Confira 13 variedades de uvas que possuem nomes diferentes em regiões distintas, mas são a mesma coisa
Arnaldo Grizzo e Eduardo Milan Publicado em 19/03/2019, às 15h00 - Atualizado às 15h24
Em um dia, você tem em sua taça um belo exemplar de Monastrell, da Espanha, no outro, um tinto com base em Mourvèdre, da França. Ao degustar, você nota algumas semelhanças entre eles, mas, definitivamente, não são iguais. Cada um tem uma personalidade levemente diferente. Mas, o que você diria se soubesse que Monastrell e Mourvèdre são sinônimos, ou seja, são a mesma variedade, mas com nomenclaturas diferentes dependendo da região onde são produzidas.
No mundo do vinho, esse não é um fato incomum. Apesar de o planeta ter milhares de uvas catalogadas, há ainda mais se considerarmos as variações de nomes de uma mesma cepa em locais distintos. Os exemplos são inúmeros. Aliás, é provável que cada uva conhecida tenha pelo menos um sinônimo mundo afora. Isso sem contar aquelas cujas diferenças de nome são sutis devido à pronúncia e escrita em línguas diferentes.
Não há dúvida de que Alvarinho e Albariño, por exemplo, são variações de um mesmo nome, assim como Pinot Gris e Pinot Grigio, Muscat e Moscatel, Syrah e Shiraz etc. Mas há outras um pouco menos similares, como Verdelho e Godello, Grenache e Garnacha etc. E outras ainda que, sem algum conhecimento prévio, fica difícil dizer que seriam a mesma uva, como Fernão Pires e Maria Gomes, Arinto e Pedernã, Mencía e Jaen, Macabeo e Viura etc.
Um dos lugares onde talvez haja o maior número de sinônimos para as mesmas uvas é Portugal. Lá, Trincadeira pode receber o nome de Tinta Amarela ou Trajadura, por exemplo, dependendo da região. A Baga pode ser chamada de Tinta Fina e a Roupeiro de Codega. Isso só para citar algumas. Porém, há uma infinidade.
Para tornar a vida mais fácil e as degustações mais “entendíveis”, ADEGA decidiu elencar 13 variedades bem conhecidas que possuem nomes diferentes dependendo da região, mas que são a mesma cepa.
Uma das variedades que proporciona vinhos longevos no Dão e no Douro, em Portugal, é a Bastardo. No entanto, ela também é uma casta importante da região do Jura, na França. A primeira menção ao nome Bastardo é de 1531. Somente mais de 200 anos depois é que ela aparece com o nome Troussot (que se tornou Trousseau) nas regiões de Poligny e Besançon. Ela também é uma cepa comum na Galícia, na Espanha, onde pode receber ainda outros nomes, como Merezao e María Ordoña, e, em outras regiões pode aparecer como Verdejo Negro e Maturana Tinta. Alguns dizem que ela é sinônimo de Alfrocheiro e Castelão, mas não é, assim como também não deve ser confundida com a Bastardo Tinto. A Bastardo é uma das variedades comuns no Vinho do Porto e Madeira, mas há alguns varietais de tintos tranquilos feitos com ela.
Uma das uvas mais famosas do mundo, a Pinot Noir tem produção em quase todo o planeta. E, por isso, apresenta alguns sinônimos interessantes. Um dos mais comuns é o italiano Pinot Nero. No entanto, na Alemanha, Suíça e Áustria, ela pode ser chamada de Spätburgunder ou Blauburgunder. Acredita-se, porém, que o primeiro nome dado à casta tenha sido Moreillon, em 1283. O nome Pinot Noir só surgiria em 1375. A origem do nome, assim como a origem da cepa até hoje é repleta de hipóteses. Alguns acreditam que ela tenha surgido no Egito, ao longo do Nilo; outros, que ela seja a antiga variedade conhecida como Allobrogica, mencionada por Plínio, o Velho, e Columella. O que se sabe, com certeza, porém, é que ela se fixou com galhardia na Borgonha, onde produz alguns dos melhores exemplares do planeta, mas também origina ótimos rótulos em diversas regiões.
