Nossos vinhos

O Brasil tem potencial para produzir vinhos excepcionais e competitivos?

Entenda os diferentes climas e suas influências nos diversos terroirs nacionais

por Sergio Inglez De Sousa

Em muitas ocasiões, predomina o preconceito contra o vinho brasileiro. Algumas vezes isso acontece porque não se provou os bons vinhos de nosso país. Em outras oportunidades, as críticas vêm no bojo de argumentos esfarrapados que comparam preço de vinho nacional de qualidade com o de vinho básico importado, semelhante à conhecida confusão de misturar abacate com lâmpada de 200 velas.

Certa vez, um famoso jornalista me desafiou: como produzir vinho bom no Brasil se aqui não há clima para isso?

O pretensioso entendido não se lembrou da incrível diversidade de climas que paira nos mais distintos e distantes rincões nacionais e, por isso mesmo, a resposta a esta pergunta só poderia ser outra pergunta: a qual clima ele estaria se referindo: Manaus ou São Joaquim? Recife ou Campos do Jordão? Brasília ou Ubatuba?

Avaliações mais atentas mostram que no Brasil vinícola há centenas de condições diferentes de clima, desde os péssimos até os ótimos para o tamanho das parreiras. E isso nos leva a desenvolver considerações sobre a forma drástica, definitiva e irreversível com que o clima interfere na qualidade do vinho.

Na Universiteit van Stel-lenbosch, na África do Sul, na sala do professor Elsen Archer, está pendurado na parede um provocante quadro a óleo: ramagens de videira dão o contorno geral a uma grande baga de uva em cujo interior está pintada uma garrafa de vinho. Esta é a primeira lição que um enólogo deve guardar na ponta da língua: a qualidade do vinho está definitivamente determinada nas bagas da uva.

O cacho da uva é como um bebê – extremamente dependente da "mãevideira". Outras frutas, como a manga, por exemplo, são colhidas no estado de verdolengas e deixadas para completar o amadurecimento em alguma fruteira de nossas casas. A uva, não! Uma vez colhida, perde imediatamente o processo de alimentação do interior das bagas pela videira, e o cacho não amadurece nada a mais.

Quando chove na época da colheita, a videira alimenta a baga da uva com uma ração aguada, tornando sua composição mais diluída e implicando maior volume de polpa, menos açucarada. Esse processo resulta em um vinho medíocre, de baixo teor alcoólico, pois o álcool do vinho é o açúcar da uva transformado pela fermentação.

Outra lição interessante foi dada pelo Prof. Dr. Possingham, da Universidade de Adelaide, Austrália, nos seus vinhedos no McLaren Valle. Todos os participantes da aula, com cestinha e tesoura na mão, colheram cachos de Shiraz, de quatro pontos bem distintos do vinhedo. De volta ao prédio, cada um deveria “degustar” o melhor vinho através das uvas. O mestre explicou que cada uma das localizações do vinhedo correspondia a uma posição da “antena parabólica de captação da energia solar“, e os melhores vinhos sairiam das uvas mais doces e densas, oriundas dos pontos de maior exposição ao sol dentro do mesmo vinhedo.

Assim, o preconceito de afirmar que o Brasil não tem clima para vinho é fruto de pura ignorância, pelo menos, em termos geográficos. A geografia vinícola brasileira conta com excelentes climas que vêm sendo revelados através da qualidade efetiva de seus vinhos.

Os vinhedos que têm recebido muitos comentários positivos são aqueles conhecidos como vinhas de altitude catarinenses. Nestas regiões, em função do amadurecimento mais lento devido ao frio, a colheita acontece em abril e maio, época completamente fora do período das famosas chuvas de verão, que desabam de janeiro a março e podem interferir na qualidade da uva.

No Rio Grande do Sul, temos três fronteiras vitivinícolas com vinhos de expressão: Serra do Sudeste, Campanha e Campos de Cima da Serra, que pode ser incluído no conjunto dos vinhos de altitude, como os catarinenses. Embora na questão do paralelo da geografia vitivinícola mundial os vinhedos estejam abaixo dos 30°, a altitude acima de 1000 metros compensam vários graus, inserindo-os em torno do “paralelo 35°”.

A Campanha Gaúcha repete as condições do terroir uruguaio. Na Serra do Sudeste, o clima se mostra tão favorável que as uvas produzidas trazem, em média, o potencial de álcool no vinho para 13,5%.

Todo grande produtor de vinhos projeta sua linha de rótulos dentro de uma pirâmide de diferentes níveis de qualidade e de preço, para atingir nichos específicos de consumo. Essas medidas servem também para o Brasil, onde, assim como na França e em outros países produtores de vinhos, o comum é o vinho corrente, e o vinho bom é produzido em quantidade reduzida.

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