Um pouco da história e das principais atrações da terra dos alfacinhas, como popularmente são chamados os lisboetas
por João Calderón
"No castelo, ponho um cotovelo. Em Alfama, descanso o olhar. E assim desfaz-se o novelo. De azul e mar. À ribeira encosto a cabeça. A almofada, na cama do Tejo. Com lençóis bordados à pressa. Na cambraia de um beijo". Lisboa Menina e Moça, o fado eternizado na voz de Carlos do Carmo, nos seduz por um passeio pela cidade das sete colinas, que tanto reflete as letras e as palavras dos diversos fadistas e escritores que por ali passaram. Uma cidade moderna e ao mesmo tempo antiga, cosmopolita, mas um tanto quanto tranquila, sedutora e, por vezes, bucólica.
Essa é a terra dos alfacinhas, como são popularmente conhecidos os habitantes de Lisboa. Apesar de se tratar de um termo desconhecido, existem algumas possíveis explicações. Muitos dizem ser oriundo dos tempos antigos da cidade, quando brotavam os verdes pelas colinas de Lisboa. Também há quem sustente que em um dos cercos pelo qual a cidade passou, os habitantes tinham como alimento basicamente as alfaces de suas hortas.
A terra dos alfacinhas passou por um episódio que marcaria definitivamente sua história, inclusive arquitetonicamente, ou seja, muito do que conhecemos hoje foi alterado depois desse episódio, pois, em 1 de novembro de 1755, Lisboa foi quase toda destruída por um terremoto. E foi com o lema de "enterrar os mortos, cuidar dos vivos e reconstruir a cidade" que o Marquês de Pombal reergueu a região.
Dessa forma, parte da cidade foi redesenhada, como a Baixa Pombalina, as praças do Rossio e o Terreiro do Paço, que passou a ter uma bela arcada aberta para o Tejo. Posteriormente ao terremoto, nos primeiros anos do século XIX, Portugal foi invadido pelas tropas de Napoleão, o que obrigou o rei Dom João VI a vir para o Brasil. Assim, Lisboa viveu intensamente as lutas liberais e floresceram os cafés e teatros que passaram a caracterizar a capital portuguesa, como o Martinho da Arcada e A Brasileira - ambos tinham um frequentador assíduo, o poeta Fernando Pessoa. Anos mais tarde, em 1879, foi aberta a Avenida da Liberdade que se estende do Parque Eduardo VII até a praça do Rossio, e é uma das mais elegantes avenidas de Lisboa.
Podemos começar nosso passeio por Lisboa pela Baixa Pombalina, mais especificamente pela Praça do Comércio, ou Terreiro do Paço, como é mais conhecida a imponente praça aberta para o Tejo - decorada por suas arcadas e de onde partem tradicionais ruas cheias de comércio, a mais importante delas a rua Augusta com seu Arco Triunfal. Também por ali está a rua do Carmo, com sua imperdível loja de luvas, a Luvaria Ulisses, a menor loja de Lisboa.
Estando na Baixa nada melhor do que ir até o Chiado, ponto de encontro boêmio lisboeta, muito frequentado por pintores e poetas no início do século XX. É lá que estão, por exemplo, duas pastelarias históricas, a Benard e A Brasileira. Passeie pela elegante rua Garret e chegue ao Largo do Carmo, onde terminou o regime ditatorial português, em 1974, no famoso 25 de abril da Revolução dos Cravos. Ali também podem ser visitadas as ruínas do Convento do Carmo, quase destruída no terremoto de 1755. Nada melhor para conhecer essa zona da capital portuguesa do que apanhar o elevador oitocentista de Santa Justa, um marco neogótico de Lisboa, que apesar de não comprovado, dizem ter sido projetado por Gustave Eiffel.
Ainda na parte Pombalina, você pode pegar o lendário Elétrico 28, bonde que liga Campo de Ourique até o Martim Moniz, percorrendo algumas das zonas mais bonitas da cidade, Bairro Alto, Chiado, cortando a Baixa e subindo em direção à Graça, levando-nos até as proximidades do Castelo de São Jorge, o monumento nacional mais emblemático de Lisboa, em uma das colinas mais altas da cidade que nos propicia uma de suas melhores vistas.
Em Belém, além da torre está o expoente máximo do período manuelino, o Mosteiro dos Jerônimos, e o Museu dos Coches, o mais visitado de Portugal
Ao conhecer o Chiado, nada melhor do que pegar o elevador de Santa Justa, um marco neogótico da cidade | A região da Baixa Pombalina, com as praças do Rossio e o Terreiro do Paço, foi redesenhada |
No dia seguinte, o passeio será por Belém, que foi o principal porto na época dos descobrimentos. Desse período data a construção da Torre de Belém, que guarda a entrada lisboeta. Além dela existem algumas outras visitas obrigatórios nessa parte da cidade, como o expoente máximo do período manuelino português, o Mosteiro dos Jerônimos e seu impressionante claustro de um tipo gótico único. Guarde tempo também para o Centro Cultural de Belém, logo ao lado do Mosteiro com uma diversificada oferta no campo das artes. Em Belém ainda estão o Padrão dos Descobrimentos, monumento que homenageia o período homônimo, e o Museu dos Coches, o mais visitado museu de Portugal, com uma das melhores coleções mundiais de carruagens.
