O topo da pirâmide espanhola

O que são os Vinos de Pago?

Grandes vinhos e locais pequenos, essa é a ideia básica dos Vinos de Pago, o topo da pirâmide vitivinícola espanhola

Ao contrário das demais classificações, o Vino de Pago é atribuída a uma única propriedade e não uma região
Ao contrário das demais classificações, o Vino de Pago é atribuída a uma única propriedade e não uma região

por Arnaldo Grizzo

Grandes vinhos de locais pequenos. Essa é basicamente a ideia dos Vinos de Pago espanhóis. O termo vem do latim, pagus, que significava uma pequena vila ou propriedade rural.

Até 2003, não havia regulamentação específica para o uso desse nome no rótulo e qualquer propriedade teoricamente poderia usá-lo. No entanto, desde então, uma lei passou determinar as diretrizes e implementou o sistema de hierarquização das denominações de origem espanholas. Foi quando os Vinos de Pago ingressaram no topo da pirâmide.

A saber, os vinhos espanhóis podem ser classificados da seguinte forma: “vinos de la tierra”, que seriam a base, os mais genéricos de uma região, depois seguem-se os “vinos de calidad”, e posteriormente entram os vinhos de Denominação de Origem. “Acima” da DO existe outra categoria chamada Denominação de Origem Qualificada, com regras mais severas.

E, por fim, os Vinos de Pago. A ideia, obviamente, é que quanto mais alto se vai nessa pirâmide, mais restritivas as normas de produção.

Em 2003, ano inicial da classificação, apenas dois vinhos foram elencados como Vinos de Pago e autorizados a continuar usando esse termo em seus rótulos: Dominio de Valdepusa e Finca Elez. Atualmente, são 23 propriedades que podem ostentar esse termo, sendo a Abadía Retuerta a mais recente a receber a certificação, no fim de maio de 2022.

Vale lembrar que a classificação Pago existe dentro dos parâmetros de denominação existentes, mas ela é atribuída apenas a uma única propriedade em vez de uma região vinícola inteira. Uma propriedade que busca a classificação Pago deve solicitar e atender a certos critérios para receber o título (veja no final dessa matéria).

Geralmente, as vinícolas que se cadastram devem ser aclamadas pela crítica e possuir uma longa história de vinificação de vinhos de qualidade. Apesar de a lei proibir que novas vinícolas registrem o nome Vinos de Pago, ainda há alguns rótulos que não estão na lista dos 23 certificados que ostentam o termo, pois foram criados antes de a lei entrar em vigor.

Outro detalhe importante é que, desde 2004, foi criada uma associação denominada Grandes Pagos de España, que congrega atualmente 36 produtores que visam produzir vinhos de qualidade com parâmetros similares aos que foram aprovados na lei de 2003. Contudo, vários deles não são Pagos certificados pelos órgãos governamentais.

Sendo assim, vale a pena conferir a lista das propriedades atualmente classificadas e conhecer um pouco de suas histórias.

Abadía Retuerta

Um dos mais recentes Pagos reconhecidos (em 2022), o local da Abadía Retuerta era originalmente o Mosteiro de Santa María de Retuerta, fundado em 1146.

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Abadía Retuerta, um dos mais recentes Pagos reconhecidos 

Desde 1988, os proprietários trabalham para reconstruir essa história. A propriedade tem 700 hectares, dos quais 180 ha são de vinhas em Sardón de Duero, que fica perto do limite da denominação Ribera del Duero, mas não pertence a ela.

Arínzano

Sancho Fortuñones de Arínzano, também conhecido como “Señorío de Arínzano”, foi o primeiro proprietário desta terra na região de Navarra por volta de 1055.

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A histórica e quase milenar vinícola de Señorío de Arínzano

Ele a recebeu do rei García de Nájera devido ao seu apoio incondicional nas guerras. Com 128 hectares de vinhedos, Arínzano é um dos mais célebres Vinos de Pago, que já era reconhecido há muito tempo como um terroir excepcional.

