Com vinhedos plantados em platôs e encostas, Santorini está ganhando importância na cena vitivinícola mundial
por Bruno Tanus Job e Meira
A primeira evidência de vinificação na Grécia, descoberta em Phillippi, na Macedônia, é datada de aproximadamente 4.500 a.C. Restos arqueológicos encontrados na cidade pré-histórica de Akrotiri comprovaram a existência de vinhedos em Santorini (oficialmente denominada Tira) por volta de 1.700 a.C. que, por sua vez, foram destruídos na erupção vulcânica catastrófica ocorrida aproximadamente um século depois. Uma nova era vitivinícola em Santorini nasceu já apoiada no novo terroir vulcânico quando a ilha voltou a ser novamente habitada por volta de 1.200 a.C.
Com uma das paisagens mais impressionantes do mundo, Santorini está ganhando importância na cena vitivinícola mundial. Localizada ao sul do mar Egeu, Santorini faz parte do complexo de ilhas Cyclades e tem área total de aproximadamente 75 quilômetros quadrados. Com aproximadamente 1.800 hectares de vinhedos plantados em platôs e encostas que podem variar de 10 a 450 metros acima do nível do mar, 85% das vinhas produzem cepas brancas, sendo 75% delas de Assyrtiko.
Santorini tem clima mediterrâneo, com temperatura média anual em torno de 16,5o C, e grande amplitude térmica. Ventos refrescantes vindos do norte chamados meltemia aparecem na ilha durante o verão, fazendo com que a temperatura durante a noite diminua drasticamente e doenças fúngicas da videira sejam afastadas, principalmente o míldio e a podridão cinzenta.
Solo e subsolo são compostos basicamente por areia (aproximadamente 95%), cinzas e rochas vulcânicas, assim como xisto, basalto e pedra-pomes. São encontradas também, em menor quantidade, rochas impregnadas por magnésio e ferro. Em virtude do solo e subsolo praticamente inorgânicos, com ausência de argila e muito arenosos, Santorini é considerada uma zona sem filoxera, e todas as vinhas da ilha são, portanto, pé-franco.
As chuvas são limitadas (aproximadamente 350 mm/ano) e concentradas no outono/inverno que logo são escoadas em virtude do solo poroso. Além da chuva, a única outra fonte de água disponível para os vinhedos de Santorini é um tipo de neblina oceânica que envolve a ilha durante a noite em virtude da reação de um vulcão ainda ativo com o mar ao seu entorno. Há quem defenda que o sal marinho trazido por essa neblina também contribui para a grande mineralidade dos vinhos de Santorini e, ainda que não exista comprovação de relação direta, de fato quantidades consideráveis de cloreto de sódio são geralmente detectadas em análises químicas dos vinhos produzidos na ilha. Os métodos de condução da videira e replantio comumente utilizados em Santorini são únicos. Em virtude do calor e dos ventos fortes, o método de condução mais utilizado é a kouloura, em que a videira é enrolada como um espiral em forma de ninho de pássaro, para que os cachos permaneçam protegidos no seu interior. Vale observar que, em razão das chuvas escassas, as raízes das videiras penetram o solo profundamente à procura de água e, no caso de vinhas mais antigas, como a condução em kouloura faz com que se tenham muitos metros de videira em espiral, os elementos capturados pelas raízes da planta em determinado momento passam a não mais conseguir alcançar os frutos. Por isso, a cada 80 anos aproximadamente, a vinha é amputada na altura do solo, fazendo com que a raiz antiga regenere uma nova planta. Esse procedimento é realizado comumente cinco vezes por planta, o que faz com que existam videiras em Santorini com raízes de aproximadamente 400 anos. Dessa forma, uma vinha “jovem” na verdade já nasce munida de uma raiz profunda e, por vezes, centenária.
Outro método bastante particular de replantio utilizado na ilha é o kataboladi, por meio do qual se enterra a vara de uma videira viva para que a mesma desenvolva suas próprias raízes. Assim, após aproximadamente cinco anos, a vara enterrada é amputada da videira mãe para constituir uma nova planta.
Autóctone de Santorini e considerada uma das variedades mais antigas do mundo, a Assyrtiko provavelmente tem parentesco com a Gaidouria e a Platani, outras variedades originárias do Egeu.
Com cachos compactos e grãos de grandes dimensões, a Assyrtiko, colhida geralmente do início a meados de agosto, tem capacidade para desenvolver níveis altos tanto de álcool, quanto de acidez. A quase ausência de ácido málico e o pH bastante baixo fazem a fermentação malolática ser desnecessária/inviável.
A Assyrtiko é uma cepa versátil que pode produzir vinhos com estilo mais fresco, passando por vinhos adeptos à amadurecimento em madeira, até vinhos doces. De fato, a cepa consegue entregar rótulos intensos e extremamente minerais (ainda que com tendência à oxidação) que, dependendo do estilo de vinificação adotado e do tempo de amadurecimento/envelhecimento, são capazes, inclusive, de desenvolver a nota “petrolada” típica dos bons Rieslings do Mosel.
As vinhas de Assyrtiko em Santorini, que são mediamente muito antigas (entre 50 e 100 anos), esparramam-se pelo chão e compõem um cenário de baixa densidade. São aproximadamente 1500 vinhas/ha, geralmente espaçadas 2,25 m x 2,25 m ou 2,5 m x 2,5 m, já que um espaçamento menor resultaria em pouquíssima disponibilidade de água para cada planta, visto que a irrigação não é permitida (exceção feita às vinhas jovens). Ainda que a norma dos vinhos de Santorini exija um rendimento máximo de até 60 hl/ha, a média de rendimento geralmente não ultrapassa 20 hl/ha. Em virtude do terroir (principalmente o solo praticamente inorgânico e a rigidez do clima) e do espaçamento entre as videiras, a produção por planta e por hectare é bastante baixa (aproximadamente 1,5 kg/planta e menos de 4 t/ha, chegando a vinhedos com plantas de mais idade a escassas 2,5 t/ha).
Vinhos brancos secos sob a OPAP (Onomasia Proelefsos Anoteras Piotitos – “Apelação de Origem de Alta Qualidade”) Santorini (que, juntamente com a OPAP Paros, compõe as duas únicas OPAPs das ilhas Cyclades) devem ser produzidos a partir de, pelo menos, 75% de Assyrtiko que, quando em blend, vem misturada com Aidani e Athiri (nesse caso, as três uvas são tradicionalmente plantadas, colhidas e vinificadas juntas). Vinhos com a indicação Nykteri (ou Nychteri) são produzidos a partir de uvas em estágio de sobrematuração (e, portanto, com concentração de açúcar bastante alta) e colhidas logo antes do amanhecer, quando a temperatura está amena. Dessa forma, são vinhos com consequente teor alcoólico alto (mínimo 13,5%) e devem amadurecer em barris de carvalho francês por, pelo menos, três meses.
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