Antes de escolher e compras a sua adega você deve saber fazer as perguntas certas para tomar a melhor uma decisão
por Giuliano Agmont
A decisão de ter uma adega normalmente se dá quando o entusiasmo por comprar vinhos supera a capacidade de degustá-los. É uma questão matemática, em poucos meses, as garrafas começam a se avolumar por todos os cantos e providenciar um local para armazená-las passa a ser uma prioridade.
Muitos, demasiadamente prudentes, optam por um modelo pequeno, para poucas garrafas, e logo descobrem que avaliaram mal a própria voracidade por novos rótulos. Outros, mais afoitos, investem em adegas superestimadas e vivem angustiados diante de nichos vazios ou, pior, repletos de vinhos comprados de modo compulsivo sem nenhum critério. Por isso vale a pena se fazer algumas perguntas antes de dimensionar o espaço onde irá guardar seu mais valioso tesouro.
É importante avaliar a quantidade realmente necessária de nichos para não ter de ampliar sua adega ou comprar uma nova a cada ano. Quem tem recomenda: “Nunca comece por uma pequena. Prefira modelos com capacidade para pelo menos 40 ou 50 garrafas”, recomenda Christian Burgos, Publisher e degustador da Revista ADEGA.
Se você quer apenas um lugar para guardar e organizar seus vinhos, o cálculo é mais simples, basta se perguntar:
Procure tirar uma média do seu consumo no último semestre, ou ano. Fazendo essa conta, já dá para ter uma ideia de padrão. Se tomou oito garrafas por mês (duas por fim de semana) e comprou doze, terá um residual mensal de quatro vinhos, o que significa quase 50 garrafas por ano e 100 ao final de dois anos. Sem pensar muito, portanto, já seria o caso de considerar uma adega com capacidade para pelo menos 100 garrafas.
Para quem experimenta uma imersão mais profunda no universo do vinho, há outras contas a se fazer. A maioria das pessoas que adquire uma adega o faz com o objetivo de guardar o vinho em condições adequadas principalmente de temperatura, umidade e luminosidade para que a bebida evolua e não estrague.
“Vinhos de guarda precisam de um ambiente escuro e temperatura estável para envelhecer bem”, ensina Eduardo Milan, editor de Vinhos da Revista ADEGA. Assim, se pretende guardar vinhos para envelhecer, procure projetar o que gostaria para o seu futuro. Para tanto, existem alguns caminhos. Estas perguntas podem servir de guia:
-Quantos vinhos pretendo guardar para tomar daqui a cinco anos? E daqui a 10 anos? E daqui a 20 anos?
Aqui vale a pena pensar nos grandes vinhos que terá oportunidade de comprar jovens para guardar e apreciar em ocasiões especiais. “A adega permite que você controle o envelhecimento de grandes vinhos e não corra risco de comprar um rótulo que foi mal armazenado”, explica Eduardo Milan. Para efeito de cálculo, considere este exemplo do que pretende tomar por ano:
• 1 vinho de 20 anos
• 10 vinhos de 10 anos
• 50 vinhos de 5 anos
Note que esse exemplo corresponde a um enófilo que pretende beber grandes vinhos em mais da metade dos fins de semana de um ano. Nesse caso, pensando nos vinhos de 20 anos, você precisará de espaço para pelo menos duas dezenas de rótulos de alta guarda na sua adega. Isso porque, se começar a comprá-los agora, quando for abrir a primeira garrafa da lista, já terá outras 20 envelhecendo ao lado dela.
O mesmo se aplica aos demais vinhos de guarda. Se pretende tomar dez vinhos de dez anos por ano, terá de armazenar dez vinhos por ano durante uma década, ou seja, serão 100 garrafas envelhecendo na sua adega antes de começar a abrir os primeiros rótulos que adquiriu. Para os vinhos de cinco anos, considerando que vai tomar 50 deles por ano, precisará de espaço para 250 garrafas na adega para armazená-los durante meia década.
Nesse contexto, considerando apenas os vinhos com grande potencial de guarda, para um padrão de consumo como este do exemplo, será preciso uma adega de 400 garrafas, ou duas de 200, se quiser mexer o mínimo possível em uma delas.
Existem outras referências para se colecionar vinhos. Muitos compram rótulos pela safra, de modo que ela coincida com um ano especial. Pode ser de casamento, nascimento de um filho, aniversário, abertura de uma empresa, assinatura de um contrato, enfim, cada um tem a sua ocasião para celebrar.
Há também aqueles que se valem da origem ou do nome de um vinho. “Dei a meu filho o nome Antônio, então costumo promover verticais com vinhos Don Antonio para celebrar o aniversário dele”, revela Daniel Perches, organizador do Encontro de Vinhos, que tem uma adega subterrânea em casa. Aqui a conta vai depender de quantas datas você pretende comemorar por ano e também da quantidade de garrafas que abrirá nessas “verticais”. Imagine este exemplo:
- Ano do nascimento do filho – 5 garrafas
- Ano do casamento – 2 garrafas
- Ano do nascimento da esposa– 6 garrafas
- Ano do próprio nascimento – 10 garrafas
- Ano da inauguração do seu negócio – 2 garrafas
Chegar ao rótulo certo para uma safra pré-determinada significa pesquisar. É preciso identificar qual vinho produzido naquele ano merece ser guardado – algo extremamente divertido, diga-se. “Existem safras já famosas, como as de 2000 e 2005 de Bordeaux, mas sempre é possível garimpar outras. E é por isso que o ritmo de compra oscila e você sempre vai precisar de espaço caso queira trazer uma caixa de determinado rótulo de uma viagem que fez”, pondera Christian Burgos.