Aylés

Pago Aylés foi fundado por Federico Ramón, que em 2003 começou seu sonho de classificar esta terra única como o primeiro Vino de Pago na região de Aragão. Pouco antes de morrer, em 2003, seu sonho se tornou realidade.

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Pago Aylés foi o primeiro Vino de Pago na região de Aragão

O vinhedo tem uma longa história, que remonta ao século XII. Influenciado pelo rio Huerva e pelo Monte San Pablo, o solo é uma mistura de argila, calcário e giz.

Calzadilla

A Bodega Família Uribes nasceu em 1980 com pequenas instalações e não produziu vinho até 1992, ano em que comercializou Calzadilla.

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Um dos menores Pagos com apenas 20 hectares

Com apenas 20 hectares no coração da Alcarria de Cuenca, a poucos quilômetros da cidade de Huete, em Castilla-La-Mancha, este é um dos menores Pagos, sendo sancionado em 2011.

Campo de la Guardia

O vinhedo do Pago Campo de la Guardia pertence a Bodegas Martúe e está localizado em La Guardia de Toledo.

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O vinhedo do Pago Campo de la Guardia

São dois terrenos, o Campo Martuela, com 30 hectares, cultivado em 1990, e o El Casar, com 51 hectares, plantado a partir do ano 2000. Em 2009, Martúe obteve a denominação de Pago Campo de La Guardia graças ao trabalho incessante de Fausto Gonzalez.

Casa del Blanco

Casa del Blanco está localizado na província de Ciudad Real de Castilla-La Mancha. São 150 hectares de vinhas que foram certificadas como Vino de Pago em 2010. A vinificação na propriedade remonta ao século XIII, mas está documentada a partir de 1854, ano em que Casa del Blanco passou para as mãos da família Blas Garcias.

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Casa del Blanco possui 150 hectares de vinhas que foram certificadas como Vino de Pago em 2010

A família Sánchez a comprou em 1990. Com mais de 20 anos de pesquisas e diferentes reconversões de variedades de uva, atualmente Pago Casa del Blanco conta com 12 variedades, quatro brancas e oito tintas.

Chozas Carrascal

Embora Chozas Carrascal tenha surgido em 1990 da paixão pelo vinho do casal María José Peidro e Julián López, a origem é bem mais antiga. O nome da vinícola leva o apelido carinhoso pelo qual seus conterrâneos conheciam a região, “Chozas”.

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"Chozas" recebeu o status de Vino de Pago em 2012 

Depois de muitos anos de estudo do terroir e reestruturação, eles receberam o status de Vino de Pago em 2012 para a propriedade que fica próxima das montanhas Juan Navarro, em Requena.

Cirsus

Localizada no município de Ablitas, no extremo sul da de Navarra, a uma altitude de 395 metros acima do nível do mar, La Finca Bolandin tem um total de 200 hectares onde estão localizados seus vinhedos, vinícola, hotel e restaurante.

Pago de Cirsus, recebeu, em 2014, a certificação Vino de Pago.

Dehesa del Carrizal

Dehesa del Carrizal situa-se no meio dos Montes de Toledo, junto ao Parque Nacional dos Cabañeros, entre as bacias do Tejo e do Guadiana. Dehesa del Carrizal recebeu o status de Vinos de Pago em 2006, 30 anos após o plantio de suas primeiras videiras no município de Retuerta de Bullaque, na província de Ciudad Real.

Dehesa Peñalba

Bodegas Vizar está localizada no município de Villabáñez, a leste de Valladolid, na região espanhola de Castilla y León, na fronteira com a Ribera del Duero DO.

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Bodegas Vizar está localizada no município de Villabáñez na região espanhola de Castilla y León

O pedido da Vizar para obter a classificação de Vino de Pago para Dehesa Peñalba foi primeiramente apresentado em 2019 e aprovada em 2022. São cerca de 90 hectares de vinhas plantadas para Tempranillo, Syrah, Cabernet Sauvignon, Merlot e Verdejo.