Outro nome comum da Garnacha, como é conhecida na Espanha, ou Grenache, na França, é Cannonau – típica na ilha da Sardenha, na Itália. Aliás, em solo italiano, ela ainda recebe outro nome: Tocai Rosso, no Vêneto. Na França, a Garnacha também pode levar o nome da região que primeiro a recebeu quando veio da Espanha, Roussillon. Há quem acredite que o nome Cannonau tenha sido o primeiro usado para se dirigir à Garnacha, denotando uma possível origem italiana e não espanhola como se supunha até então. No entanto, as referências tanto a uma quanto à outra são muito próximas. Além disso, como a Sardenha foi colônia espanhola de 1479 a 1720 e a primeira menção ao nome Garnacha é de 1513, é de se supor que haja uma relação próxima. Graças à sua boa adaptação aos climas mais quentes, a Garnacha é uma das uvas mais plantadas do mundo.
Mais uma variedade de origem espanhola que se espalhou pela França e ficou conhecida por seu sinônimo. A Mazuelo nasceu, provavelmente, em Aragão, na Espanha, e seu nome deriva de Mazuelo de Muñó, uma cidade na província de Burgos, em Castilla y León. Já seu sinônimo mais conhecido, Carignan, em francês, vem da cidade de Cariñena (outro sinônimo comum), perto de Zaragoza, província de Aragão, não muito longe da DOC Priorat, onde é uma das estrelas. A Mazuelo costuma ser uma uva de alto rendimento, assim como alta acidez e cor profunda.
A Tempranillo, a mais famosa variedade da Espanha, possui diversos sinônimos. Em Portugal, por exemplo, ela pode ser chamada de Aragonez (ou Aragonês), no Alentejo, e Tinta Roriz, no Douro. Na própria Espanha, ela pode receber o nome de Cencibel (Castilla-La Mancha), Chincillana (Estremadura), Tinta del País (Rioja), Tinta de Toro (Castilla-La Mancha), Tinto Fino (Madrid), Ull de Llebre (Albacete) etc. As primeiras menções às uvas “Tempranillas” (de maturação antecipada) são do século XIII em Ribera del Duero, mas de forma bastante vaga. O primeiro sinônimo conhecido data de 1513, como Aragonés, uma variedade descrita como sendo de Castilla, Estremadura e Andaluzia. Ainda assim, como o nome deriva do reino de Aragão, não é possível determinar se ela foi anterior. A primeira menção confiável à Tempranillo é de 1807. Apesar de ser uma cepa tipicamente ibérica, ela se espalhou pela França, especialmente no Languedoc, mas também é encontrada na Itália e outros países do mundo, inclusive no Brasil.
Assim como em Portugal, na Itália também podemos encontrar uma série de sinônimos para algumas das principais variedades do país. Uma delas é a Nebbiolo, estrela do Piemonte, base de vinhos clássicos como Barolo e Barbaresco. Mas, na região de Valtellina, na Lombardia, por exemplo, ela pode ser encontrada com o nome de Chiavennasca. Outros sinônimos menos comuns são Prunent, Spanna e Picoutender. As primeiras referências à Nebbiolo são de meados do século XIII quando ela era chamada de Nibiol. O nome deriva de “nebbia”, que em italiano significa nevoeiro, que provavelmente se refere à espessa camada que recobre os frutos quando estão maduros. Acredita-se que a Nebbiolo e a Pinot Noir sejam as duas variedades com maior capacidade de expressarem os terroirs onde são cultivadas.
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Uma das mais famosas uvas brancas da Itália, ela comumente é referida como “família Trebbiano” devido às diversas variações de nome que possui. No entanto, estudos de DNA mostram que elas têm grande diversidade e talvez não tenham vindo de um mesmo ancestral. Na França e em lugares como Croácia, Bulgária, Uruguai etc., ela também é conhecida como Ugni Blanc e está relacionada à variedade tida como Trebbiano Toscano. Historiadores do século XVII afirmaram que ela e Malvasia eram as cepas mais cultivadas na Toscana na época. Diz-se ainda que ela foi exportada para a França ainda nos anos 1400, durante o papado de Avignon. Em solo francês, especialmente em Provence, recebeu o nome Ugni Blanc, que vem do dialeto provençal “uni”, que significa “uva prematura”, que por sua vez teria vindo do grego “eugenia”, ou seja, “de origem nobre”. Na Úmbria, ela é conhecida como Procanico. Sendo uma das variedades brancas mais cultivadas no mundo, produz vinhos leves e frescos em diversas regiões
Como se sabe, a variedade mais conhecida da Argentina é de origem francesa, vinda da região de Cahors. Na França, ela é conhecida também como Cot (ou Côt) e Auxerrois, entre outros sinônimos. A Cot é uma cepa da antiga província de Quercy, em Cahors, que hoje corresponde ao departamento de Lot. A primeira menção, no entanto, é de 1761 sob o nome de Noir de Pressac. Mais tarde, recebeu o nome de Cor e daí Cot. Mesmo na Argentina, antes de chegar a ser Malbec, já foi chamada de Malbeck. Hoje, a cepa – que já esteve no blend de Bordeaux – espalha-se pela Argentina, principalmente, e Cahors.
