ou tartare) remeta aos tártaros, povo que vive no leste europeu. Mas o prato não veio de lá, e sim provavelmente da França ou Alemanha, e teria recebido esse nome por remeter à barbárie desses povos, já que a receita é feita com carne crua.
O mais famoso é o Steak Tartare, feito com carne bovina. Mas há diversos preparos, como os de salmão, atum e até de legumes, cogumelos e frutas. O tartar “orginal” geralmente é servido com cebola, alcaparras, pimenta, molho inglês e outros temperos, muitas vezes separadamente, para serem adicionados a gosto. Muitas vezes também é servido com uma gema de ovo crua por cima.
Um prato requintado, mas com tons rústicos pede um vinho de vertente similar. Há quem prefira acompanhar com espumantes, mas experimente com um Cabernet Franc bem frutado. Ou ainda um Mencía espanhol. Ou talvez um rústico, porém sutil País, ou Criolla, variedades que vêm sendo bem trabalhadas por argentinos e especialmente chilenos.
Elaborado exclusivamente a partir de uvas Pais advindas de um vinhedo de mais de 120 anos, com fermentação espontânea (sem adição de leveduras) e sem passagem por madeira, é um vinho que mostra cerejas e groselhas, notas de ervas e de especiarias, vibrante acidez, taninos firmes e granulados e final cativante. Sirva-o mais resfriado, você não irá se arrepender.
Geralmente feita com pedaços de tomate, pepino, cebola, queijo feta e azeitonas, além dos temperos convencionas (sal, azeite, orégano etc.). Há quem inclua fatias de pimentão verde, alcaparra, queijo de cabra e nozes. A ideia, obviamente, é de uma receita muito refrescante e ainda assim nutritiva.
A salada grega tornou-se tão famosa que, em cada canto do planeta, há uma versão, uma forma de juntar ingredientes diferentes, às vezes dando mais ênfase para o tomate, outras para os queijos etc. Muitas vezes, ela é consumida juntamente com algum peixe grelhado.
Apesar de o prato ter tomado diversas formas ao redor do mundo, quando falamos de harmonização, podemos voltar à Grécia e provar junto com um belo Assyrtiko, típico de Santorini. Vale a pena abrir e imaginar um jantar ao pôr-do-sol na ilha grega. Mas para não ir tão longe, talvez valha experimentar com um Vermentino (Rolle no sul da França) ou ainda um Trebbiano.
Composto de Vermentino e de Viognier, sem passagem por madeira, este é um vinho fresco e cheio de vivacidade, mostra frutas brancas e cítricas, floral, ervas e toques minerais. Tem acidez afiada, textura cremosa e final médio/longo, com notas salinas e de flor de limoeiro.
A famosa salada de maionese pode ser considerada um prato democrático. Ela pode ser elaborada das mais diversas formas e, por isso, está nas mesas de todo o país. Há quem faça a maionese caseira, uma emulsão de óleo, gema de ovo e um ácido, vinagre ou suco de limão, que forma um creme espesso que serve de molho para uma infinidade de pratos. A maionese “tradicional” brasileira costuma levar batata, cenoura e ovos cozidos (frios), mas também pode ter ervilhas, vagem, presunto picado, milho verde, azeitona, etc. Há que faça só com batata. Há quem coloque frutos do mar ou ainda macarrão gelado. E não vamos nos esquecer do salpicão. Ou seja, o céu é o limite...
Então, diante de tanta pungência, de uma textura cremosa, a “resposta” em termos de harmonização muitas vezes recai sobre os espumantes, que vão garantir a limpeza do paladar. Mas você pode optar ainda por alguns brancos de extremo frescor, como um Gruner Veltliner ou um Vernaccia di San Gimignano, por exemplo.
Este é um vinho que mostra frutas brancas e de caroço maduras escoltadas por notas florais e de ervas. Cremoso e de bom volume de boca, tem acidez vibrante, gostosa textura e final agradável e persistente, com toques salinos, cítricos e de nozes.
