Uma noite regada a clássicos do Pomerol como Petrus, Lafleur, Le Pin, L’Evangile entre outros
por Christian Burgos
Participamos de uma memorável degustação de Pomerol e, consequentemente, foi a mais especial prova de vinhos com base de Merlot de 2018. A degustação, que celebrava o lançamento do escritório da importadora Clarets no Rio de Janeiro, foi conduzida por Manoel Beato no restaurante Fasano Al Mare. A tradição de respeito ao vinho das casas Fasano subiu mais um degrau com o chef Paolo Lavezzini demonstrando sensibilidade, e mesmo reverência aos vinhos, e criando seis dos sete pratos da noite especialmente para o encontro, o que acrescentou uma dimensão adicional à degustação.
Beato lembrou que o Pomerol é uma ínfima região, com apenas 800 hectares de vinhedos plantados na famosa margem direita em Bordeaux. Junto com sua vizinha Saint-Émilion, o lado direito até a primeira metade do século passado tinha pouca exposição, visto que o lado esquerdo e seu Cabernet Sauvignon eram o foco dos ingleses. Foi a família Moieux (de Petrus) que desbravou o comércio do vinho da margem direita e deu visibilidade ao berço do Merlot.
Ali predomina o solo argiloso, que se combina com o cascalho nas áreas mais altas, justamente onde se produzem seus grandes vinhos. O efeito da argila sobre o Merlot é exatamente o grande contribuinte para a elaboração de vinhos mais potentes da região, e cujas características permitem que sejam apreciados mais cedo do que seus vizinhos da margem esquerda com base de Cabernet Sauvignon.
Isso ficou ainda mais evidente depois que o enólogo Michel Rolland apostou na maior maturação de Merlot nos vinhedos e maior extração na vinícola. Produtores da região passaram a contar com Rolland como consultor ou simplesmente seguir seus passos. Exceção é o Petrus, que manteve um perfil de colheita mais precoce, algo que se apresenta claramente em sua estrutura.
Para quem tem preconceito contra Michel Rolland, nada como uma boa taça de Le Bon Pasteur 1982 como antidoto. Esta mesma taça também serve como contraprova para quem duvida da capacidade de evolução destes vinhos.
Os vinhos do Pomerol são sedutores e já encantam pelo nariz. A presença de dois Petrus na mesma noite (safras 1975 e 2000) trouxe a curiosidade sobre como foram escolhidos os 12 vinhos da noite. Afinal, apenas um Petrus, ainda mais acompanhado de outros ícones, como o Le Pin, por exemplo, já seria apelo mais que su ciente para o evento. Guilherme Lemes, proprietário da Clarets, con denciou que ia colocar apenas o 2000, mas adicionou o segundo, pois queria criar a oportunidade de comparar o Petrus com o Trotanoy em sua grande safra, 1975. A partir daí, é fácil ver que a paixão e o desejo de compartilhar experiências é o ingrediente que move estas degustações. Lemes, Beato e Marcelo Batista, sommelier chefe da importadora, passaram meses selecionando os vinhos e procurando-os pelo mundo.
CHAMPAGNE KRUG CLOS DU MESNIL 2002
De um vinhedo de apenas 2 hectares, este puro-sangue Chardonnay consegue aliar uma estrutura sobre-humana com cremosidade e incrível vibração. Além da or branca, perfil cítrico com grapefruit e lima da pérsia com sua parte branca, caminha no paladar para a textura de fim de boca garantindo sua ímpar vocação gastronômica. Já começamos com a melhor harmonização da noite. O caviar Beluga com creme azedo. Harmonizei inicialmente o Beluga sem o creme azedo, cou ótimo. Experimentei então acrescentando o creme azedo, o que tornou a harmonização perfeita e garantiu o prêmio de campeão em harmonização para este Champagne que, de tão persistente consegue se manter no paladar mesmo após a comida. CB
Com o paladar preparado pelo Krug, partimos para o ight de 1975:
Manoel Beato ressalta que 1975 foi um ano irregular, mas estávamos diante dos dois melhores representantes da safra. Muitas vezes nas degustações comparativas, Petrus não brilha como deveria, pois este monstro precisa de muito tempo para atingir seu apogeu. Mas esta era sua noite, e o 1975 estava estupendo. Nariz extremamente exuberante, quase canela. Iodo e sangue. Couro e caça. Trufa preta. Água corrente. Terroso. Robusto. Aromas orais vão cando cada vez mais óbvios à medida que abre em taça. Apesar de ainda apresentar fruta madura e taninos presentes, o equilíbrio sugere que está pronto para ser aberto hoje com emoção garantida. CB