Na calculadora, se estamos falando de 25 vinhos para cinco datas especiais ao ano, dá para considerar uma adega com pelo menos 100 garrafas para nunca faltar vinhos comemorativos em casa. É claro que, além dos rótulos para datas especiais, existem os demais, de guarda e do dia a dia, o que lhe permite pensar em uma adega maior ou em mais de uma.
As adegas climatizadas são projetadas para durar por muitos anos com manutenção mínima, basicamente troca do gás e limpeza. Não é um investimento irrisório. Há modelos com preço maior do que o de um carro novo (as mais extravagantes oscilando entre R$ 100 mil e R$ 350 mil), enquanto as mais baratas, considerando máquinas novas para 40 garrafas ou mais, não saem por menos de R$ 5.000,00. Mas o cálculo que deve ser feito para avaliar a necessidade de investir em uma adega tem de levar em conta o preço dos vinhos.
Pensando em coleções com custo por garrafa acima de R$ 350-400, uma adega pode abrigar tesouros inestimáveis. “Construímos uma adega de 700 garrafas para um colecionador guardar um acervo que hoje vale seguramente mais de um milhão de reais, incluindo ícones como Petrus, Lafite Rothschild, Opus One e Veja Sicilia”, revela Luigi Calle, diretor comercial e sócio-fundador da Lieu du Vin.
Portanto, se você compra vinhos com o propósito de deixá-los envelhecer, não vai querer que eles estraguem, pois, desse modo, estaria literalmente jogando pequenas fortunas pelo ralo. Na prática, pense que o investimento na adega tende a ser de 15% a 20% do valor total da coleção de vinhos que você tem ou pretende ter. Ou seja, não seria despropositado imaginar uma adega de R$ 80 mil a R$ 100 mil para abrigar um acervo de 1.000 a 1.500 garrafas estimado em R$ 500 mil.
Definida a quantidade de garrafas, é preciso saber o tipo de adega que vai escolher. As opções se resumem a produtos fabricados em série e modelos planejados. Entre as customizadas há aquelas sob medida e também os ambientes climatizados (que você entra nele). Procure reconhecer o seu perfil antes de fazer uma escolha. Faça-se perguntas. A primeira delas é:
- Pretendo estar morando em minha atual residência quando começar a abrir vinhos guardados por 10, 15 ou 20 anos?
Se a previsão é sair de onde está no curto prazo, talvez seja preferível investir em uma adega de linha. E não apenas porque ela pode ser transportada em um caminhão de mudança ao lado dos demais móveis. Mas, também, porque, na revenda do imóvel, uma adega personalizada tende a restringir o espectro de compradores, embora o incremento possa, por outro lado, agregar valor ao bem.
Seja como for, é possível fazer a transferência de uma adega customizada, mas há um custo para isso. “Cobramos cerca de 30% a 40% do preço original da adega para realizarmos a transferência”, informa Alcir Penna Vidigal, sócio-diretor da Art des Caves, que faz adegas planejadas. “Temos também de avaliar a possibilidade de adaptações de marcenaria na nova residência”.
Já se a ideia for montar uma adega em um imóvel que dificilmente deixará de ser sua morada, um projeto personalizado – que leve em conta tanto aspectos arquitetônicos como a decoração da casa ou do apartamento – certamente vai impressionar seus convidados e se tornar um verdadeiro parque de diversões.
Muita gente opta por adegas climatizadas de série por praticidade e preço. Em geral, elas ocupam o espaço de eletrodomésticos de cozinha, com pequenas variações dependendo do tamanho, podendo até ser embutidas, e cumprem com eficiência sua função de favorecer a evolução dos vinhos e organizá-los.
São equipamentos duráveis e sem odores nocivos aos vinhos, que protegem as bebidas da luz e apresentam baixos níveis de ruído e vibração, além de serem mais baratas e estarem disponíveis para “pronta entrega”. Alguns modelos oferecem zonas de refrigeração com diferentes temperaturas para acomodar tintos, brancos, rosés e vinhos de sobremesa e espumantes.
“O importante aqui é ter certeza de que, em caso de problemas de funcionamento, o que é raro, você contará com uma resposta rápida das equipes técnicas. Isso porque, nos meses de verão, por exemplo, deixar uma adega inoperante por uma semana pode ser catastrófico para muitos vinhos”, alerta Christian Burgos. “Além disso, prefira modelos que usam compressor para manter a temperatura interna estável. Adegas que fazem troca de calor com o meio externo são indicadas para países mais frios, sem variações abruptas de temperatura”.
