Reserva de frescor

Vinhos tintos e pratos para harmonizar nas temporadas mais quentes

No verão a sugestão costuma ser deixar de lado os tintos e focar em brancos, rosés e espumantes. Mas, muitas vezes, queremos apreciar um tinto. O que fazer?

por Arnaldo Grizzo

Tintos e harmonizações para o verão

Quais os estilos e rótulos para degustar com temperaturas mais altas?

Calor e tintos potentes nem sempre combinam muito bem. Muito álcool, tanino e estrutura juntamente com um clima de intenso calor podem fazer com que um vinho que seria prazeroso em outra situação (com temperaturas mais amenas) torne-se um tanto sem graça. Na tentativa de remediar isso, às vezes apelamos para baixar a temperatura do vinho demasiadamente, o que pode resolver um pouco a questão da sensação de frescor em boca, mas compromete outras tantas sensações aromáticas e de sabor. Ou seja, nem sempre resfriar o vinho é a melhor solução. 

» 5 combinações perfeitas entre espumantes e comidas

Diante dessa situação, quando estamos em um momento de temperaturas elevadas, que obviamente pedem bebidas mais refrescantes, a sugestão costuma ser deixar de lado os tintos e focar em brancos, rosés e espumantes. Masmuitas vezes, queremos apreciar um tinto. O que fazer? Optar por vinhos mais leves e refrescantes, com estruturas não tão intensas, que podem ser servidos levemente mais resfriados e, ainda por cima, acompanhar com alguns pratos típicos da estação.

Dessa forma, vamos então nos focar em estilos geralmente menos intensos. Nem sempre é fácil “resumir” vinhos por sua variedade e determinar que todo Pinot Noir, por exemplo, é um vinho leve e fresco, assim como todo Cabernet Sauvignon é um vinho potente.

Terroir e vinificação também são determinantes. Maturação da uva, extração, uso de madeira etc., podem impactar decisivamente no estilo de um vinho. Ainda assim, podemos dizer, devido às características próprias da casta, que há muito mais chance de um Pinot ser mais leve do que um Cabernet em linhas gerais. Sendo assim, vamos aqui apontar algumas variedades que podem gerar tintos mais frescos, mas sempre lembrando que o estilo de vinificação também interfere.

Clarete

Há um estilo de vinho tinto, bastante leve, com cor mais pálida, lembrando um rosé, chamado clarete, que rememora um pouco algumas tradições passadas de vinhos que não passavam por uma maceração tão intensa.

Saladas podem sim harmonizar com vinhos tintos

O estilo Claret podem harmonizar muito bem com saladas 

Esses vinhos, que estão sendo resgatados por produtores do mundo todo, inclusive do Brasil, são excelentes para esses momentos de calor intenso e, graças ao seu frescor, podem harmonizar com uma infinidade de pratos, desde entradas com saladas até carnes mais encorpadas.

Gamay

Esta talvez seja a variedade mais lembrada quando falamos de tintos leves e refrescantes, muito disso graças ao estilo Beaujolais Nouveau, de maceração carbônica. AGamay, uva típica dessa denominação geralmente subestimada da Borgonha, costuma apresentar tintos de grande acidez e corpo bastante leve.

Graças a isso ela vem ganhando terreno fora da França, sendo cultivada em outros países (inclusive o Brasil) por produtores que buscam esse estilo de vinhos frescos. É uma ótima pedida para o verão, especialmente se servido mais refrescado e ao lado de pratos de risoto com carne ou cogumelos, ou acompanhando um belo roast-beef com legumes, ou ainda somente para bebericar com entradas estilo canapés com patês de carne, por exemplo.