Menos conhecido que seu companheiro de flight e que seu vizinho Le Pin. Sendo a primeira vez que o degustei, não me sinto qualificado a generalizar sua personalidade. Mas é muito fácil descrever esta safra deste corte de 90% Merlot e 10% Cabernet Franc. Era um jovem esportista na taça, austero e coeso, com especial perfil floral, leve toque medicinal e ervas. Fruta muito viva, ameixa madura. Depois, con rma a cereja. Em boca, está muito coeso, com final de vibrante de acidez e taninos lapidados que deixam brilhar sua mineralidade. Mais límpido e cristalino. Está mais inteiro. Resiste ainda 10 anos. Inteiro e impecável. A mesma nota que o Petrus, mas por razões diferentes. Hoje o Petrus está imbatível, amanhã ele (a um quinto do preço). CB
AD 94 pontos
CHÂTEAU L’EVANGILE 1982
Acredito que passou seu apogeu. Sinto isto na estrutura e no perfil terciário, com muito couro, embora ainda tenhamos um pouco de fruta. A boca está mais curta e vale mais pelo nariz. Vai abrindo com elegância ao nariz com mais terciários e mineralidade. A acidez está presente e mantém o paladar no alto. Sua cor mais para os tons de marrom ajuda no diagnóstico. CB
Ainda fruta viva e, em seguida, revela-se um toque de butano, mas os taninos se sobrepõem à fruta e não creio que vão evoluir como gostaria. Um vinho forte. Ainda tem cânfora e um toque salino, no perfil sangue, iodo e terra molhada. A textura é seu ponto alto. CB
Pomerol é uma região com apenas 800 hectares de vinhedos plantados na margem direita em Bordeaux
Belíssimo nariz. A fruta está perfeita ainda. Uma prova de que a fruta madura encontra sua longevidade quando há equilíbrio. Tem o medicinal estilo xarope. Colado ao L’Evangile, e ambos no limite com Saint-Émilion. Íntegro, com notas negras e de folha de tabaco. De fato, um perfil mais maduro que os outros do ight, mas está pronto para mais. Untuoso, polido e equilibrado. Para repensar o preconceito com Michel Rolland.
Aqui o risoto preparado na hora e o tomate em ramas foram um ponto alto do jantar.
Com vinhedos mais ao norte na região. É um passeio olfativo. Perfil com muita carambola, temperado com miolo da jabuticaba e um pouco do dulçor da atemoia. Os taninos estão muito bem e presentes. Um pouquinho de Cabernet Sauvignon que também se demonstra. Está mais inteiro que seus companheiros de ight. Beato ressalta que “ainda vai explodir”. CB
O segundo mais maduro do flight. Aqui vem a gordura do toucinho, seguida da fruta negra de amora madura. Ao fundo um toque oral. Equilibra-se pelo toque mentolado e tabaco. Também pela vibração e força dos taninos. CB
Nariz ao mesmo tempo rico e elegante no vinho mais maduro do flight. Um perfil carnudo acompanhado de um perfume de muita fruta, especiarias e tabaco. Em boca, está muito vivo em acidez e taninos. Se enriquece com as frutas, e o morango impera, mas as amoras também estão aí. Os taninos e a acidez garantem muito tempo à frente. CB
Vizinho ao Petrus. Monolítico. Austero e profundo. A fruta ainda está incrível. Tem musgo, pimenta vibrante. O toque vegetal a ervas de um vinho jovem. Os taninos estão ótimos e ainda prometem alegria por muitos anos. CB
Em boca, está delicioso e equilibrado, com frutas, taninos e tudo mais na medida certa. Com este equilíbrio, consegue se manter alegre e exuberante. Um verdadeiro perfume que con rma o encantamento olfativo do Pomerol. Sua ponta é à madeira, um pouco mais presente. CB
Um vinho estupendo de um pequeno vinhedo de 4 hectares. Floral, blueberry fresco e musgo na oresta. Austero e extremamente elegante. A qualidade dos taninos é surpreendente, uma aula no assunto. A palavra que o de ne é nobreza. Muita or seguida de camadas de fruta. Pimenta do reino. Grafite total. Denso. A acidez torna-o ainda mais elegante. Melhora a cada gole. Incrível que após tantos grandes vinhos seja capaz de emocionar. CB
Num vinhedo de 2 hectares nasce este precursor dos vinhos de garagem. Desde a juventude, é um vinho mais pronto. Um sedutor Novo Mundo nascido no Velho Mundo. Fruta e bala de fruta. A boca é juvenil, embora no nariz tenha mais maturidade. A fruta e acidez são a vida deste vinho. Exuberância com a mineralidade. O uso da madeira é menos contido que os demais. Tentar definilo é encontrar uma combinação do Novo Mundo com a acidez da Borgonha. CB
Austero. Tons de musgo, de floresta, ervas aromáticas. Precisa de tempo. Comprar este vinho é um ato de fé. Difícil projetar o 1975 desta noite neste 2000. A textura de taninos tem uma personalidade e força indescritíveis. Um corredor de ultramaratona. Paciência é tudo. Apesar de ser um dos preferidos da noite, esqueceria na adega até 2030. CB
AD 97 pontos
CHÂTEAU D’YQUEM 1983
Nada de doce. Frescor, cera de abelha, fruta à damasco ou ameixa amarela fresca. Floral e mineral. Longo nal, perfeito para encerrar uma grande noite de vinhos. CB
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