As videiras em produção mais antigas do hemisfério sul

Cidade na Austrália guarda as videiras em produção mais antigas do hemisfério sul, e talvez do planeta

Arnaldo Grizzo Publicado em 12/05/2023, às 12h09

Região de Barossa, na Austrália, é famosa por seus vinhedos antigos e Shiraz de alta gama - Divulgação

Bem perto de Adelaide, na região centro-sul da Austrália, conhecida como South Australia, fica Barossa, a denominação de origem mais famosa do país, terra das videiras (em produção) mais antigas do hemisfério sul, e talvez do planeta.

A região vitivinícola é dividida em dois vales, Barossa e Eden, e os vinhos mais celebrados são os feitos com a variedade Shiraz de vinhas velhas. Mas são muitos os detalhes que fazem com que Barossa tenha se tornado uma das denominações mais aclamadas do território australiano.

A viticultura lá é quase tão antiga quanto sua fundação. Barossa foi fundada por um rico comerciante de navios inglês, George Fife Angas, logo após a colonização da Austrália do Sul em 1836. O primeiro Inspetor Geral da colônia livre, Coronel William Light nomeou o vale inspirado pela Sierra de Barrosa, região espanhola da Andaluzia, onde travou uma famosa batalha nas Guerras da Península de 1811. No entanto, devido a um erro no processo de registro, o nome ficou sendo Barossa, com dois “s” e não com dois “r”.

Quando voltou a Londres, Angas recebeu uma proposta de um líder luterano dissidente, o pastor August Kavel. Ele queria reinstalar seu rebanho de camponeses e comerciantes da Silésia no Novo Mundo. Assim, a partir de 1842, os imigrantes luteranos, que estavam fugindo da perseguição religiosa em sua terra natal na Prússia, deram à região um caráter alemão (tanto que a Riesling, depois da Shiraz é uma das principais castas), investiram no cultivo de frutas – especialmente uvas – e, até a década de 1890, dezenas de vinícolas foram estabelecidas.

Carta classifica as vinhas por idade em quatro categorias: Vinhas velhas, Vinhas sobreviventes, Vinhas centenárias e Vinhas ancestrais

 

O inglês Samuel Smith navegou para a Austrália em 1847 com sua esposa e filhos, e depois de trabalhar para Angas por um tempo, comprou terras e plantou as primeiras vinhas de Yalumba em 1849. Da mesma forma, Johann Gramp, um agricultor da Baviera, chegou a Barossa em 1847 e se estabeleceu nas margens de Jacob’s Creek. Muitos outros colonos notaram que o vale era adequado para vinhas, então enviaram mensagem de volta à Alemanha para que enviassem mudas de Riesling.

Como os australianos bebiam basicamente vinhos fortificados (assim como os ingleses), Barossa tornou-se especialista nesse estilo. Com restrições estritas de quarentena e a introdução de um ato formal contra a filoxera em 1899, a praga nunca chegou ao sul da Austrália. Já em 1929, Barossa era responsável por 25% da produção de vinho australiano.

Contudo, os anos de depressão foram de grande impacto para a indústria local. 
O novo boom só viria a ocorrer a partir de 1940 quando Colin Gramp (descendente de Johann Gramp) visitou o Napa Valley, onde aprendeu as técnicas modernas de vinificação. Ao retornar, ele fez o primeiro vinho tinto seco em Barossa desde a década de 1860. Depois disso, a região começar a ganhar reputação global, especialmente com seus Shiraz.

Mais recentemente, Barossa tem fervilhado, sendo palco das principais revoluções vinícolas da Austrália, liderada por enólogos visionários como John Duval e seu filho Tim, por exemplo, e também por produtores tradicionais com Seppeltsfield, Yalumba e Henschke.

Vale lembrar que Barossa é o lar de alguns dos mais antigos vinhedos em produção contínua do planeta, com Shiraz, Cabernet Sauvignon, Mataro, Grenache e Riesling, que remontam à década de 1840. O legado de vinhas velhas se tornou tão relevante que, em 2009, criou-se uma “Carta de Vinhas Velhas”, que visa reconhecer e preservar esse patrimônio.

Terroir

Desde 2008 desenvolve-se na região o projeto Barossa Grounds, focado em estudar como os diferentes terroirs influenciam no vinho 

 

A região de Barossa está localizada a aproximadamente 70 quilômetros a nordeste de Adelaide. A Indicação Geográfica foi estabelecida oficialmente em 1997 e engloba duas zonas e uma sub-região: Barossa Valley, Eden Valley e a sub-região de High Eden.

O vale de Barossa tem invernos frios e úmidos com verões quentes e secos. Uma combinação de dias secos e ensolarados e noites frescas garante uma maturação consistente. A principal preocupação é a seca. O complexo sistema de vales e colinas sinuosas resulta em uma variedade de encostas. Em Barossa Valley, os solos variam muito, mas tendem a ser ricos e profundos e todos caem dentro de uma família de fertilidade relativamente baixa franco-argilosa até mais arenosa, de cor cinza, passando por marrom até vermelho. Como em grande parte do sudeste da Austrália, a acidez aumenta nos subsolos, o que restringe o crescimento e o vigor da planta.

Já no vale do Éden, a altitude é um fator importante determinando o mesoclima. A uma altitude de cerca de 500 metros, os vinhedos do vale Pewsey, Heggies e High Eden no extremo sul são consideravelmente mais frios do que os de Henschke, mais ao norte, com uma elevação de 380 a 400 metros. As temperaturas são significativamente mais baixas do que as de Barossa Valley. Mas há múltiplos mesoclimas devido à variação de altitudes. Geralmente os dias são muito quentes e as noites frias, com longos períodos de sol durante a fase de crescimento.

William Light nomeouo vale inspirado pelaSierra de Barrosa,região espanhola daAndaluzia

 

O terreno variado significa que existem vários tipos de solo. Os mais comuns vão do cinza ao marrom, de areia argilosa. Também há cascalhos de rochas férreas, de quartzo e fragmentos de rocha na superfície. Esses tipos de solos rasos e rochosos são bem adequados para a viticultura não irrigada, mas existem também manchas de solos arenosos nas encostas, ladeadas por mica-xistos desgastados, que têm pouca capacidade de retenção de água.

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