Deixando um pouco de lado a parte histórica lisboeta vamos para o Parque das Nações, junto ao rio Tejo. Diversos pavilhões foram construídos para a Expo 98, onde destaca-se a imperdível visita ao Oceanário, um dos maiores aquários do mundo, que reproduz os cinco distintos oceanos e numerosas espécies de mamíferos e peixes.
ATRAÇÕESCASTELO DE SÃO JORGE CENTRO CULTURAL DE BELÉM LUVARIA ULISSES MOSTEIRO DOS JERÔNIMOS MUSEU DOS COCHES OCEANÁRIO DE LISBOA PARQUE DAS NAÇÕES TORRE DE BELÉM |
Lisboa é daquelas cidades que você não precisa se preocupar na hora de escolher onde ir
Por fim chegamos a melhor parte da terra dos alfacinhas, o verdadeiro porquê de viajar e também a parte de Lisboa que mais nos seduz, a boa mesa. Lisboa é daquelas cidades que você não precisa se preocupar na hora de escolher onde ir, basta arriscar uma das esquinas pelas quais passe que seguramente não irá se arrepender. Ainda assim é sempre bom ter algumas boas opções.
A Brasileira tinha um frequentador assíduo, o poeta Fernando Pessoa | Vista exuberante do terraço do Casa da Dízima |
LISBOA GOURMETCERVEJARIA RAMIRO RESTAURANTE BICA DO SAPATO MARTINHO DA ARCADA PASTÉIS DE BELÉM RESTAURANTE TAVARES CANTINHO DO AVILLEZ TASCA DA ESQUINA RESTAURANTE ELEVEN |
Seu passeio gourmet pode começar pelas tradicionais marisqueiras, com frutos do mar de exímia qualidade
Oferta de vinhos da Taberna 1300 é excelente |
Tavares é um dos restaurantes emblemáticos de Lisboa e já teve uma estrela Michelin |
Os pequenos prazeres da vida podem começar pelas tradicionais marisqueiras, com frutos do mar de exímia qualidade. Não deixe de experimentar a sapateira, um caranguejo de aproximadamente um quilo. Dentre as opções de marisqueiras está a tradicional Cervejaria do Ramiro, o restaurante Sete Mares ou o Relento, que fica em Algés. Ramiro é uma casa muito simples, mas o sortimento de frutos do mar é impressionante. Mas aqui vale uma brincadeira: é muito comum, ao final de uma grande degustação de frutos do mar, o cliente pedir um Prego para fechar. Prego em Portugal é um sanduíche e, no caso do Ramiro, é um pão francês com um filézinho na chapa. O Prego do Ramiro é um dos melhores e mais famosos de Lisboa.
Se seu desejo é por cozinha tradicional portuguesa, com diferentes opções de carnes, como o borrego por exemplo, ou o sempre procurado bacalhau, duas sugestões interessantes são O Farta Brutos, localizado no Bairro Alto e que defende fielmente o gosto dos lisboetas, ou ainda a Tasquinha da Adelaide, com excelente comida caseira e que já foi frequentado, inclusive, pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Outra opção interessante é Solar dos Presuntos, que fica no Rocio. Um restaurante de três andares com tudo da culinária portuguesa tradicional, desde alguns tipos de bacalhau, passando por outros peixes, polvo, gambas, porco etc. Vale a pena a Açorda de Lavagante. A carta de vinhos é apresentada em iPad, muito completa com todos os grandes vinhos portugueses disponíveis. Fundamental fazer reserva com antecedência.
Já a Casa da Dízima está localizada no Paço dos Arcos, à beira do mar, em uma lindíssima construção de tijolo cru do século XV. A vista do terraço no andar superior é linda. Um local que vale a pena visitar e aproveitar tanto a deliciosa comida, quanto a impressionante carta de vinhos. Se você gosta de vinho, não pode deixar de visitar esse restaurante.