Tradicionalistas dirão que o tabule é uma salada feita somente de salsinha picada temperada com azeite, suco de limão, sal e pimenta. Acréscimos de tomate, hortelã, cebola e trigo, contudo, são bastante comuns e há ainda quem coloque alface ou use sêmola. Originário das montanhas do Líbano e da Síria, o tabule tornou-se uma das saladas mais populares do Oriente Médio e ganhou o mundo nos restaurantes de influência sírio-libanesa.
Pois bem, se a base é a salsa, a ideia aqui é ter um acompanhamento que, além da refrescância, possa seguir com as nuances de verdor. Surge na mente, portanto, um Sauvignon Blanc com suas indefectíveis notas herbáceas, suas ervas e especiarias. Mas podemos ir além e buscar um Sémillon de uma região fresca ou ainda um blend – quem sabe dessas duas castas, que se complementam tão bem, mantendo a acidez e ganhando um pouco mais de corpo, mas nada que atrapalhe o tabule.
Composto de Sauvignon Blanc e Sémillon, sem passagem por madeira, apresenta notas florais e de ervas frescas escoltando sua fruta branca e de caroço madura. Tem ótima acidez, textura firme e cremosa, final persistente e agradável. Uma das melhores, senão a melhor edição desse vinho.
Essa pasta à base de abacate é um prato típico do México, mas se espalhou pelo mundo – especialmente nos Estados Unidos. Guacamole é tradicionalmente feito amassando abacates maduros e descascados e sal marinho com um molcajete y tejolote (almofariz e pilão). As receitas geralmente usam suco de limão, coentro, cebola e jalapeños. Algumas podem incluir creme de leite, tomate, manjericão ou ervilhas. Mais uma vez, estamos diante de uma “massa”, um creme espesso, de sabor pungente, que invariavelmente clama por algo que possa contrapor essa textura, limpar a boca.
Novamente, um espumante (nature, bem “sequinho”, de preferência) vai lidar bem com esse trabalho. Porém, é possível pensar em brancos tranquilos também de alta acidez e super secos. Pode-se começar por um Riesling alsaciano, com suas notas de ervas e textura cremosa. Mas também podemos optar por um Gruner Veltliner austríaco de acidez vibrante.
Elaborado exclusivamente a partir de Riesling, é um vinho cheio de tipicidade. Mostra frutas brancas maduras seguidas de notas florais, químicas, de ervas frescas e especiarias. Saboroso e cheio, tem vibrante acidez, textura firme e cremosa e final longo, com toques salinos, cítricos e de maçãs.
Esta sopa fria feita de vegetais crus misturados é originária das regiões do sul da Península Ibérica. O gaspacho (ou gazpacho) é um dos pratos mais consumidos no verão europeu na Espanha e em Portugal.
A receita “original” é, na verdade, uma sopa de tomates. Mas diz-se que a origem do prato tenha sido uma sopa de pão, azeite, água, vinagre e alho que chegou à Espanha com os romanos. Só durante o século XIX o gaspacho “vermelho” teria sido criado, quando tomates foram adicionados. E esta versão foi a que se espalhou internacionalmente.
E já que estamos na Ibéria, podemos selecionar vinhos desses países para acompanhar essa sopa fria. Vale a pena tentar com um refrescante Alvarinho, seja do Minho, seja de Rías Baixas, por exemplo. Certamente haverá uma ótima sinergia entre vinho e prato. Experimente ainda com um suave Pinot Grigio italiano. Ou então um bom exemplar de rosé com estilo provençal.
Este 100% Albariño, sem passagem por madeira, é encantador e intenso, exibindo frutas de caroço e cítricas, além de notas florais e de ervas. Tem ótima textura, acidez cortante e final persistente, com toques salinos e de casca de limão.