Grégoire Hoppenot Fleurie Origines 2018

Grégoire Hoppenot Fleurie Origines 2018 - AD 92 pontos - Domaine Grégoire Hoppenot, Beaujolais, França

Adepto da mínima intervenção tanto no vinhedo quanto na vinícola, Grégoire Hoppenot elabora esse tinto exclusivamente a partir de uvas Gamay, advindas dos vinhedos LesRoches e LesGarants, no cru de Fleurie, sem passagem por madeira, mas com estágio de 7 meses em tanques de aço inox. Fluido e muito gostoso de beber, chama atenção pelo equilíbrio do conjunto, tudo sustentado por taninos de ótima textura, refrescante acidez e final suculento.

Pinot Noir

Diz-se que a Pinot Noir é a variedade mais delicada entre as tintas, uma das mais difíceis de trabalhar, mais susceptíveis a variações climáticas e também a interferências enológicas. Ela tem fama de gerar vinhos bastante delicados, de grande acidez, além de cor e estrutura não tão intensas. Mesmo quando passa por madeira, ela não tende a desenvolver um corpo tão pesado quando outras variedades. Mas obviamente que tudo depende um pouco do estilo que o produtor pretende dar ao seu vinho.

Galetos podem ir muito bem com tintos de verão

Pinot Noir e um belo galeto assado é ótima harmonização

Os estilos mais sutis, mesmo que não sejam franceses, podem acompanhar muito bem um macarrão com molho de cogumelos, ou ainda um belo galeto assado com batatas e legumes (e também aquela farofa – com frutas ou miúdos).

Este 100% Pinot Noir, com estágio de 15% do vinho em carvalho francês durante 8 meses é fragrante e de boa tipicidade, mostra frutas vermelhas frescas, especiarias, floral e ervas. Gostoso de beber, tem acidez vigorosa, taninos macios e de boa textura e final médio/longo.

Tempranillo

Aqui estamos falando do estilo que os espanhóis chamam de Joven, ou seja, de preferência sem passagem por madeira ou, se houver, que seja bem sutil. Muitas vezes as referências que temos da Espanha são de vinhos muito encorpados com forte influência da madeira (os Crianza, Reserva e Gran Reserva), mas há uma série de vinhos mais leves. Aqui nos focamos em Tempranillo, mas podemos citar outras variedades como Monastrell (Mourvèdre), Garnacha (Grenache) e até Mencía, que também podem assumir estilos frescos dependendo de como são elaborados.

Para acompanhar os Tempranillos, podemos optar por um frango grelado com condimentos, ou ainda um clássico frango a passarinho com molhos (inclusive agridoces). Ou uma tábua de queijos e frios.

Este é um blend de 90% Tempranillo e 10% Garnacha, provenientes de três parcelas distintas na área noroeste de Toro, com idade entre 25 e 40 anos. Preciso e tenso, tem boa concentração de sabor, acidez afiada, taninos finos e final frutado e persistente, com notas de amoras e de alcaçuz.

Cabernet Franc

Essa variedade pode tanto gerar vinhos bastante encorpados quanto bem frescos a depender do terroir e estilo de vinificação. Quando pensamos em Cabernet Francs frescos, geralmente nos referimos a um estilo bastante comum de vinhos mais jovens do Vale do Loire, como alguns Chinon, BourgueileSaumur-Champigny, por exemplo. Contudo, esta é uma variedade que conquistou o mundo e é capaz de se adaptar a diversos terroirs, produzindo exemplares com a mesma pegada de frescor em outros pontos do planeta.

Alguns Francs remetem a harmonizações com linguiças ou outros embutidos

Alguns Francs remetem a harmonizações com linguiças ou outros embutidos

Muitas vezes, o estilo terroso e rústico de alguns Francs pode nos remeter a harmonizações com pratos repletos de vegetais assados ou cozidos e ainda com linguiças ou outros embutidos. Aqui você tem também uma possibilidade de harmonização com atum ou salmão grelhados e, por fim, queijos de cabra.

Elaborado exclusivamente a partir de Cabernet Franc, sem passagem por madeira, é um vinho vibrante e fresco que esbanja frutas vermelhas e notas florais, de ervas e de especiarias. Sedutor, tem ótima acidez, taninos de grãos finos e final persistente. Não se engane com ele, por ser fácil de beber, aparenta ser menos complexo do que realmente é.