Dominio de Valdepusa

Dominio de Valdepusa, um dos dois primeiros Pagos certificados em 2003, fica em Malpica de Tajo, em Toledo, e pertence à família de Carlos Falcó, o Marqués de Griñón, desde 1292. É um vinhedo único de 52 hectares, incluindo a vinha original de (14 ha) Cabernet Sauvignon plantada em 1974.

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Dominio de Valdepusa, um dos dois primeiros Pagos certificados em 2003

Desde 1991, a vinha sendo progressivamente aumentada com as variedades Syrah, Petit Verdot e Graciano. A adega está situada em edifícios históricos do século XVIII. A produção atual é de cerca de 350 mil garrafas e Michel Rolland está entre os consultores.

El Terrerazo

A história da Bodega Mustiguillo inicia-se em 1972 quando a família Sarrión-Martínez comprou a propriedade de Terrerazo. O vinho de Terrerazo já era conhecido desde 1919 na região de Utiel-Requena.

A Finca El Terrerazo faz parte de Mustiguillo e é o vinhedo mais antigo da propriedade, plantado basicamente com a variedade Bobal.

El Vicario

O vinhedo de Pago del Vicario situa-se a 600 metros de altitude, nas margens do rio Guadiana, na região de Castilla-La Mancha.

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O vinhedo de Pago del Vicario nas margens do rio Guadiana

Abrange uma área de 130 hectares de vinhas, em que a variedade predominante é a Tempranillo, mas Garnacha, Graciano, Merlot, Syrah, Cabernet Sauvignon e Petit Verdot também são cultivadas, assim como Sauvignon Blanc e Chardonnay.

Finca Élez

Os vinhedos com cerca de 40 hectares e vinícola do Pago Finca Élez estão localizados no município de El Bonillo, na província de Albacete. Fundada pelo prestigiado ator Manuel Manzaneque, a vinícola começou suas atividades em 1992.

Manzaneque foi um dos fundadores da associação Grandes Pagos de España junto com Carlos Falcó (Dominio de Valdepusa), Paco Uribes (Calzadilla) e Victor de la Serna (Sandoval). No início de 2020, a Finca Élez foi adquirida pela família Villoldo Ruiz.

Florentino

Em 1997 Florentino Arzuaga, proprietário e fundador da Bodegas Arzuaga, desembarcou em Castilla-La Mancha atraído pelo mundo do azeite da região de Montes de Toledo.

Ele então encontrou a propriedade “La Solana”, ideal para vinhas na cidade de Malagón, província de Ciudad Real. Assim, passou a produzir o Pago Florentino com uvas Cencibel, que posteriormente recebeu o status de Vino de Pago.

Guijoso

Pago Guijoso fica em El Bonillo, em Albacete, onde se encontra a propriedade da Família Conesa, no coração do Campo de Montiel. A propriedade, adquirida em 2013, por Antonio Conesa consiste em dois mil hectares e tem tradição na produção de vinhos e também queijos.

O lugar é reconhecido há séculos fica no coração da rota de Dom Quixote de La Mancha, que passa pelo próprio Pago e possui alguns dos lugares mais famosos mencionados por Cervantes, como a Cueva de Montesinos e as Lagunas de Ruidera.

La Jaraba

Pago de La Jaraba está localizada no local histórico de mesmo nome, entre Villarrobledo e El Provencio, no coração de La Mancha.

O nome vem dos árabes que definiram a propriedade como: “terra abundante em água”. Lá se faz uma agricultura dita holística e, além dos vinhos, produz-se azeites e o tradicionalíssimo queijo manchego.

Los Balagueses

Pago de los Balagueses, na região de Requena, recebeu a qualificação de Vino de Pago em 2011, destacando-se, entre outras características, por estar localizado num ambiente de grande biodiversidade como o Parque Natural Hoces del Cabriel.