A primeira menção ao nome Monastrell é da segunda metade do século XIV. Na época, ela era tida como a mais importante variedade da região de Valência, na Espanha, junto com a Bobal. O nome deriva de "monasteriellu”, diminutivo de monastério, o que sugere que a cepa foi originalmente cultivada por monges. Acredita-se que ela tenha tido origem em Sagunto, no Camp de Morvedre, na região de Valência. Morvedre foi um importante porto na região, assim como Mataró. Não à toa os sinônimos mais comuns da Monastrell fora da Espanha sejam Mourvèdre – nome que recebeu em Provence – e Mataro (especialmente na Austrália). É a quarta casta mais cultivada da Espanha e muito usada em blends, apesar de aparecerem alguns varietais.
A região do Vêneto é conhecida por seus vinhos espumantes, que ficaram famosos no mundo todo, os Prosecco. Desde o século XVIII, diversas variedades da região de Conegliano, província de Treviso, foram denominadas Prosecco, nome de uma vila na província de Trieste. Mais recentemente, porém, devido a razões comerciais (proteger a denominação de origem Prosecco), a uva passou a ser denominada Glera. Mas ela ainda tem outros sinônimos menos conhecidos como Serpina e Števerjana, por exemplo. Com a fama, a uva se espalhou pelo mundo, com diversos produtores criando Proseccos nos mais variados lugares. Seus espumantes costumam ser leves e florais.
ADEGA já dedicou um grande artigo sobre a variedade Primitivo e Zinfandel na edição 133. Acredita-se que a casta tenha tido origem na Croácia, onde é conhecida como Crljenak Kaštelanski, ou também Tribirag. De lá, ela foi parar na Itália, especialmente na Puglia, e depois seguiu rumo à Califórnia, onde foi chamada de Zinfandel. A primeira menção na Puglia ocorreu em 1799, e a origem do nome vinha do latim “primativus”, “a primeira a amadurecer”. Antes, porém, a variedade era conhecida como Zagarese, provavelmente variação de Zagreb, na Croácia. Já a etimologia do nome Zinfandel ainda é um mistério, apesar disso, em 1975, a casta foi identificada como idêntica à Primitivo, o que só foi confirmado definitivamente em 1994. Em 2001, em uma busca pelas origens da cepa, viu-se que ela tinha o mesmo DNA das croatas Crljenak Kaštelanski e Pribidrag – que teria sido a primeira referência à casta na história. Com cultivo no Novo e no Velho Mundo, a Primitivo dá vinhos potentes, mas com caráter distinto em cada lugar.
A mais conhecida uva toscana, a Sangiovese é campeã em sinônimos, até mesmo dentro da própria Toscana. Lá ela pode ser chamada de Brunello, Cacchiano, Calabrese, Chiantino, Morellino, Prugnolo Gentile, Sangioveto etc. Ainda na Itália, ela é conhecida como Nerello, na Sicília, e Corinto Nero, na Calábria, por exemplo. Em sua primeira menção, ela levava o nome de Sangiogheto e era tida como “amarga de comer, mas de vinho suculento e fino”. A lenda diz que o nome vem de “sanguis Jovis”, “sangue de Júpiter”, que teria sido dado por monges em Santarcangelo di Romagna. Discute-se ainda hoje se a origem da Sangiovese é mesmo toscana ou calabresa. Os toscanos, porém, afirmam que há vários clones de Sangiovese, daí os nomes diferentes se justificarem, pois seriam uvas diferentes. Mesmo lá, ela é capaz de produzir vinhos de diferentes características.
Acredita-se que a variedade branca Macabeo tenha se originado em Vilafranca del Penedès, região da Catalunha, na Espanha, sendo mencionada pela primeira vez em 1617 como Macabeu. Ela seguiu para a França, onde foi catalogada em 1816, com esse mesmo nome. Na França, a nomenclatura ganhou variações como Maccabéo, por exemplo, mas foi na própria Espanha que ela recebeu um nome bastante diferente: Viura, usado principalmente em Rioja e Rueda. Esta cepa é capaz de originar alguns dos brancos mais longevos da Espanha.
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