Barbera

Uva típica do Piemonte, a Barbera costuma gerar um estilo de vinhos também bastante leve e fresco, com muitos tons frutados, que quase sempre pede uma segunda taça. São vinhos bastante ecléticos à mesa devido à sua acidez, combinando com uma grande variedade de pratos. No Piemonte, os Barbera geralmente são servidos com o que os italianos chamam de “primo piatto”, ou seja, os primeiros pratos – costumeiramente menos intensos.

Pizza vai bem em qualquer estação, ainda mais com um Barbera

Pizza vai bem em qualquer estação, ainda mais com um Barbera

Falamos aqui de massas com molhos simples ou com ragu de carne ou linguiças, por exemplo. Mas também podemos acompanhar receitas com alguns toques de trufas, ou ainda pizzas dos mais diversos sabores – principalmente as com carnes –, e também grelhados, sejam eles de porco, cordeiro ou bovinos, com tons condimentados.

Este100% Barbera, com estágio de parte do vinho em tanques de inox e parte em grandes tonéis de carvalho, apresenta o caráter fresco e frutado da variedade, lembrando cerejas. Gastronômico e gostoso de beber, tem acidez pronunciada, taninos macios e de boa textura e final longo e cativante.

Dolcetto

Esta variedade é bastante eclética, especialmente em termos gastronômicos. E quando falamos de um tinto com características que acompanham diversos pratos à mesa, geralmente estamos falando de um vinho com excelente frescor, cuja acidez é capaz de abarcar uma diversidade de receitas sem tornar o paladar “cansado”.

Massas com os mais diversos molhos vão muito bem no verão com um Dolcetto

Massas com os mais diversos molhos vão muito bem no verão com um Dolcetto

Os Dolcetto italianos quase sempre privilegiam o frescor de fruta, com madeira controlada. E esses vinhos geralmente são alguns dos primeiros de que lembramos quando pedimos uma pizza, por exemplo, ou então quando estamos diante de uma diversidade de antipasti italianos, como caponatas, queijos, frios, patês, brusquetas etc. Massas com os mais diversos molhos, preparos com berinjela (como as famosas lasanhas), carnes como vitela etc., são várias as possibilidades.

Elaborado exclusivamente a partir de Dolcetto, sem passagem por madeira, é um vinho de boa tipicidade, mostra cerejas e groselhas envoltas por notas terrosas, de violetas e de especiarias doces. Saboroso e de médio corpo, tem ótima acidez, taninos aveludados e de boa textura e final suculento, pedindo uma segunda taça. Aqui menos é muito mais. 

Bardolino

O estilo dos tintos do Vêneto, com sua combinação de uvas Corvina, Rondinella e Molinara, costuma gerar vinhos leves e com acidez importante. Durante muitos anos, vinhos como Valpolicella e Bardolino tornaram-se uma referência para os brasileiros, especialmente os descendentes de italianos. Ou seja, esse vinho fresco, para ser consumido à mesa, junto com aquela farta porção de massa ou ainda bebericando com alguns antipasti,está em nossa memória.

O Bardolino, com seu estilo costumeiramente mais fresco, tende a ser um tinto adaptado às condições mais quentes e um belo companheiro à mesa, indo desde uma salada com bastante tomate e algumas fatias de carne, até espaguete ao vongole, ou ainda um possível par para alcachofra. Pizzas tipo marguerita são infalíveis.

Campagnola Bardolino Classico 2017

Campagnola Bardolino Classico 2017 - AD 89 pontos - Campagnola, Vêneto, Itália

Composto de Corvina e Rondinella, sem passagem por madeira, é um vinho refrescante, frutado e muito gostoso de beber. Mostra cerejas e amoras acompanhadas de notas terrosas, florais e de ervas, tudo equilibrado por vibrante acidez e taninos tensos e granulados. Difícil vai ser ficar somente na primeira taça.