HOSPEDAGEMLocalizado no boêmio Bairro Alto e próximo ao cosmopolita Chiado está o Bairro Alto Hotel, um hotel de muita personalidade, mesclando o moderno com o clássico português. Um ambiente luxuoso e elegante com um serviço de extrema qualidade, como não poderia deixar de ser, já que o hotel é membro do prestigiado Leading Hotels of the World. Uma opção perfeita para aqueles que procuram uma hospedagem única e exclusiva. Outra opção dessa "rede de grandes hotéis" é o Pestana Palace, um hotel clássico num palácio do século XIX. Tem 194 quartos, sendo que 4 são suites reais. Já para os menos ousados, nada melhor do que optar pelos sempre seguros hotéis de grandes redes hoteleiras, como o Tivoli e o Sofitel Lisboa. Ambos localizados em uma das áreas mais agradáveis e luxuosas da cidade, a Avenida da Liberdade. Guardando as devidas proporções, seria algo como hospedar-se na Champs-Élysée em Paris. SITES |
Ramiro é uma casa muito simples, mas o sortimento de frutos do mar é impressionante |
Uma opção para diversificar um pouco o passeio da noite são os restaurantes e bares da zona das docas, em Alcântara, antiga área portuária aos pés da ponte 25 de abril, que foi totalmente reformada e transformou-se em uma das opções mais agradáveis para terminar a noite. Lá, uma opção é o Taberna 1300 na LX Factory, que é uma antiga fábrica (complexo de impressão gráfica) que se tornou um conglomerado de excelentes bares e restaurantes. A moderna Taberna 1300 tem uma culinária moderna e criativa, oferece pratos de frutos do mar, peixe e carne, de porco e de vaca. Não percam a Salada de Atum Fresco marinado e o Mignon de Porco. Mas, impressiona também o impecável serviço do escanção (como é conhecido o sommelier em Portugal) Rodolfo Tristão, que acaba de ser nomeado presidente da Associação dos Escanções de Portugal. A oferta de vinhos é excelente, com boa oferta de vinhos em taça também.
Belcanto, do chef José Avillez, tem uma estrela Michelin |
Uma opção para diversificar um pouco o passeio da noite são os restaurantes e bares da zona das docas, em Alcântara, antiga área portuária aos pés da ponte 25 de abril
Para transformar uma de suas refeições em um momento único, uma das opções mais emblemáticas de Lisboa é o restaurante Tavares, que já ostentou uma estrela Michelin. O restaurante Eleven também pode ser uma excelente opção, já que faz parte do consagrado guia Relais & Châteaux. Outra opção poderia ser o Bica do Sapato que possui um quê mais contemporâneo ou um dos dois restaurantes comandados pelo chef Vitor Sobral, Terreiro do Paço e a Tasca da Esquina, esta última que aterrissou em São Paulo recentemente. Pode-se ainda realizar os seus sonhos gourmets no Belcanto, do chef José Avillez, possivelmente o chef português mais em pauta atualmente, e que foi presenteado com uma estrela Michelin na nova edição do guia.
Localizado no coração do Chiado, em frente ao Teatro São Carlos, o Belcanto é uma sensação em Lisboa, muito aconchegante e de certa maneira sóbrio. Tem carta de vinhos muito bem elaborada. As cavalinhas acompanhadas de torradinhas com tapenade e salada verde são sublimes e harmonizam de maneira precisa um bom Vinho Verde. Recomendado fazer reserva. Mas caso esteja procurando uma opção mais informal ainda sob a atenção de Avillez, prefira o Cantinho do Avillez.
Para adoçar sua viagem, nada mais tradicional do que os Pastéis de Belém, com 175 anos de história servindo o que talvez seja a mais famosa iguaria de Lisboa, os deliciosos pastéis de nata, que saem quentinhos do forno, impossibilitando-o de comer apenas um. As filas ali costumam ser longas, por isso, se quiser, enquanto aguarda, pode ir deliciando-se com os pastéis de cerveja, também muito saborosos e que estão logo em frente.
E para terminar essa sedutora viagem e a sua refeição, ao som fado, nada melhor do que voltar à Baixa Pombalina para tomar seu digestivo, um licor de ginja na casa A Ginjinha. E assim terminamos o nosso passeio pela bela Lisboa.
LOJAS DE VINHO EM LISBOAAlém dos pontos turísticos e restaurantes espetaculares, o enófilo que visita Lisboa está bem servido quando se trata de lojas de vinho. Um dos pontos obrigatórios é o El Corte Inglés, de uma rede espanhola, mas que tem uma belíssima loja na capital portuguesa - e outra na cidade do Porto. Sua seleção de vinhos portugueses é fenomenal, mas, por ter sede na Espanha, também tem uma oferta ímpar de rótulos do país vizinho. Além disso, lá se encontra vinhos top das mais variadas regiões, até do Novo Mundo. Outra loja tradicionalíssima é a Garrafeira Nacional, no coração de Lisboa. Lá você encontra absolutamente qualquer vinho português e, mais do que isso, é um templo de vinho do Porto, com safras antigas que não se acham mais em lugar algum. Por fim, também vale a visita à loja Coisas do Arco do Vinho, que fica em frente ao Mosteiro dos Jerônimos. É um local lindo, com uma seleção sensacional de vinhos portugueses e uma coleção singular de Porto de safras antigas. SITES: |
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