Se há uma época propícia para consumir frutos do mar em preparos leves é o verão. Há uma infinidade de espécies e preparos. Podemos pensar desde o coquetel de camarão até polvo na grelha, passando por ostras in natura, salada de mexilhões, lulas fritas etc. Quando se está à beira mar então, nada melhor do que uma prato com esses ingredientes fresquinhos. É de dar água na boca só de pensar.
As combinações para frutos do mar são bastante diversas. Além da acidez, aqui um dos pontos que sempre vale destacar na concepção da harmonização é a mineralidade. Os tons levemente salinos de alguns alimentos fazem um par excelente com vinhos que tenham caráter semelhante.
E obviamente vamos lembrar aqui de Chablis, com seus Chardonnay frescos e muito minerais, provavelmente resultado de um terroir que um dia já foi um fundo do mar. Mas podemos acrescentar um Riesling – seco – a essa equação, também com notas minerais marcantes. Por fim, não podemos esquecer dos clássicos Vinhos Verdes, sempre infalíveis ao lado dos mais variados frutos do mar.
Composto de Avesso e Arinto, sem passagem de madeira, é um vinho fresco, vibrante e gostoso de beber. Tem acidez pulsante e textura firme e cremosa.
Quem inventou o carpaccio foi Giuseppe Cipriani do Harry's Bar em Veneza, Itália, em 1950. Ele teria preparado a receita originalmente para a condessa Amália Nani Mocenigo. O prato teria recebido o nome de carpaccio em homenagem a Vittore Carpaccio, um pintor veneziano. Vale lembrar que Cipriani também está por trás da criação do drinque Bellini (suco de pêssego com espumante).
Carpaccio é um prato de carne ou peixe cortados em fatias finas e servidas cruas, normalmente como aperitivo. A carne pode ser de vaca, vitela, salmão, atum etc., e é servida com limão (ou vinagre), azeite, queijo parmesão, sal, pimenta e, algumas vezes, alcaparras e trufa branca.
Assim como o tartar, o carpaccio vai seguir linhas semelhantes de harmonização apesar de ter textura geralmente menos espessa. As melhores combinações certamente se darão com espumantes – os mais secos possíveis e de boa estrutura. Entre os brancos, que tal optar por um Verdicchio ou ainda um Trebbiano?
Este nature é elaborado pelo método tradicional e composto de Chardonnay, Riesling Itálico e Trebbiano, sem processo de degola e, portanto, mantido em contato com suas leveduras até o momento do consumo. Impressiona pela cremosidade, tensão e volume de boca, tudo em meio a refrescante acidez e fruta branca e de caroço de qualidade. O fato de não passar pelo dégorgement faz com que as lias agreguem mais peso de boca, oferendo mais estrutura e profundidade ao vinho.
O ceviche ou cebiche se originou no Peru e é normalmente feito de peixe cru fresco marinado em sucos cítricos, mais comumente limão. Também é temperado com ají, pimenta, e outros condimentos, como cebola picada, sal e coentro. O nome se origina da palavra quíchua siwichi, que significa peixe fresco.
Como se pode imaginar, há variações dependendo do peixe escolhido, dos temperos e ingredientes usados para marinar. Servido sempre ultra fresco, o ceviche vai pedir um vinho que acompanhe todo esse frescor de acidez e ainda possa casar com alguns tons especiados sutis.
Novamente lembramos de um Sauvignon Blanc, de preferência de regiões mais frias e sem passagem importante por madeira, para que sua refrescância se mantenha no auge e as notas de ervas também não sejam mascaradas. Se quiser algo um pouco menos convencional, opte por um Torrontés, também preparado de forma a realçar seu frescor. As notas aromáticas, às vezes, podem fazer uma ponte curiosa.
Elaborado exclusivamente a partir de Sauvignon Blanc, sem passagem por madeira, é um vinho que mostra notas de ervas e de flores envolvendo sua fruta tropical e cítrica. Tem final fresco e agradável, com toques de limão siciliano e de maracujá.
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