Os modelos menores, com capacidade para até 40 garrafas, costumam ser uma ótima opção como segunda adega. Um bom equilíbrio é ter uma adega principal em sua residência e deixar uma pequena, para poucos vinhos, na casa de praia ou de campo. Ou, ainda, na empresa, para celebrar um bom negócio.
As adegas customizadas permitem aos amantes do vinho integrar sua coleção ao layout da casa. A maioria gosta de exibir com orgulho sua paixão, no meio da sala de estar ou em área de fácil acesso para convidados, embora haja os que, ao contrário, escondam sua adega para ninguém mexer. Em linhas gerais, o importante é procurar o lugar mais adequado da residência, levando em conta incidência de luz e calor, conveniência e disponibilidade de espaço.
O ideal é usar a menor área possível, dizem os especialistas. “Quanto menor a adega, menor será o gasto de energia e de gás para manter a temperatura estável e maior será a durabilidade do equipamento de climatização”, explica Alcir Vidigal, da Art des Caves. Segundo ele, é possível colocar 80 garrafas por metro quadrado de parede, o que significa 800 vinhos em uma superfície de 10 m2. “Em um ambiente de seis metros cúbicos, como, por exemplo, um cômodo de dois por três metros, dá para adaptar uma adega para 1.000 garrafas”.
Existem dois tipos de adegas planejadas, aquelas que podem ser montadas em cantos da casa e as adaptadas em um ambiente específico, nas quais é possível entrar. “Por exigirem a refrigeração de uma área maior, os ambientes climatizados pedem projetos mais robustos e eficientes, que demandam equipamentos como evaporador e unidade condensadora”, explica Luigi Calle, da Lieu du Vin.
O acabamento e o estilo variam conforme a vontade de quem encomenda o projeto. Há adegas mais contemporâneas com vidro e inox e aquelas tidas como tradicionais, com madeira. Algumas têm até espaço para balcão (em alguns casos, de mármore!) e cristaleira para taças.
O importante é saber que a adega não é só um móvel com nichos para garrafas, existem cuidados técnicos a serem tomados. “As paredes da adega devem receber tratamento térmico para garantir a climatização com gasto mínimo de energia, e os equipamentos de refrigeração precisam ser devidamente dimensionados”, explica Luigi Calle. “Não dá para usar um vidro simples de 4 milímetros, por exemplo, que vai permitir troca de calor entre o meio interno e o externo, além de embaçar. Usamos um vidro duplo, com duas chapas grossas, e uma estrutura metálica no centro, quase invisível, que absorve a umidade”.
As reentrâncias precisam favorecer a circulação do ar de maneira que a temperatura seja homogênea em todos os cantos da adega. Esse é um cuidado que a empresa contratada para o serviço deve ter. Além disso, cada formato atende a uma lógica de armazenamento. Conseguir localizar e pegar o vinho que deseja sem perder muito tempo – ou quebrar uma garrafa! – é algo desejável, sobretudo se a porta estiver aberta.
Os losangos e os espaços em xis podem ser úteis para guardar lotes grandes de um mesmo vinho (ou de uma mesma safra), as colmeias aproveitam bem o espaço mantendo a separação entre as garrafas, prateleiras com corrediça facilitam a visualização e o acesso aos rótulos, expositores inclinados mostram os grandes rótulos da coleção e nichos maiores podem abrigar caixas fechadas. Também é possível adotar gavetas para acessórios, bancada ou aparador para o serviço e prateleiras para taças.
A madeira maciça costuma ser celebrada pelos mais puristas por suas propriedades físicas (neutraliza vibrações, apresenta variações de temperatura quase nulas, exala um odor amigável ao vinho e dificilmente danifica um rótulo), mas as estruturas metálicas (aramado) também são bastante utilizadas para acomodar os vinhos, pois, além de mais baratas, ocupam menos espaço e têm um aspecto visual moderno e sofisticado.
Vale a pena considerar áreas independentes de armazenamento. Essa solução é particularmente interessante se considerar que pretende guardar vinhos brancos, por exemplo, em uma temperatura mais próxima daquela em que serão servidos. Ou, então, se não quer ficar abrindo e fechando a porta de uma adega com vinhos de alta guarda, mais caros.
Existem adegas de série com duas ou até três zonas de refrigeração. Se preferir, uma opção é adquirir duas adegas menores em vez de uma maior. Já os modelos sob medida podem ser desenhados de modo tal que cada porta acesse uma área independente. No caso dos ambientes climatizados, o ideal é que estejam em uma área fresca da casa, com pouca variação de temperatura.
Estabelecimentos comerciais que têm na carta de vinhos um diferencial competitivo usam suas adegas como ferramenta de marketing. A visão de grandes rótulos dispostos em expositores inclinados estimulam a venda da bebida. O mesmo vale para adegas com acabamento integrado à decoração do local. Além dos vinhos em exposição, adegas de restaurantes normalmente têm prateleiras com corrediças telescópicas para facilitar a vida de garçons e sommeliers e também áreas independentes para diferentes tipos de vinhos, em especial os brancos e espumantes.
* Texto originalmente publicado na edição 139 da Revista ADEGA, de maio de 2017, e republicado após atualização