Foi o primeiro Pago ecológico da Espanha. O Pago pertence à Bodegas Vegalfaro fundada por Andrés Valiente e seu filho Rodolfo em 1999. O nome Vegalfaro vem de uma combinação da palavra “vega”, que significa terra fluvial, com o nome histórico da própria vinícola, Casa Alfaro.

Los Cerrillos

De propriedade das Bodegas Montalvo Wilmot, Pago Los Cerrillos foi oficializado em 2019.

São 40 hectares de vinhas das castas Tempranillo, Cabernet Sauvignon, Petit Verdot e Syrah, plantadas há mais de 40 anos a uma altitude de quase 700 metros, atravessadas de ponta a ponta pelo Rio Guadiana, na província de Ciudad Real.

Otazu

Bodega Otazu foi a primeira construída em Navarra em 1840 em um prédio de estilo renascentista. Mas as primeiras menções escritas são ainda mais antigas e datam da Reja de San Millán no século XI.

Seu vinhedo foi considerado Vino de Pago desde 2009. A vinha é ladeada pelas Sierras del Perdón e Sarbil, tendo o rio Arga como limite natural da propriedade.

Prado de Irache

Bodegas Irache é uma das vinícolas mais antigas de Navarra. Foi fundada em 1891, embora já no século X os monges beneditinos, que viviam no mosteiro adjacente, produzissem vinhos que serviam de alimento e cura para os peregrinos do Caminho de Santiago.

Em 2008, Bodegas Irache recebeu a classificação Vino de Pago Prado de Irache, tornando-se a primeira vinícola de Navarra a ter um Pago.

Vallegarcía

O vinhedo foi idealizado pelo renomado professor de viticultura australiano, Richard Smart. Ele possui uma área de 50 hectares localizada na região dos Montes de Toledo.

O terroir é plantado com seis variedades de uvas francesas: Viognier, Cabernet Sauvignon, Syrah, Merlot, Petit Verdot e Cabernet Franc. Em 2018, foram adicionadas três variedades espanholas: Garnacha, Cariñena e Monastrell. Em 2019, a propriedade foi considerada Vino de Pago.

Vera de Estenas

Este Pago da região de Utiel-Requena está na área da Bodega Vera de Estenas, que pertencente a uma família de longa tradição vitivinícola.

A área demarcada em 2019 estende-se por uma suave encosta que desce da Serra Juan Navarro em direção ao vale do rio Magro e da Ribeira Estenas. Lá se produzem vinhos tintos com Bobal, Cabernet Sauvignon, Tempranillo e Merlot, assim como rosé e brancos.

Como ser um Vino de Pago?

Segundo a lei espanholas, um “Pago” entende-se como uma área ou sítio rural com características edáficas e microclimáticas próprias que a diferenciam e distinguem das demais ao redor em sua Denominação de Origem, e deve estar dentro de um só município. Entende-se ainda que existe notória ligação com o cultivo da vinha e o nome do Pago deve ter sido utilizado habitualmente no mercado para identificar os vinhos nele obtidos por um período mínimo de cinco anos.

Caso a totalidade do Pago se enquadre no âmbito territorial de uma denominação de origem qualificada, ele poderá receber a designação de “vinho qualificado de pago”, e os vinhos nele produzidos serão denominados “Pago qualificado”.

Os vinhos Pago serão elaborados e engarrafados somente por quem detenha a propriedade das vinhas situadas no Pago. Todas as uvas utilizadas para o vinho devem provir de vinhas localizadas no Pago e o vinho deve ser produzido, armazenado e, se for caso, envelhecido separadamente de outros vinhos.

Um sistema de qualidade integral na produção de vinhos deve ser implementado e será aplicado desde a produção das uvas até a colocação dos vinhos no mercado. Cada Vino de Pago deve ter um órgão de gestão.

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