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Conheça os 50 anos de história do Esporão e seus melhores vinhos

Após 50 anos o Herdade do Esporão se torna uma lenda e produz grandes vinhos mundialmente conhecidos

Imagem Conheça os 50 anos de história do Esporão e seus melhores vinhos

por Christian Burgos e Arnaldo Grizzo

Quando José Roquette e Joaquim Bandeira chegaram à Herdade do Esporão em 1973, “não havia praticamente nada”.

Lembra  Roquette que tudo estava num estado natural, tinha uma torre que estava por terra, uma capela também meio destruída, mas, em termos de utilização concreta ou vocação agrícola, não existia.

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A propriedade em Reguengos de Monsaraz, no Alentejo, na verdade, tem uma história que remonta a 1267, quando Dom João Aboim, mordomo do quinto rei de Portugal (Dom Afonso III) comprou parte de um terreno que unificou ao que se chamou Defesa do Esporão.

Essas terras passaram de geração em geração entre famílias nobres sem alterar seus limites até chegar às mãos de Roquette. Ele e Bandeira criaram uma empresa chamada Finagra e passaram cultivar vinhas no local com vistas de produzir vinhos de alta qualidade.

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Mas em abril de 1974, ocorreu a Revolução dos Cravos e instalou-se o regime comunista em Portugal. Roquette sabia que sofria alguns riscos por ser opositor ao governo na época e, em 11 de março de 1975, “surge um golpe pesado”. A Finagra foi nacionalizada e Roquette foi preso por “ser um sabotador econômico”.

“Ora bem, portanto essa nacionalização marcou o intervalo de aproximadamente quatro anos, até que, pela Lei Barreto, em 1979, Esporão foi reprivatizado e o que encontramos foi mais destruição do que propriamente qualquer outra coisa que pudesse de alguma forma contribuir para aquilo que o Esporão teria sido pensado”, lamenta.

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Dessa forma, somente em 1985 ocorreu a primeira colheita e então o nascimento da marca Esporão. “Mas a Finagra não tinha a capacidade financeira e a sustentabilidade suficiente para poder continuar numa linha de ter uma adega que produziria vinhos com qualidade bastante alta”. E assim Roquette lançou uma oferta pública de Aquisição sobre a totalidade do capital da sociedade e tornou-se seu único acionista em 1994.

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Destruição criativa

“Daí para a frente, começaram a acontecer coisas”, conta Roquette. Ele revela que pensou muito no conceito de “destruição criativa, que implica que, quando as plataformas tecnológicas começam a ser ultrapassadas, até acabar com o que lá estava, constrói-se outra coisa, uma coisa que cresce mais em linha com o futuro”.

Assim, ele entrou no setor dos azeites ao comprar a Spaza — sociedade produtora de Azeites do Alentejo. Quase na mesma época constituiu-se, com seu irmão João, a Qualimpor, para importar e cuidar dos interesses das marcas do Esporão no Brasil. Segundo José, esse foi um passo crucial. 

“Um importador normalmente é a via natural para chegar aos mercados, mas ele está mais preocupado com as condições que recebe para as transações, com suas comissões. É difícil convencer o importador de que a marca é um investimento importante a ser feito.

A construção da marca própria foi o que nos levou, no caso dos mercados estratégicos, a ter empresas nossas, com a nossa gente. Pois a nossa gente é a única que pode, sabe e deve se preocupar com a marca Esporão”, revela ao citar movimentos similares em mercados como Angola e Estados Unidos, o que leva o Esporão a exportar 60% do que produz atualmente.

Ampliação e distribuição

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O projeto de transformar as vinhas para produção biológica mudou de forma substancial o Esporão

Em 1996, comprou-se a Herdade dos Perdigões, onde foi encontrado um sítio arqueológico de 5 mil anos, que está sob os cuidados da empresa. Assim, em 1998, a histórica torre também começou a ser recuperada (ela dá o nome do principal vinho da marca). Vale lembrar que, no centro da Herdade do Esporão, erguem-se três monumentos históricos: a Torre do Esporão, o Arco do Esporão e a Ermida de Nossa Senhora dos Remédios, antigo local de peregrinação dos fieis da região do Alentejo. 

Outra decisão estratégica fundamental foi a aquisição da PrimeDrinks, empresa de distribuição, o que alavancou as vendas de Esporão no mercado nacional, especialmente da marca Monte Velho, um dos principais legados de João Dotti, o gestor do Esporão na época. Tempos depois, aliás, foi o próprio Dotti que indicou a José Roquette que seu filho mais novo, João, deveria assumir a gestão da empresa. 

“Em 2008, ocorreu uma coisa que mudou de uma forma muito substancial e que teve uma influência enorme no que foi posteriormente acontecendo: o projeto de transformar as vinhas do Esporão para produção biológica”, conta Roquette, que na mesma época adquiriu a Quinta dos Murças, no Douro.

A empresa também passou a se digitalizar, a renovar o enoturismo e suas adegas. A saber, Esporão atualmente têm três locais de produção, uma adega para brancos, uma para tintos chamada Monte Velho e outra chamada Adega dos Lagares para seus vinhos topo de gama. Nesse meio tempo, a Finagra passa a se chamar Esporão S.A.

Em 2018, termina-se a certificação biológica (“um trabalho permanente”) e no ano seguinte adquire-se a Quinta do Ameal, em Vinhos Verdes. Mais recentemente, Esporão também fez parcerias com o Instituto Superior de Agronomia de Portugal, para onde está transferindo seus escritórios, no intuito de ampliar o leque de pesquisa para os estudantes e angariar novos talentos.

Empresa familiar

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No início de seu discurso celebrando os 50 anos de Esporão (ao qual ADEGA esteve presente), José Roquette havia lembrado uma emblemática frase do filósofo espanhol José Ortega y Gasset: “os homens são os homens e as suas circunstâncias”.

Ele se orgulha de Esporão ser uma empresa familiar e pretende que seja assim por longo tempo. Ele lembrou que, junto com Margarida, sua esposa, tem seis filhos, 20 netos e cinco bisnetos. “Há mais vida para além da vida biológica. E eu acredito que os filhos, netos, bisnetos saberão dar valor naquilo que a vida representa e representou”, aponta. Ele cita que, já há muitos anos, Esporão é regida com um acordo de acionistas em um protocolo familiar que define a relação que existe entre eles e quais são as perspectivas.

“A missão que nos espera para os próximos 50 anos depende muito de Deus, desta estrutura e desta passagem. Nós sabemos que não vai ser propriamente uma caminhada fácil, pois o novo normal é a mudança. E dentro da mudança, uma coisa possível é acompanhar a mudança. Temos de estar ao lado da mudança”, pondera lembrando que “só 5% das empresas familiares passam para uma segunda geração e só 0,4% ultrapassam a segunda geração”.

Mas além de sua família, Roquette reconhece o papel social do Esporão. “Mais uma vez sentimos que somos uma parte de tudo aquilo que acontece com muitas famílias, com pelo menos 3 centenas de famílias, se calhar talvez um pouco mais”, diz ao lembrar dos colaboradores, fornecedores, parceiros etc. que vivem no “ambiente” do qual Esporão faz parte e que se reuniram (cerca de 700 pessoas) para comemorar a data especial para a empresa.

“Acredito que o espírito, a cultura e os valores que nos levaram até aqui estarão presentes no Esporão em 2073. Muito obrigado àqueles que hoje aqui estão e àqueles que vão continuar”, finalizou.

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