Cinsault

Uma casta que tem se mostrado um trunfo em algumas partes do planeta. Ela é capaz de, juntamente com outras como Grenache e Mourvèdre, por exemplo, gerar vinhos extremamente potentes e encorpados, especialmente no Vale do Rhône. Mas, ao mesmo tempo, é capaz de produzir tintos bem mais frescos e sutis.

Sanduiches dos mais variados, inclusive hambúrgueres, vão muito bem com Cinsault

Sanduiches dos mais variados, inclusive hambúrgueres, vão muito bem com Cinsault

Ultimamente, enólogos do mundo todo têm privilegiado um estilo mais sutil na vinificação da Cinsault, principalmente quando feita de forma monovarietal, e isso faz com que essa uva ganhe espaço à mesa. Vale a pena experimentar ao lado de um belo churrasco ou ainda sanduiches dos mais variados, inclusive hambúrgueres. Pode-se provar com um prato com roast-beef frio e alguns acompanhamentos estilo picles ou salada. 

Projeto inspirado em pequenos viticultores, nesse caso José Miguel Castillo, que em Huaro, no vale de Itata, cultiva as uvas desse 100% Cinsault de vinhedos centenários, com estágio de 12 meses em barricas usadas de carvalho francês. Vivo, vibrante e cheio de tensão, esbanja frutas vermelhas maduras no ponto certo, sem concessão ao dulçor. Não se engane com ele, por ser fácil de beber, parece ser menos complexo do que realmente é.

País

Uma tendência dos últimos anos, países como Chile e Argentina têm resgatado tradições de vinhos mais simples, tintos “para matar a sede”, como eram feitos antigamente, pelos camponeses para serem bebidos junto com a comida, naquele precioso intervalo do trabalho. Tudo isso tem sido recuperado com o uso de variedades como País, também conhecida como Criolla, e uso de técnicas bem simples de vinificação, que privilegiam a leveza e o frescor.

Esses vinhos, portanto, remetem à sua essência, por serem fáceis de beber e preparados para acompanhar pratos rústicos, camponeses por assim dizer, ou seja, desde carnes assadas bem simples até cozidos condimentados. Queijos, linguiças, presuntos, carnes de caça, as possibilidades são variadas.

Produzido a partir de uvas País, sem passagem por madeira, destaca-se pela qualidade e nitidez de sua fruta. Tenso e vertical, tem acidez vibrante, taninos de ótima textura e final longo e profundo. Um vinho de excelente relação qualidade e preço, assinado pelo renomado Pedro Parra.

Poulsard

A Poulsard é uma das variedades mais famosas dos vinhos do Jura e aqui vamos destacar o frescor que a maioria deles tende a revelar para apontar essa uva como uma potencial candidata a harmonizar com uma série de pratos. No Jura, feitos com Poulsard (ou então blends em que ela está presente), podemos ter alguns vinhos que são bastante leves, com taninos bem sutis e acidez importante, excelentes para serem degustados em temporadas de calor.

Vamos começar por uma bela tábua de queijos, que podem ir desde os moles até os duros, com acompanhamentos diversos. Depois, podemos passar para crepes ou panquecas e outros pratos leves, com recheios variados. E ainda chegar a carnes de aves de caça ou ainda alguns cortes bovinos mais magros.

Domaine Rolet Arbois Poulsard Vieilles Vignes 2018

Domaine Rolet Arbois Poulsard Vieilles Vignes 2018 - AD 93 pontos - Domaine Rolet, Jura, França

Elaborado exclusivamente a partir de uvas Poulsard, advindas de vinhedos de 60 anos, com fermentação espontânea (sem leveduras exógenas) e estágio de 11 meses em tanques de aço inox. Fluido e muito gostoso de beber, mostra frutas vermelhas frescas seguidas de notas florais, de ervas secas e de especiarias doces. Verdadeiro lobo em pele de cordeiro.

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